O ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU), determinou que a consultoria americana Alvarez & Marsal apresente os documentos ligados à saída do ex-juiz Sergio Moro (Podemos) da empresa em outubro, quando o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública se lançou pré-candidato à Presidência da República. O ministro quer informações sobre os valores pagos ao presidenciável, incluindo as datas das transações.
O despacho foi assinado no último dia 17, e ainda pede que a empresa, "a título colaborativo", informe o número de processos de recuperação em que atuou como administradora judicial desde 2013, detalhando quais empresas estavam em processo de recuperação, perante a quais varas da Justiça, além dos valores de honorários arbitrados pelos respectivos juízos.
Dantas acolheu pedido do subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, que quer apurar possíveis "prejuízos aos cofres públicos pelas operações supostamente ilegais dos membros da Lava-Jato de Curitiba e do ex-juiz, afetando a empresa Odebrecht mediante práticas ilegítimas de revolving door" — movimentação em que políticos ou servidores se tornam lobistas ou consultores na área em que atuavam — e lawfare, "conduzido contra pessoas investigadas nas operações" da força-tarefa.
Em ofício encaminhado ao gabinete do ministro do TCU no último dia 10, Furtado diz que "se avaliam questões relativas a possíveis conflitos de interesse, favorecimentos, manipulação e troca de favores entre agentes públicos e organizações privadas".
Moro foi contratado pela Alvarez & Marsal após pedir demissão do Ministério da Justiça acusando o presidente da República, Jair Bolsonaro, de suposta tentativa de interferência política na Polícia Federal — tema de inquérito que tramita junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).
O ex-juiz, que deixou a magistratura para comandar o ministério, se mudou para os Estados Unidos para a área de Disputas e Investigações da consultoria americana.
A A&M fornece serviços de consultoria, aprimoramento de desempenho de negócios e gestão de recuperação e atua, por exemplo, no processo de recuperação da Odebrecht — empreiteira que celebrou acordo de leniência com a Lava-Jato e viu 77 de seus executivos fecharem delações premiadas, inclusive o patriarca Emílio Odebrecht e seu filho Marcelo Odebrecht, que foi condenado por Moro em diferentes ações penais.
Em seu perfil no Twitter, o ex-juiz da Lava-Jato afirmou que "deixou o serviço público e trabalhou honestamente no setor privado" para sustentar sua família. "Nunca paguei ou recebi propina, fiz rachadinha ou comprei mansões", escreveu. "Não enriqueci no setor público e nem no privado. Não atuei em casos de conflito de interesses. Repudio as insinuações levianas do Procurador do TCU a meu respeito e lamento que o órgão seja utilizado dessa forma", completou ainda o ex-juiz.
Entenda o caso
O que o TCU apura?
A decisão do órgão visa apurar se o período em que Moro esteve contratado pela consultoria pode configurar conflito de interesse, já que a Alvarez & Marsal havia sido designada como agente de recuperação judicial da Odebrecht, alvo da Lava-Jato e possivelmente afetada pelas decisões de Moro como juiz da operação. Uma das práticas ilegais apuradas pelo TCU é a chamada revolving door. O termo em inglês, traduzido como “porta giratória”, descreve movimentos em que um servidor público migra para o setor privado na mesma área em que atuava, o que daria benefícios à empresa como acesso a informações privilegiadas. O mesmo vale no caso de empregados da iniciativa privada que assumem postos no governo
Quando Moro ingressou na consultoria?
O ex-juiz assumiu o cargo de consultor após pedir demissão do Ministério da Justiça na gestão de Jair Bolsonaro, em abril de 2020. À época, ele alegou estar abandonando o posto justificando que havia tentativa de interferência do presidente na Polícia Federal. O episódio é alvo de inquérito em tramitação no Supremo Tribunal Federal. Moro deixou a consultoria em outubro e, em novembro, anunciou que é pré-candidato à Presidência
A investigação é nova?
O TCU já investigava o vínculo do ex-juiz com a consultoria por suposto conflito de interesse. Em março deste ano, o juiz João de Oliveira Rodrigues Filho, da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de SP, decidiu suspender pagamentos da construtora à Alvarez & Marsal. A decisão foi tomada na esteira da apuração preliminar em curso no TCU sobre a contratação do ex-ministro da Justiça pela consultoria de gestão de empresas
O que diz Sergio Moro?
Em rede social, Moro afirmou que “deixou o serviço público e trabalhou honestamente no setor privado para sustentar minha família”. “Nunca paguei ou recebi propina, fiz rachadinha ou comprei mansões”, escreveu, em crítica indireta a membros da família do presidente Jair Bolsonaro. “Não enriqueci no setor público e nem no privado. Não atuei em casos de conflito de interesses. Repudio as insinuações levianas do procurador do TCU a meu respeito e lamento que o órgão seja utilizado dessa forma”, completou o ex-juiz