O Congresso Nacional retoma as atividades na segunda-feira (2), com as reformas tributária e administrativa em debate, mas uma prioridade inadiável: as mudanças na legislação eleitoral. A pressa se justifica. Para entrar em vigor já nas eleições de 2022, as novas regras precisam ser aprovadas na Câmara e no Senado até o início de outubro.
Atualmente, as propostas estão sendo discutidas em três colegiados. Duas comissões especiais analisam o voto impresso e a implementação do chamado distritão — sistema em que apenas os mais votados são eleitos.
Já um grupo de trabalho coordenado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), aliada do futuro chefe da Casa Civil, senador Ciro Nogueira (PP-PI), estuda outras 878 possíveis alterações, entre elas uma flexibilização da Lei da Ficha Limpa e o retorno da propaganda partidária regular no rádio e na TV.
Embora a maioria dos parlamentares tenha se ausentado de Brasília durante o recesso, as costuras políticas não foram interrompidas.
O retorno do voto impresso perdeu apoio e deve ser arquivado, sobretudo após a polêmica envolvendo a suposta ameaça de golpe do ministro da Defesa, Braga Netto, mas o distritão tem forte apelo entre os deputados. Levantamento preliminar que circula na Câmara estima que possa ser aprovado com até 350 votos. O entrave reside no Senado.
— Isso vai capitanear o debate na retomada dos trabalhos. Há uma construção muito forte em torno do distritão na Câmara, mas depende do Senado, onde os presidentes de partidos, todos contrários, têm muita força — comenta o vice-líder do PP, deputado Covatti Filho (RS).
Para mitigar a perda de poder e relevância dos partidos causadas pelo distritão, há uma negociação para implementar uma fidelidade partidária mais rigorosa. Em contrapartida, os opositores do modelo cogitam reestabelecer as coligações nas eleições proporcionais como compensação para não aprovar o novo sistema. Há ainda um debate sobre a criação das federações de partido para garantir sobrevida às legendas tradicionais ameaçadas de extinção com a cláusula de barreira, como PC do B, Novo, Rede e PSOL.
— Queremos matar o voto impresso e o distritão já nas comissões especiais para não correr risco caso essas matérias sejam votadas em plenário. Se é pra piorar, o melhor então é não aprovar nada — afirma o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS).
Outra urgência será a definição do valor do fundo eleitoral para 2022. O presidente Jair Bolsonaro já adiantou que irá vetar os R$ 5,7 bilhões aprovados pelos parlamentares, mas o governo precisa enviar um projeto de lei estabelecendo o valor intermediário de R$ 4 bilhões, acordado com as bancadas.
Reformas tributária e administrativa na pauta
Vencida a pauta eleitoral, o Congresso Nacional deve se debruçar sobre as reformas, sobretudo a tributária. Há um empenho pessoal dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), mas nenhum consenso.
Pacheco deseja uma mudança mais ambiciosa, com a fusão das taxações sobre o consumo dando origem a apenas dois tributos, um federal e outro estadual, enquanto Lira visa as alterações no Imposto de Renda, consideradas mais simples e fáceis de obter adesão do plenário.
— Os presidentes estão mobilizados pela reforma tributária, mas é difícil sair algo que mexa na Constituição. O mais provável é que ocorram mudanças pontuais, que sirva para dizer que alguma coisa ao menos foi aprovada — avalia o cientista político Antônio Augusto Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
Na reforma administrativa, as duas Casas aguardam antes posicionamento mais claro do governo. Bolsonaro defendeu na campanha o redesenho nas carreiras do funcionalismo, mas agora teme prejuízos eleitorais ao tirar benefícios dos servidores e ameaça desidratar as intenções do ministro da Economia, Paulo Guedes. A dedicação da base governista à pauta, contudo, irá depender do novo direcionamento a ser dado por Ciro Nogueira à frente da Casa Civil.
Imbuído da missão de reorganizar a articulação política do Planalto, ele prioriza a pacificação do Senado, onde o governo não tem maioria e ainda sofre abalos com a CPI da Covid. Nogueira precisa ainda garantir a aprovação das indicações de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal e de Augusto Aras a um segundo mandato na Procuradoria-Geral da República.
Enquanto tenta pacificar o ambiente no Senado, Nogueira conta com a ajuda de Lira e da ministra-chefe da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, para fazer avançar outras pautas do governo na Câmara, onde a atmosfera política é mais favorável. Em primeiro plano, estão projetos com repercussão na área ambiental, como as mudanças nas regras de licenciamento, na demarcação de terras indígenas e na regularização fundiária, além da privatização dos Correios.
— As reformas serão mais tímidas do que se imaginava, sobretudo diante das expectativas do mercado, mas a articulação política do governo deve melhorar bastante com Ciro, Lira e Flávia Arruda conduzindo as conversas. Ciro é o principal político do centrão e sabe muito bem como administrar os interesses dos parlamentares — resume o cientista político Carlos Eduardo Borenstein, analista da Arko Advice.
As prioridades
Regras eleitorais
Não há um projeto de lei específico. Um grupo de trabalho estuda 878 propostas e os partidos estão em busca de consenso mínimo nas mudanças, cujo prazo de aprovação nas duas Casas termina no início de outubro.
Voto impresso e do distritão
As PECs estão sendo discutidas em duas comissões especiais distintas. Para chegarem ao plenário, antes precisam de maioria nos colegiados. O voto impresso está quase sepultado, mas há chances de aprovação do distritão.
Reforma tributária
Senado tenta redesenhar o modelo, enquanto Câmara foca no Imposto de Renda (IR). Intenção é aprovar ao menos taxação de dividendos e reduzir o IR das empresas. Simplificação do sistema deve ficar para 2023.
Reforma administrativa
Líderes aprovaram fim dos supersalários como condição para votar mudanças na carreira dos servidores, mas agora aguardam orientação do Planalto. Se não for aprovado agora, fica para 2023 para evitar danos eleitorais.
Privatização dos Correios
Projeto do Executivo tramita em regime de urgência e está pronto para ser apreciado em plenário. Chegou a entrar na pauta no início de julho, mas sessão foi encerrada antes da votação. Deve ser aprovado sem dificuldade.
Flexibilização ambiental
O projeto que flexibiliza a regularização fundiária e o que dificulta demarcações de terras indígenas estão prontos para votação na Câmara. Já as mudanças no licenciamento ambiental estão no Senado, sem data para apreciação.