Em busca de estabilidade política diante das suspeitas de corrupção investigadas na CPI da Covid e da queda de popularidade, o presidente Jair Bolsonaro ampliou o espaço do centrão no governo e vai recriar o Ministério do Trabalho. A principal mudança é a ida do senador Ciro Nogueira (PP-PI) para a Casa Civil, onde terá a missão de melhorar a relação com o Congresso. A iniciativa provocou um redesenho da Esplanada, alijando dos cargos dois dos mais fieis e antigos aliados do presidente.
Ao ceder o posto a Nogueira, Bolsonaro vai transferir o general Luiz Eduardo Ramos da Casa Civil para à Secretaria-Geral da Presidência. O atual titular da Secretaria, Onyx Lorenzoni, será deslocado para o Ministério do Emprego e Previdência, nova designação da pasta do Trabalho.
A minirreforma surpreendeu o universo político em pleno recesso parlamentar. O próprio Nogueira não esperava o convite. O senador estava em uma praia do México com a família quando recebeu um telefonema de Bolsonaro no início da semana. De imediato, aceitou o convite e antecipou a data de retorno ao Brasil. Ele deve se reunir com o presidente na próxima segunda-feira e tomar posse na sequência.
Aos 52 anos, casado e pai de dois filhos, Nogueira é um parlamentar discreto e especialista nas articulações de bastidores — exatamente o que Bolsonaro mais precisa no momento. O presidente sabe que está em desvantagem na CPI e que o grupo de senadores que comanda as investigações planeja acelerar os trabalhos na retomada das atividades, em agosto. Ele também se ressente da escassez de apoio no plenário da Casa e não confia no presidente Rodrigo Pacheco (DEM-MG), que prorrogou os trabalhos da CPI e está prestar a migrar para o PSD com objetivo de disputar o Planalto em 2022.
É para tentar reproduzir no Senado a situação que desfruta na Câmara, onde tem maioria confortável e um aliado na presidência de Arthur Lira (PP-AL), que Bolsonaro cedeu a Nogueira o posto mais estratégico da Esplanada. Despachando no quarto andar do Palácio do Planalto, o senador irá ocupar o único gabinete com acesso direto à sala do presidente, um pavimento abaixo. Além da interlocução privilegiada com Bolsonaro, Nogueira irá comandar a articulação política tendo assento na junta orçamentária e a caneta que torna oficial todos os atos do governo, sobretudo as nomeações. É o cargo dos sonhos do centrão, que há meses reclamava da atuação e Ramos e Onyx.
Com 26 anos de Congresso, Nogueira está no sexto mandato seguido — quatro de deputado federal e dois de senador. De fiel escudeiro do então deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), que renunciou em 2005 após ser flagrado extorquindo o dono de um restaurante da Câmara, logo passou a ser chamado de "rei do baixo clero", graças a desenvoltura com que intermediava os interesses da maioria parlamentar de baixa expressão. Sempre foi governista, mas se ajusta à temperatura política da ocasião. Foi assim que tomou café da manhã com Dilma Rousseff no dia da votação do impeachment e horas depois apoiou sua derrubada no plenário do Senado.
Nogueira pediu votos para o PT nas eleições presidenciais de 2018 e chegou a chamar Bolsonaro de fascista na pré-campanha, mas se aproximou do governo tão logo o centrão começou a galgar espaços na Esplanada. No Senado, é titular da CPI da Covid, mas não faz defesa enfática do Planalto tampouco tem presença assídua nas sessões, deixando-se representar na maior parte do tempo pelo suplente Luis Carlos Heinze (PP-RS).
Alvo de três inquéritos do Supremo Tribunal Federal e de outras cinco ações na justiça federal, Nogueira chega à Casa Civil com o status de conciliador e o desafio de conduzir a política do governo sem maiores sobressaltos até o final do mandato de Bolsonaro, em 2022. Presidente do PP há oito anos, ele ainda ambiciona filiar Bolsonaro para a disputa à reeleição pela antigo partido, hoje o maior do centrão.
— Eu sou do centrão. Eu fui do PP metade do meu tempo — disse Bolsonaro nessa quinta-feira (22), rebatendo as críticas de fisiologismo que acompanham o bloco partidário.