O depoimento da infectologista Luana Araújo à CPI da Covid, na quarta-feira (2), apresentou pontos de divergência quando comparado às falas do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, que foi à comissão do Senado no começo de maio. Entre os temas divergentes está o uso da cloroquina em pacientes com coronavírus e a autonomia do ministério para ações de combate à pandemia.
Luana foi anunciada no dia 12 de maio, por Queiroga, para o cargo de secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19. Contudo, ela saiu do governo em menos de 10 dias, sem nem sequer ter sido nomeada.
A pasta não explicou o motivo da saída. Após o depoimento da infectologista, o ministro afirmou que análises sobre ela "não foram bem-sucedidas".
Veja algumas situações em que os posicionamentos divergem:
Tratamento precoce
O principal momento de divergência entre Luana e Queiroga se dá quanto ao uso do chamado "tratamento precoce" contra a covid-19. À CPI, a médica foi enfática, afirmando mais de uma vez que a ciência ainda não conseguiu encontrar uma resposta eficaz nesse sentido.
— Não temos nenhuma ferramenta farmacológica para ser usada de forma inicial que impeça a evolução da doença — disse.
— Não é que a gente não queira que as pessoas tenham acesso, pelo contrário, nossa vida seria mais fácil. Perdi amigos, perdi colega de plantão da Fiocruz que era um gênio, morreu salvando a vida das pessoas. Se houvesse oportunidade, a gente teria usado. Infelizmente, não tem — declarou.
Já Queiroga, também durante depoimento, optou por se esquivar de responder qual sua posição sobre o uso da cloroquina em pacientes da covid-19.
— Essa é uma questão técnica que tem que ser enfrentada pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS). O ministro é a última instância na Conitec, então eu vou precisar me manifestar tecnicamente — disse o titular da Saúde.
O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), e o presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), insistiram para que o ministro respondesse o questionamento, mas Queiroga seguiu dizendo que não tinha ido ao Senado para dar "opinião". Questionado ainda sobre a distribuição de cloroquina ao SUS, ressaltou:
— Eu não autorizei a distribuição de cloroquina na minha gestão, não tenho informação se está havendo.
Autonomia do ministério
Em declaração inicial aos senadores, Luana relatou ter afirmado a Queiroga que só aceitaria o convite para o cargo de secretária se lhe fossem garantidas a autonomia necessária e respeitadas a cientificidade e tecnicidade.
— Pleiteei autonomia, não insubordinação ou anarquia. Precisaria ter autonomia necessária para agir, no que fui prontamente respondida pelo ministro de forma afirmativa e concreta — afirmou ela.
Já em seu depoimento, Queiroga disse que havia recebido autonomia de Bolsonaro para montar sua equipe "conforme critérios técnicos" e que a gestão da pasta era "autônoma". No entanto, dias depois, a recém-nomeada secretária extraordinária saiu do governo.
O ministro irá prestar um novo depoimento à comissão em 8 de junho e deverá ser questionado sobre o tema. Os senadores querem saber se Queiroga teria mentido ao dizer que tinha autonomia para montar a equipe.
Motivo do veto
À CPI, a médica afirmou não saber se os ataques que recebeu por criticar o "tratamento precoce" e defender o distanciamento social estão relacionados ao veto do seu nome para assumir como secretária.
— Honestamente, não me foi comunicada qual foi a razão pela qual a minha nomeação não foi aprovada. Eu simplesmente fui comunicada de que, infelizmente, essa nomeação não sairia. Eu agradeci profundamente a oportunidade de servir ao meu país, peguei as minhas coisas e voltei para Belo Horizonte — disse Luana Araújo.
Ao comentar sobre o caso, o ministro da Saúde afirmou que além de "validação da técnica", era necessário "validação política" para nomeação. Na terça-feira, enquanto cumpria agenda em Roraima, Queiroga disse que Luana não foi nomeada para o cargo porque análises sobre ela "não foram bem-sucedidas".
— A nomeação de qualquer pessoa para um cargo público segue uma sequência de validação, a área técnica e, tem que existir outras análises. E, essas análises não foram bem-sucedidas. Tal sorte que não foi nomeada.