Palco de episódios emblemáticos da crônica política do Rio Grande do Sul, o Palácio Piratini, em Porto Alegre, completa um século de história ampliando o acesso virtual a seus salões e acervos. Erguido com pedras calcárias francesas e toneladas de cal inglesa, o prédio onde funciona a sede do governo estadual celebra o centenário nesta segunda-feira (17) com uma cerimônia híbrida — adaptada aos tempos de pandemia — e o lançamento de um site oficial.
No vídeo acima, produzido pela equipe de GZH em 2017, conheça recantos pouco visitados do Palácio, incluindo os famosos túneis no subsolo.
Nesses cem anos de trajetória, uma curiosidade acompanha a trajetória da edificação: o local nunca chegou a ser inaugurado. Em 17 de maio de 1921, com obras ainda em andamento, o então presidente da província, Borges de Medeiros, foi o primeiro a ocupar o prédio, sem festa nem solenidade. De lá para cá, a data passou a ser considerada o marco das efemérides, embora a pedra fundamental do imóvel tenha sido assentada em 1896 e os trabalhos tenham perdurado por décadas (veja o resumo abaixo).
— O prédio que existia antes era muito antigo, da época da fundação da cidade. Era chamado de Palácio de Barro e durou até o governo de Júlio de Castilhos, que decidiu derrubá-lo e erguer uma nova sede. Houve um primeiro projeto, de um engenheiro local, mas ele acabou substituído por outro, de um arquiteto francês. Foram anos de obras. É fundamental que o Piratini siga sendo preservado, porque Porto Alegre não conservou quase nada das suas origens — afirma o historiador Sérgio da Costa Franco.
Tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (lphae) em 1986, o palácio vem passando por restauros pontuais — no momento, são recuperados os pisos de parquet da ala residencial — e guarda mais do que relíquias: é testemunha de momentos marcantes da vida local e nacional. Foi dali, em agosto de 1961, que o governador Leonel Brizola liderou a campanha da Legalidade, movimento de resistência que garantiria a posse do vice-presidente da República João Goulart após a renúncia intempestiva de Jânio Quadros. Celebrar os cem anos do palácio é manter viva a história.
— A comemoração do centenário representa a luta e o esforço da sociedade e do Estado pela conservação e proteção desse bem cultural. Além da importância arquitetônica e artística, o prédio guarda a simbologia política do Rio Grande do Sul — ressalta a arquiteta Maria Clara Coelho Bassin, coordenadora da Assessoria de Arquitetura da Casa Civil.
Para abrir as comemorações do jubileu, está sendo preparada uma cerimônia com transmissão ao vivo, pela internet, na segunda-feira, com a participação do governador Eduardo Leite e de ex-chefes do Executivo. Na ocasião, entre outras novidades, será lançado o site do palácio (veja mais detalhes a seguir), que promete oferecer um mergulho histórico na sede do poder Executivo sem que o público precise sair de casa.
— Antes da pandemia, a intenção era abrir as portas do Piratini para celebrar essa data especial, mas, com o avanço do coronavírus, o site acabou ganhando destaque. A ideia é aproximar as pessoas e oferecer acesso a esse patrimônio. Também criamos um perfil no Instagram, que terá conteúdo exclusivo e contagem regressiva para os festejos — destaca o coordenador da Comissão Especial do Centenário do Palácio Piratini e assessor do gabinete do governador, Mateus Gomes.
Site
O site oficial do Palácio Piratini entrará no ar na segunda-feira (17) e terá uma série de atrações iniciais, que ao longo do ano serão ampliadas. Na largada, será possível, por exemplo, fazer uma visita virtual ao local. Confira em palaciopiratini.rs.gov.br
Outra novidade do centenário é a criação de um perfil oficial do palácio no Instagram, que entrou em operação no último dia 12. O perfil é @palaciopiratini e esse espaço será dedicado aos cem anos do prédio e trará conteúdos exclusivos.
Solenidade
Na segunda-feira (17), a partir das 11h, acompanhados de ex-chefes do Executivo, o governador Eduardo Leite fará a abertura do ano do centenário do palácio, com transmissão ao vivo pelos canais do governo do RS no YouTube e no Facebook.
Um pouco da história*
- Sede do governo do Estado do RS, o Palácio Piratini teve as obras iniciadas em 1896, por ordem do então presidente da província Júlio de Castilhos
- O novo prédio substituiria o antigo Palácio de Barro, que tinha esse nome por ter sido construído com paredes de taipa e que, segundo Castilhos, estava "praticamente inabitável"
- A obra começou a partir do projeto do engenheiro Affonso Hebert, mas recebeu críticas e foi paralisada em 1901
- Em 1909, o presidente da província Carlos Barbosa Gonçalves decidiu promover um concurso em Paris para escolher um novo projeto. O vencedor foi Auguste Ray, mas a ideia nunca foi executada
- Naquele mesmo ano, chegou a Porto Alegre o arquiteto francês Maurice Gras, que trouxe consigo uma nova proposta para a sede do governo e acabou contratado
- O projeto de Gras diferenciava-se dos demais, pois separava em dois blocos a função representativa, de governo, e a residência, prevendo entre eles um pátio interno
- Muitos associam o projeto de Gras ao Petit Trianon, de Luís XVI, na França
Materiais importados e novas mudanças
- Entre 1910 e 1913, a obra ganhou ritmo, com o uso de materiais importados. Vieram da França itens como pedra calcária, parte do cimento, os lustres e apliques da ala governamental. A Inglaterra forneceu a outra parte do cimento
- Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), houve dificuldades de importação de materiais, e os trabalhos foram paralisados
- O presidente da província Borges de Medeiros dispensou o arquiteto Maurice Gras e retomou a obra em regime de empreitada. A partir daí, escultores e ornamentistas radicados no Estado passaram a trabalhar na construção
Primeiro ocupante
- Em 17 de maio de 1921, Borges e auxiliares próximos passaram a atuar no Palácio. Não houve inauguração oficial, pois ainda havia muito por fazer no segundo piso e na ala residencial
Sequência aos trabalhos
- Em 1922, foram retomados os trabalhos na ala residencial e finalizado o ajardinamento entre as duas edificações
- O primeiro presidente provincial a residir no local, junto da família, foi Getúlio Vargas, em 1928
- Em 1945, após a Segunda Guerra, foram reiniciadas as obras de decoração interna dos salões do segundo andar da ala governamental
- Em 1951, o pintor italiano Aldo Locatelli foi contratado para a execução de murais inspirados na história rio-grandense
- O grande salão de recepções recebeu o nome de Negrinho do Pastoreio, após Locatelli recriar a lenda nas paredes e no teto
O nome Piratini
- O Palácio Piratini recebeu este nome em 1955, por decreto do governador Ildo Meneghetti, em homenagem à primeira capital da República Rio-grandense
Tombamento histórico
- Em 1986, o prédio foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (lphae) e, em 2000, integrando o sítio histórico da praça da Matriz, a edificação e seus bens passaram a ter a proteção do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
* Fonte: texto Palácio Piratini, produzido pela historiógrafa Liana Bach Martins, da Assessoria de Arquitetura da Casa Civil do Estado
Cuidados e obras de restauro
Nos últimos anos, apesar das dificuldades financeiras, o Palácio Piratini vem sendo alvo de obras de restauro e de algumas melhorias. Confira lista preparada pela arquiteta Maria Clara Coelho Bassin, coordenadora da Assessoria de Arquitetura da Casa Civil:
Projetos entregues
- Climatização dos salões da ala governamental, via Lei Federal de Incentivo à Cultura
- Restauro do subsolo: obra realizada com recursos próprios que trouxe a Secretaria de Comunicação de volta ao Palácio
- Restauração da fonte da Egípcia e resgate do jardim histórico
- Iluminação monumental: projeto realizado pelo Internacional como contrapartida de um acordo administrativo com o Estado
Projetos em andamento ou em vias de começar
- Recuperação dos pisos de parquet da ala residencial com recursos próprios
- Implantação do plano de prevenção contra incêndios (PPCI): projeto aprovado na Lei Federal de Incentivo à Cultura, em fase de captação de recursos
- Restauro dos murais de Aldo Locatelli: encaminhado para aprovação na Lei Federal de Incentivo à Cultura e posterior captação de recursos
- Limpeza das estátuas: projeto patrocinado pela Corsan
- Oficina de restauro: projeto realizado via Lei Federal de Incentivo à Cultura, em fase de entrega
- Restauro de mobiliário: projeto realizado via Lei Federal de Incentivo à Cultura, em fase de entrega
- Formação da reserva técnica para os bens móveis e o Plano de Gestão do Acervo Histórico-Cultural do Palácio Piratini