A prisão preventiva do prefeito do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos), foi mantida pela Justiça após cerca de quatro horas de audiência de custódia. Ele foi encaminhado no início desta noite para o presídio de Benfica, na zona norte, espécie de porta de entrada do sistema penitenciário fluminense. De lá, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) determinará para onde cada preso vai ser levado.
A desembargadora que autorizou a prisão, Rosa Helena Penna Guita, foi a mesma que ouviu o mandatário e outros cinco presos. Eles são acusados de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Na audiência de custódia, o preso pode dizer se o ato da prisão teve alguma irregularidade. Crivella afirmou que não houve. Apesar disso, a defesa do prefeito já entrou com habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) questionando a competência da desembargadora para determinar, de modo monocrático, a prisão.
Além de Crivella, foram ouvidos pela magistrada o empresário Rafael Alves, suposto operador do esquema de propinas; o ex-tesoureiro da campanha de Crivella, Mauro Macedo, e o empresário Cristiano Stockler Campos. De acordo com o TJ, as audiências de outros dois detidos, Adenor Gonçalves e Fernando Moraes, foram adiadas para esta quarta-feira porque eles estão com suspeita de covid. Serão por videoconferência.
A defesa do prefeito entrou com dois pedidos de habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O presidente da Câmara Municipal carioca, Jorge Felippe (DEM), será o prefeito do Rio de Janeiro pelos próximos nove dias e fará a transição para Eduardo Paes (DEM), eleito em novembro.
O que motivou a prisão
As prisões foram autorizadas pela desembargadora Rosa Helena Guita, do Tribunal de Justiça do Rio, em ação movida pelo Ministério Público fluminense. Crivella foi detido às 6h desta terça-feira (22) em sua casa na Barra da Tijuca. Ele atribuiu a prisão à "perseguição política" e disse esperar "justiça". Leia a nota completa ao final da reportagem.
Também foram presos empresário Rafael Alves, o delegado aposentado Fernando Moraes (ex-vereador e que foi chefe da Divisão Antissequestro), o ex-tesoureiro de campanha de Crivella, Mauro Macedo, além dos empresários Adenor Gonçalves dos Santos e Cristiano Stockler Campos. Há um mandado contra o ex-senador Eduardo Lopes, mas ele não foi encontrado em casa.
A investigação teve como ponto de partida a delação premiada do doleiro Sérgio Mizrahy, preso no âmbito da operação Câmbio Desligo, um dos desdobramentos da Lava-Jato fluminense. Veio dele a expressão "QG da Propina" para se referir ao esquema, que teria como operador Rafael Alves, homem forte da prefeitura, apesar de não ter cargo oficial. Ele é irmão do ex-presidente da Riotur, Marcelo Alves — os dois foram os principais alvos dos mandados de março, e Marcelo foi exonerado logo depois.
O suposto QG funcionaria assim, de acordo com o delator: empresas interessadas em trabalhar para o Executivo carioca entregavam cheques a Rafael, que faria a ponte com a prefeitura para encaminhar os contratos. O esquema também funcionaria no caso de empresas com as quais o município tinha dívidas — aqui, o operador mediaria o pagamento.
Os celulares de Alves, que não tinha cargos na prefeitura mas atuaria como gerenciador de propina em troca de contratos com empresas, foram peças-chave para associá-lo ao prefeito do Rio. Durante operação deflagrada em março, Crivella ligou para o empresário, mas quem atendeu foi o delegado que cumpria o mandado.
Apenas um dos quatro aparelhos foi entregue voluntariamente pelo investigado - os outros dois, além desse que recebeu a ligação de Crivella, estavam num carro de Shana Harouche, mulher de Rafael, no qual também foram encontrados R$ 50 mil, relógios e joias. Indícios, segundo o MP, de que ele se preparava para uma eventual fuga.
"Da análise do conteúdo dos telefones celulares de Rafael Alves, apurou-se que o Prefeito Marcelo Crivella figura como um de seus mais frequentes interlocutores, tendo sido detectadas, no aparelho encontrado sob a pilha de roupas, 1.949 mensagens trocadas entre eles", apontou a desembargadora Rosa Helena Guita, do Tribunal de Justiça do Rio.
Muitas delas tinham linguagem cifrada, "deixando transparecer que seu conteúdo não poderia ser tratado por meios de comunicação convencionais". As conversas mostravam ainda que vários encontros eram marcados entre Rafael e Crivella, seja na prefeitura ou na casa do mandatário - os dois moram no mesmo condomínio, na Barra da Tijuca, zona oeste da cidade.
Por ter sido o principal articulador econômico para a campanha de Crivella em 2016, Rafael Alves — que conseguiu para o irmão, Marcelo Alves, a vaga de presidente da Riotur — exercia influência constante sobre o comandante carioca. Segundo o MP e a Justiça, o prefeito acatava ordens do empresário como se fosse um subordinado: desfazia atos administrativos a pedido dele, por exemplo. "A subserviência do prefeito a Rafael Alves é assustadora", afirma a magistrada.
O que diz Crivella
Crivella nega todas as acusações. Após ter sido detido em casa, na Barra da Tijuca, o prefeito disse que foi o chefe do executivo municipal que mais combateu a corrupção, cobrou justiça e afirmou ser vítima de uma perseguição política.
O Republicanos, partido de Marcelo Crivella, saiu em defesa do prefeito do Rio. Em nota, a legenda presidida pelo deputado Marcos Pereira (SP) disse acreditar na "idoneidade" do prefeito e criticou a chamada judicialização da política. "A Executiva Nacional do Republicanos aguarda detalhes e os desdobramentos da prisão do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella. O partido acredita na idoneidade de Crivella e vê com grande preocupação a judicialização da política", diz a nota do Republicanos.