A pedido do senador Flávio Bolsonaro (RJ), atualmente no Republicanos, o PSL nacional contratou em fevereiro de 2019 o escritório de advocacia de um ex-assessor que hoje tem o nome envolvido no suposto vazamento de informações da Polícia Federal em benefício da família do presidente da República.
Foram 13 meses e meio de contrato, com custo aos cofres públicos de ao menos R$ 500 mil.
O PSL foi o partido pelo qual Jair Bolsonaro se elegeu presidente e Flávio, senador. Ambos romperam com a legenda e se desfiliaram no final do ano passado.
As notas fiscais da prestação de contas do PSL nacional relativas a 2019 mostram que o escritório do advogado Victor Granado Alves (Granado Advogados Associados, do qual Victor é sócio) foi contratado com dinheiro do fundo partidário - a verba pública que abastece as legendas no país - para prestar serviços jurídicos ao diretório do Rio, comandado por Flávio, a partir de fevereiro do ano passado.
O valor mensal pago foi de R$ 40 mil. O PSL informou que houve notificação de rescisão do contrato em 15 de janeiro deste ano, mas que uma cláusula determinava que eventual rompimento só se efetivaria 60 dias após essa comunicação.
Uma das sócias do escritório, Mariana Teixeira Frassetto Granado, figura como assessora parlamentar do gabinete de Flávio no Senado, com salário bruto de R$ 22.943,73. De acordo com o site da Transparência do Senado, ela foi contratada em março de 2019, o mês seguinte à contratação, pelo PSL, do Granado Advogados Associados.
Victor, assessor de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, foi citado pelo empresário Paulo Marinho, em entrevista a Mônica Bergamo, colunista da Folha de S.Paulo, como um dos assessores do senador que teriam recebido de um delegado da Polícia Federal a informação de uma operação envolvendo pessoas do gabinete de Flávio.
Ex-aliado do presidente Bolsonaro e suplente de Flávio no Senado, Marinho afirmou à Folha de S.Paulo que o senador foi informado da operação Furna da Onça dois meses antes da deflagração da ação da Polícia Federal.
De acordo com o relato de Marinho, Flávio foi avisado entre o primeiro e o segundo turnos das eleições por um delegado simpatizante da candidatura de Bolsonaro à Presidência.
O delegado-informante teria aconselhado ainda Flávio a demitir Queiroz e a filha dele, que trabalhava no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro. Segundo o relato, ambos foram exonerados em 15 de outubro de 2018 por ordem do então candidato Bolsonaro.
O caso agora passou a ser objeto da investigação instaurada com autorização do STF (Supremo Tribunal Federal) a partir do rompimento entre Moro e o presidente. A PF vai investigar o relato do empresário, a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República), e o Ministério Público Federal também instaurou um procedimento para analisar o suposto vazamento.
O contrato do escritório de Victor com o PSL foi firmado no mesmo mês em que Flávio assumiu uma cadeira no Senado (fevereiro de 2019) e estabelecia, em linhas gerais, prestação de serviços de regularização dos diretórios do PSL no Rio.
Relatório das atividades de março de 2019, porém, indica que o trabalho ia além de regularização dos diretórios, ao citar também, de forma genérica, "consultoria jurídica prestada às bancadas parlamentares em geral" e "atendimentos diversos".
Paulo Marinho disse, na entrevista à Folha de S.Paulo, que o encontro com o delegado da PF para o vazamento das informações teria ocorrido na porta da Superintendência da PF, na Praça Mauá. Além do advogado, teriam participado também o coronel Miguel Braga, chefe de gabinete do senador e Valdenice de Oliveira Meliga, a Val, ex-tesoureira do PSL do Rio.
Val é irmã dos gêmeos Alan e Alex Rodrigues de Oliveira, policiais presos em uma investigação que apura uma quadrilha de PMs especializada em extorsões, suspeitos de atuarem numa milícia da zona oeste do Rio.
O relato do delegado, segundo Marinho, foi de que Fabrício Queiroz e a filha tinham sido citados num relatório do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
O documento levou o Ministério Público do Rio a abrir investigação sobre um suposto esquema de "rachadinha" no gabinete de Flávio na Assembleia do Rio. Os investigadores afirmam que pelo menos 13 assessores repassaram parte de seus salários a Queiroz.
Victor foi funcionário do gabinete de Flávio quando Queiroz teria operacionalizado o esquema, e o relatório do Coaf também cita o advogado por movimentações atípicas.
Victor também já foi advogado da franquia de chocolate de Flávio suspeita de ser usada para lavar dinheiro desviado no esquema de "rachadinha" operado por Queiroz. Como mostrou nesta segunda-feira (18) o Jornal Nacional, da TV Globo, o próprio advogado é proprietário de duas franquias da mesma rede de chocolate. As lojas são investigadas.
Em abril do ano passado, Victor teve o sigilo bancário quebrado por decisão da 27ª Vara Criminal do Rio. A investigação está em sigilo.
A Folha de S.Paulo analisou 30 processos envolvendo o senador desde 2007 e encontrou dois casos defendidos por Victor Granado Alves.
Num dos processos, iniciado em 2016, o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ) acusou Flávio, então seu adversário à Prefeitura do Rio, de ter promovido debate eleitoral no Facebook "com claro intuito difamatório".
No processo, consta uma postagem na qual o senador divulgou uma pesquisa na qual 57% dos entrevistados concordaram com a frase "bandido bom é bandido morto". Em seguida, Flávio Bolsonaro perguntou aos internautas: "Que tal começar por Marcelo Freixo?"
Em agosto do ano passado, em segunda instância, o Tribunal Regional Federal (TRF) rejeitou a ação. A outra é ação eleitoral e foi encerrada em 2018.
A reportagem pediu uma manifestação para a assessoria de Flávio e para Victor na manhã desta terça-feira (19), mas não obteve resposta até a conclusão deste texto.
O PSL nacional afirmou que a contratação do escritório se deu a pedido de Flávio, para regularização dos diretórios do partido no Rio e que houve pagamento integral das mensalidades, de fevereiro de 2019 até o efetivo rompimento, em meados de março deste ano.