Médico aliado do presidente Jair Bolsonaro, o deputado gaúcho Osmar Terra (MDB) repetiu informações controversas em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade na manhã desta quinta-feira (14).
Terra concedeu a entrevista após um pedido de contraponto de sua assessoria à equipe da Rádio Gaúcha. Nesta semana, os apresentadores Daniel Scola, Carolina Bahia e Rosane de Oliveira criticaram a postura do deputado em relação à pandemia do coronavírus, na contramão das linhas científicas mundiais. Até o momento, previsões reproduzidas pelo parlamentar mostraram-se equivocadas.
Ao longo de 30 minutos e 25 segundos de entrevista, os argumentos de Terra foram confrontados por fatos apresentados por Scola. No encerramento, o deputado reclamou que teve menos tempo de fala do que o jornalista.
Porém, a cronometragem da equipe técnica da Rádio Gaúcha mostra que Terra falou durante 17 minutos e 5 segundos, enquanto Scola, durante 11 minutos e 45 segundos. No tempo do apresentador, foram contabilizados os momentos em que Scola e Terra falaram ao mesmo tempo.
Veja declarações do deputado e a checagem de GaúchaZH
A epidemia, no Brasil, vai ser 13, 14 semanas. Ela termina agora, no início de junho.
Esta não foi a primeira vez que Terra fez projeções sobre a evolução da covid-19 no país. Anteriormente, o deputado vinha afirmando que o pico aconteceria em abril e que a pandemia se encerraria em maio. Atualmente, contudo, a curva do número de casos e mortes no Brasil está em escalada, batendo recordes quase diários.
Na prática, a incidência do coronavírus no Brasil dá sinais de estar longe do fim. Pelos cálculos do Ministério da Saúde, o pico de transmissão da doença deverá ocorrer até a metade de junho, mas essa projeção não é consenso entre especialistas.
Isso porque, para estimar o pico da pandemia e seu recuo, é necessário dispor de dados atualizados sobre o total de contaminados e construir um modelo matemático. No entanto, os números têm se mostrado desatualizados e incompletos no Brasil – o país aplica exames apenas em pessoas hospitalizadas e profissionais de saúde, sendo uma das nações que menos testa no mundo. A proporção de testagem entre os brasileiros é de 2,3 para cada mil habitantes.
Um estudo do Imperial College London, publicado em 8 de maio, indica que mesmo nos Estados brasileiros onde foram implantadas medidas mais rigorosas de distanciamento social, a taxa de contágio do coronavírus entre a população não diminuiu significativamente. Por isso, por enquanto, o número de casos continuará crescendo, sendo impossível determinar seu ápice – e, muito menos, seu fim.
Essa epidemia, embora tenha uma velocidade maior do que a gente esperava, é menos letal. O dano que ela causa no pulmão é menor do que o do H1N1, mas ela tem uma quantidade maior de pessoas atingidas. A letalidade dessa epidemia pode ser a do H1N1.
A covid-19 é mais letal do que a H1N1, embora sua real taxa de letalidade (percentual de óbitos sobre o total de casos) ainda seja desconhecida pelas comunidades médica e científica. Para calculá-la, é necessário conhecer o número exato de contaminados e mortos, mas os dados reais do coronavírus ainda são uma incógnita devido à dificuldade dos países em aplicar testes em larga escala e ao elevado índice de assintomáticos.
O diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, por exemplo, disse, em 13 de abril, que a covid-19 é 10 vezes mais letal do que a H1N1. Naquele momento, o coronavírus havia matado mais de 115 mil pessoas, enquanto a H1N1, 18,5 mil.
A taxa de letalidade da H1N1 é de 0,2%. Já a da covid-19 tem variado de acordo com os países e as regiões analisadas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o índice está em 4%, segundo os dados da Secretaria Estadual da Saúde, mas seria de 0,4%, de acordo com pesquisa da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), que projeta a real ocorrência da doença em um estudo de prevalência. Já a organização World Meters, que produz estatísticas com base em fontes oficiais de cada país, calcula que, na cidade de Nova York, a taxa seja de 1,4%.
Santa Catarina, desde o início, tinha o dobro de casos do Rio Grande do Sul e de mortos. Santa Catarina abriu e não aumentou isso.
Em 26 de março, um mês após o Brasil ter o primeiro registro de covid-19, Santa Catarina contabilizava 149 casos e uma morte. Já o Rio Grande do Sul tinha 190 contaminados e uma vítima fatal.
Santa Catarina passou a ser apontada como um dos próximos focos da pandemia no país justamente após a retomada das atividades – o funcionamento de hotéis, restaurantes e lojas de rua foi liberado em 13 de abril, e o de shoppings, nove dias depois. Hoje, o coeficiente de incidência do coronavírus, que representa o risco de uma determinada população para uma doença, é de 53,4 em Santa Catarina e de 25,6 no Rio Grande do Sul, de acordo com o Ministério da Saúde.
Um dia antes da reabertura, Santa Catarina tinha 776 casos e 24 mortes causadas pela doença. Desde então, os números saltaram. Na última quarta-feira (13), segundo o ministério, eram 3.828 contaminados e 73 vítimas. O Estado já ultrapassou o Rio Grande do Sul no número absoluto de casos, mesmo tendo uma população quase 40% inferior. O Estado gaúcho registrou 2.917 contaminados e 111 mortos na mesma quarta-feira, conforme o balanço do ministério.
Em Santa Catarina, a cidade de Blumenau tornou-se um dos símbolos do aumento da incidência de casos, sendo a segunda cidade com maior número de infectados entre os catarinenses. Antes da reabertura, em 12 de abril, o município contabilizava 65 casos confirmados. Na quarta-feira, eram 438 contaminados.
Para especialistas, a disparada está relacionada à reabertura do comércio e, consequentemente, ao aumento da circulação de pessoas nas ruas.
O resultado da Suécia é muito melhor do que o da Inglaterra.
Embora Suécia e Inglaterra sejam países com características distintas, os ingleses têm, de fato, um cenário mais grave do que os escandinavos. Um relatório de cientistas do Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde, publicado em 6 de maio, mostrou que o índice de letalidade entre os suecos é de 12,19, enquanto, entre os ingleses, está em 15,08.
No entanto, isso não indica que a pandemia se encontre controlada na Suécia. O país registrou seu primeiro caso de covid-19 em 31 de janeiro e, desde então, o governo seguiu uma estratégia diferente dos demais países europeus, decidindo não decretar quarentena. Pelos planos, a pandemia seria contida contando com a consciência de seus cidadãos.
Mas o país teve aumento expressivo no número de casos. Atualmente, lidera o ranking de vítimas dos países da Escandinávia – são 28.582 casos e 3.529 mortes para uma população de 10,2 milhões, tendo a taxa de mortalidade mais alta em relação ao tamanho da população do que em qualquer outro país vizinho. Nem mesmo a manutenção das atividades econômicas assegurou um bom resultado. O Banco Central sueco calcula que a economia do país irá recuar até 9,7% neste ano.
Já a Inglaterra impôs rigoroso lockdown, mas que foi considerado tardio pelas autoridades para o controle do contágio. Pelos dados mais atualizados, o país registra 234.431 casos e 33.692 mortes. A sua população é de 56 milhões de habitantes.
O governador (de Nova York) foi para a televisão dizer que, para surpresa dele, 85% das pessoas que estão em hospitais em Nova York estavam em quarentena. Elas se contaminam em casa.
Mencionada por Terra, a entrevista do governador do Estado de Nova York, Andrew Coumo, foi compartilhada pelo deputado em seu Twitter. Mas, na realidade, Coumo afirma que 66% das pessoas hospitalizadas estavam em suas casas – e não 85%.
A entrevista de mais de 40 minutos foi concedida à rede norte-americana CBS em 7 de maio. O trecho de cerca de dois minutos, contudo, está descontextualizado, na tentativa de contestar as medidas de distanciamento social.
O levantamento citado pelo governador foi aplicado em 113 hospitais do Estado ao longo de três dias, indicando que, das 600 novas internações por covid-19, 66% dos doentes foram infectados em suas casas. Na entrevista, Coumo não disse que o distanciamento social está equivocado, mas que, sem ele, o cenário seria ainda mais grave.
Essa informação foi checada pelo Projeto Comprova, que mostrou que a referida pesquisa não afirma que as pessoas contraíram o vírus em casa, somente classifica o local onde os pacientes estavam antes de darem entrada nos hospitais.
Ao Comprova, o Departamento de Saúde do Estado de Nova York informou, por e-mail, que a pesquisa é verdadeira. Porém, ao contrário do que sugere Terra, informou que os pacientes que pegaram o novo coronavírus em casa "claramente tiveram contato com pessoas infectadas".