Na briga entre o presidente da República e o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, aliados de Jair Bolsonaro no Rio Grande do Sul ficam ao lado do mandatário. Para políticos ouvidos por GaúchaZH, o ex-juiz notabilizado na Operação Lava-Jato agiu de forma equivocada ao se demitir e "sair atirando". Ainda assim, parte deles reconhece que, se as acusações feitas por Moro forem confirmadas — o que esperam que não ocorra —, Bolsonaro deve ser responsabilizado.
Em entrevista coletiva na última sexta-feira (24), o ex-magistrado acusou o chefe de tentar interferir na Polícia Federal (PF), ao exonerar o então diretor-geral da instituição, Maurício Valeixo. Segundo Moro, Bolsonaro queria ter acesso a investigações da PF — uma delas envolveria um de seus filhos, Carlos Bolsonaro, suspeito de liderar um esquema de distribuição de notícias falsas. O presidente negou tudo e disse que Moro mentiu. O caso agora é alvo de inquérito no Supremo Tribunal Federal, autorizado nesta segunda-feira (27) pelo ministro Celso de Mello.
Na avaliação do deputado estadual Eric Lins (DEM), Moro foi desleal e partiu de hipóteses falaciosas.
— Ele foi um excelente juiz, temos tudo a agradecer por isso. Mas, como ministro, foi mediano e saiu de forma desleal, partindo de suposições equivocadas, coisas da cabeça dele. Moro acreditava que uma troca de chefia na PF iria interferir nas investigações, mas isso é apenas uma pressuposição. Além disso, se baseou em um inquérito (enolvendo Carlos Bolsonaro, um dos filhos do presidente) sobre o qual ele próprio afirmou que o chefe da PF não teria qualquer ingerência, por ser controlado pelo ministro (do STF) Alexandre de Moraes. Por fim, a questão envolvendo fake news sequer tem previsão legal de crime. Por esses motivos, a saída dele foi inglória — diz o parlamentar, que classificou a postura de Moro como "trairagem" no Twitter.
Como Lins, o deputado estadual Ruy Irigaray (PSL) também menciona o histórico de Moro como legado positivo, mas condena a sua conduta na última sexta-feira (24). Para Irigaray, Moro se deixou levar pela "vaidade":
— Estou com Bolsonaro desde 2014. Todo esse pessoal que está aí, hoje, eu vi chegar. Moro veio depois que o presidente já estava eleito. Não ganhamos nenhum voto por causa dele. Ele tem um histórico como juiz e tem qualidades, mas, infelizmente, a vaidade e o egocentrismo muitas vezes sobem à cabeça. Acredito que com Moro aconteceu isso. A gente tem de saber que chefe é chefe. Temos de respeitar a autoridade de quem está acima de nós. Ele errou. E aquele vazamento que fez de prints do celular, para mim, é falta de dignidade. Sou totalmente contra.
Infelizmente, a vaidade e o egocentrismo muitas vezes sobem à cabeça. Acredito que com Moro aconteceu isso
RUY IRIGARAY
Deputado estadual
Mesmo o deputado federal Ubiratan Sanderson (PSL), que é policial federal licenciado, diz ter ficado "desencantado com a forma como Moro deixou o governo, jogando ao vento acusações contra o presidente". Vice-líder do governo na Câmara, ele sustenta que a "Polícia Federal é um órgão de Estado" e que "não pode e não vai parar por conta da troca de um diretor geral".
— Respeito a história do ex-juiz federal Sérgio Moro, sobretudo pelo corajoso trabalho feito na Lava-Jato. Contudo, acho precipitado tomar como verdadeiras as acusações feitas por ele contra o presidente da República, no momento da sua saída do governo, acusações proferidas, estranhamente, numa coletiva de imprensa ao vivo para todo o Brasil, quando o correto e o normal, sobretudo para um juiz, seria levar os fatos ao PGR (procurador-geral da República) via representação formal, juntando provas inclusive — pontua Sanderson, destacando que a investigação aberta para apurar as acusações "certamente revelará a verdade".
Até ocorrer o pedido de demissão em rede nacional, o ex-ministro era um dos grandes nomes do governo, um dos fiadores da bandeira da luta contra a corrupção de Bolsonaro, erguida ao longo da campanha eleitoral. Os aliados sabem que a queda de Moro pode minar a popularidade de Bolsonaro e respingar em volta. Nem todos enveredam pelo caminho das críticas abertas ao ex-ministro, ídolo de muitos brasileiros, ainda que se mantenham fiéis a Bolsonaro.
Por meio de nota, o tenente-coronel Luciano Zucco (PSL) agradece ao ex-ministro "pelos relevantes serviços ao Brasil, ao desbaratar o maior caso de corrupção da história, patrocinada por partidos de esquerda" e deseja que Moro "seja feliz na sua vida particular". Na sequência, o deputado estadual reafirma total fidelidade ao presidente: "Estarei na mesma trincheira que ele (Bolsonaro) no combate à corrupção, na busca do desenvolvimento do país, na defesa da liberdade, da democracia e na busca do bem-estar da população", destaca Zucco.
Para o senador Luis Carlos Heinze (PP), o que houve foi "um desentendimento":
— Moro foi um excelente juiz e fez um grande trabalho em Curitiba. Depois, à frente do Ministério, houve divergências. Eles (Moro e Bolsonaro) não estavam fechando. Infelizmente, não havia mais clima para ele permanecer, apesar do belo trabalho que fez.
Sobre as acusações contra Bolsonaro, Heinze diz que ouviu o pronunciamento do presidente e que acredita "não haver problema".
— Temos de tocar em frente — conclui.
Torcida por inocência
Para duas vereadoras de Porto Alegre conhecidas pela proximidade com a área da segurança pública e pelo alinhamento ideológico com o governo Bolsonaro, a atitude de Moro causou decepção. Ambas torcem que as denúncias não se confirmem. Mas, se o inquérito aberto pelo STF concluir que Bolsonaro cometeu crime, defendem que ele seja punido.
Ex-presidente da Câmara da Capital e filha de militar, Mônica Leal (PP) ressalta que Moro tinha um cargo de confiança e que deveria agir como "fiel escudeiro".
— Se havia suspeitas, por que ele não encaminhou as denúncias para o procurador-geral da República? Por que fazer isso numa coletiva de imprensa e vazou mensagens para a Globo? Me chocou o fato de ter mostrado as conversas no WhatsApp. Isso não é ético. Rezo para que tudo se resolva, para que o presidente não tenha nada a ver com as denúncias, para que seja inocente — reforça Mônica.
Tenente-coronel da reserva da Brigada Militar e pré-candidata à prefeitura da Capital, Nádia Gerhard (DEM) também não gostou da exposição das mensagens trocadas entre Moro e o presidente.
— É óbvio que ele foi um excelente juiz, mas caiu no meu conceito ao sair desse jeito do governo, atirando para tudo quanto é lado, expondo as pessoas. Isso é traição no mais alto grau, é mau caratismo, não combina com a liturgia exigida pelo cargo. Eu torço, sinceramente, para que o presidente Bolsonaro seja inocente. Mas torço com a mesma intensidade para que ele seja responsabilizado, se tudo isso for provado. O inquérito, sendo bem conduzido, vai esclarecer todas as dúvidas sobre esse episódio — afirma Nádia.