Após duas semanas de quarentena e sob pressão de entidades empresariais e comerciantes, os prefeitos gaúchos estão diante de um dilema: permitir a retomada da atividade econômica sob risco de expansão da pandemia do coronavírus ou manter o isolamento com inevitável desemprego e recessão nos próximos meses. Nas 18 maiores cidades do Rio Grande do Sul, a maioria dos governantes escolheu preservar a contenção social em prol da saúde pública, a despeito dos custos políticos e econômicos.
Em Bagé, onde já há transmissão comunitária e 15 casos da covid-19 confirmados, número inferior apenas aos de Porto Alegre, o prefeito Divaldo Lara (PTB) aumentou ainda mais o rigor das iniciativas de isolamento. O temor é de que a cidade se transforme em polo regional de proliferação da doença. A situação assusta os demais gestores.
Entre os prefeitos dos municípios com mais de 100 mil habitantes, é praticamente unânime a lembrança da prefeitura de Milão, na Itália, onde as medidas de restrição foram afrouxadas após uma campanha denominada “Milão não para” incentivar a retomada da circulação urbana e culminar com 5,4 mil mortes na última semana.
— A pressão é fenomenal, de todos os lados. Em Milão, o prefeito também deve ter sofrido muita pressão de empresários, por causa do turismo. Mas, agora, ninguém lembra deles. A responsabilidade cai toda nas costas do prefeito — disse o prefeito de Cachoeirinha, Miki Breier (PSB).
Por enquanto, a maioria dos prefeitos tem buscado seguir as orientações do Ministério da Saúde. Aos poucos, porém, alguns começam a ceder diante das pressões locais. Cidade menores como Vale do Sol, Encantado, Erechim, Ijuí, Flores da Cunha e Canela retomaram atividades nesta segunda-feira (30), contrariando recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em Bento Gonçalves, na Serra, a ideia é afrouxar as restrições a partir da próxima segunda-feira.
— Se mantivermos a realidade de hoje, com isolamento social apresentando achatamento da curva de contaminação, poderemos, a partir do dia 6, fazer uma retomada gradativa da nossa economia — projeta o prefeito Guilherme Pasin (PP).
Aos poucos, o próprio governo do Estado começa a ensaiar um discurso menos restritivo. Em transmissão ao vivo nas redes sociais nesta segunda-feira (30), o governador Eduardo Leite comentou o “suposto desentendimento com prefeituras”.
— O governador não manda no prefeito, que tem autonomia para a tomada de decisões. Não cabe ao Estado tomar uniformemente medidas restritivas dramáticas, gerando impacto e efeito colateral nos municípios para além do que é razoável suportar neste momento — disse o tucano.
A dessintonia entre municípios, Estados e União também inquieta ao governo federal. Para o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o ideal é que as prefeituras atuem em conformidade com as orientações dos governos estaduais.
— Temos dialogado com os secretários dentro do que é técnico, científico. Por enquanto, mantenha as recomendações dos Estados. Porque ainda temos deficiências no sistema —justificou Mandetta.
Em reuniões conjuntas, prefeitos da Zona Sul e da Região Metropolitana têm defendido a manutenção unificada das medidas restritivas.
— A melhor resposta para tanta pressão, neste momento, é a informação. Salvando vidas, o impacto econômico será menor — afirma o prefeito de Rio Grande, Alexandre Lindenmeyer (PT).
Confira as medidas adotadas nos 18 maiores municípios do RS
Total de casos: 143*
Medidas restritivas: paralisação de quase todo setor de comércio, serviços e indústria, incluindo shoppings, academias de ginástica, escolas e faculdades. Também há restrição do transporte coletivo e previsão de multas para idosos que circularem pela cidade.
Próximos passos: o prefeito Nelson Marchezan tem reforçado a necessidade do isolamento social e mantém em vigor os 31 decretos municipais. Válidas por 30 dias, as ações de distanciamento são reavaliadas todos os dias, mas não há previsão de qualquer liberação.
Total de casos: 15
Medidas restritivas: Há toque de recolher, entre 22h e 6h, e isolamento de todos os moradores com mais de 60 anos, liberando os idosos apenas para deslocamentos considerados essenciais. Proibição de ingresso de ônibus interestaduais na cidade e fechamento de comércio, bancos e construção civil.
Próximos passos: o prefeito Divaldo Lara (PTB) deliberou pela manutenção do isolamento por mais sete dias, mantendo o comércio fechado, e do toque de recolher.
Total de casos: 13
Medidas restritivas: fechamento de shoppings, bancos, cartórios, hotéis e comércio, além da rede de ensino. Supermercados podem abrir das 8h às 20h, postos de combustíveis, das 7h às 19h, e restaurantes somente no serviço de tele entrega. Já clínicas veterinárias, apenas em regime de plantão.
Próximos passos: o prefeito Flavio Cassina (PTB) elabora um calendário para dar início à flexibilização de atividades que deverá ser divulgado nesta semana. Por ora, as restrições estão mantidas.
Total de casos: 8
Medidas restritivas: determinação que idosos saiam de casa apenas para atividades essenciais, como atendimento médico e compra de remédios e alimentos, suspensão de aulas, comércio, shoppings e eventos em locais fechados.
Próximos passos: no domingo (29), prefeito Luiz Carlos Busato (PTB) publicou novo decreto definindo novas atividades como essenciais. Entre elas, call centers, gráficas, borracharias, transportadoras e pet shops, entre outros. Esses estabelecimentos, contudo, têm de seguir normas de higiene e distanciamento.
Total de casos: 3
Medidas adotadas: fechamento de quase todo comércio fechado, à exceção de atividades consideradas essenciais, como supermercados, farmácias e postos de combustíveis, entre outros. A indústria segue operando normalmente.
Próximos passos: decreto segue em vigor até sábado (4), quando o prefeito Ary Vanazzi irá reavaliar a situação.
Total de casos: 2
Medidas restritivas: proibição do comércio, liberando a abertura apenas de supermercados e farmácias, entre outros. Também há suspensão das atividades escolares municipais, proibição de eventos em locais fechados e suspensão da abertura de bares, restaurantes, lancherias e lojas de conveniência. Esses pode operar somente como telentrega.
Próximos passos: o prefeito José Arno Appolo do Amaral (MDB) deverá publicar ainda nesta semana um novo decreto prorrogando as ações de isolamento social.
Total de casos: 2
Medidas restritivas: fechamento do comércio e serviços, suspensão de obras públicas e das aulas na rede municipal, além da proibição de eventos e aglomerações da restrição de atividades ao ar livre.
Próximos passos: nesta segunda-feira (30), a prefeita, Paula Mascarenhas (PSDB), pediu que a população mantenha o isolamento e alertou que o descumprimento das medidas pode prejudicar o controle do contágio. As medidas estão mantidas, ao menos, até sexta-feira (3).
Total de casos: 2
Medidas restritivas: fechamento do comércio e serviços, salvo atividades essenciais, proibição de cultos e missas, bem como qualquer aglomeração. Transporte coletivo atende apenas idosos e profissionais de serviços essenciais.
Próximos passos: manutenção de todas as medidas ao menos até o próximo domingo (5). Segundo o prefeito, Jorge Pozzobom (PSDB), a reavaliação é diária e a liberação será gradativa.
Total de casos: 2
Medidas restritivas: liberação do funcionamento de atividades apenas consideradas essenciais, com fechamento de comércio, serviços, parques. Também há proibição de visitas hospitalares e restrições no transporte coletivo.
Próximos passos: todas as medidas serão mantidas pelo menos até sexta-feira (3), com reavaliação diária e obediência às regras estaduais e federais, segundo a prefeita, Fatima Daudt (PSDB).
Total de casos: 2
Medidas restritivas: suspensão das aulas na rede municipal, proibição do acesso a parques, casas noturnas, bares, academias e cinemas. Também há fechamento do comércio e da construção civil. Indústria teve efetivo reduzido, e restaurantes operam apenas por tele entrega.
Próximos passos: o prefeito Alexandre Lindenmeyer (PT) assegura que as medidas serão mantidas por tempo indeterminado.
Total de casos: 2
Medidas restritivas: suspensão das aulas na rede municipal e proibição do funcionamento de indústrias, comércio, agências bancárias, lotéricas e cartórios. Impedimento de que hotéis aceitassem novos hóspedes. Restaurantes, padarias e lanchonetes, apenas tele entrega. A prefeitura chegou a retirar os bancos de praças e a testar a temperatura de passageiros que desembarcaram na rodoviária da cidade.
Próximos passos: no domingo (29), o prefeito Guilherme Pasin (PP) assinou decreto mantendo as restrições até a próxima segunda-feira (6). Isso porque entidades do comércio e da indústria pressionavam pelo retorno às atividades nesta segunda-feira (30). No final da semana, irá definir se começará a liberar a retomada gradual das atividades.
Total de casos: 1
Medidas restritivas: proibição do funcionamento de quase todos os estabelecimentos comerciais, do setor de serviços, indústria e construção civil, com exceção de atividades consideradas essenciais, como supermercados, farmácias e postos de combustíveis, entre outros.
Próximos passos: as restrições se estendem até 21 de abril. O prefeito Marco Alba (MDB) irá estudá-las novamente a partir de sábado (4).
Total de casos: 1
Medidas restritivas: fechamento da rede de ensino, proibição de festividades sociais e culturais e suspensão do funcionamento de centros comerciais que não são considerados essenciais. Mercados, restaurantes e farmácias seguem operando respeitando regras de distanciamento social.
Próximos passos: na sexta-feira (27), o prefeito Russinho (MDB) prorrogou a suspensão das aulas na rede de ensino por mais 15 dias. Segundo ele, há “70% de chance” de que as demais medidas restritivas também sejam estendidas por mais tempo.
Total de casos: 1
Medidas restritivas: suspensão das atividades na rede municipal de ensino, no comércio, na indústria e na construção civil. A prefeitura também recolheu as bicicletas de uso compartilhado na cidade. No domingo (29), liberou o funcionamento de agências lotéricas e bancárias, seguindo normas de higiene e distanciamento.
Próximas medidas: o prefeito Luciano Azevedo (PSB) decidiu pela manutenção do isolamento social nos próximos dias após reuniões com empresários no último final de semana. Novo encontro para discussão do cronograma de retomada das atividades econômicas está marcado para quinta-feira (2).
Total de casos: 0
Medidas restritivas: fechamento do comércio e suspensão das atividades nas redes de ensino municipal e privada. Bares e restaurantes foram liberados para funcionamento até as 21h, e ônibus e vans municipais circulam apenas nos horários de pico.
Próximos passos: nesta segunda-feira (30), o prefeito Luis Rogério Link (sem partido) decidiu prorrogar a suspensão das aulas até 16 de abril. As demais atividades estão interrompidas até o dia 6 e, desta semana, ele decidirá se haverá mudanças.
Total de casos: 0
Medidas restritivas: suspensão das aulas nas redes privada e municipal e da abertura de agências bancárias, comércio, indústrias e obras. Também vedou a realização de missas, cultos, shows e eventos particulares. O acesso a parques e à orla do Rio Uruguai foi isolado, e idosos só podem circular para atividades essenciais.
Próximas medidas: o prefeito, Ronnie Mello (PP), anunciou, no sábado (28), a abertura gradual das medidas restritivas. Hotéis reabriram no sábado, bancos, nesta segunda-feira (30), a construção civil retornará na quarta-feira (1º) e o comércio, a partir do próximo sábado (4).
Total de casos: 0
Medidas restritivas: fechamento do comércio, incluindo bares e restaurantes, e de obras pelo período de 30 dias. Os estabelecimentos de alimentação ficaram liberados para tele entrega. Também há toque de recolher, das 22h às 5h, e multa de R$ 400 para quem descumpri-lo, além do fechamento das atividades escolares.
Próximas medidas: na sexta-feira (27), o prefeito, Miki Breier (PSB) determinou a continuidade da suspensão das aulas nos ensinos público e privado até 12 de abril. Breier liberou a construção civil a partir desta terça-feira (31), mas manteve as demais atividades suspensas.
Total de casos: 0
Medidas restritivas: fechamento de lojas e postos de gasolina, além de bares, distribuidoras de bebidas, construção civil e oficinas mecânicas. Restaurantes e lancherias podem operar apenas com tele-entrega. Também há suspensão das aulas nas redes de ensino.
Próximos passos: o prefeito Telmo Kirst (PSD) aguarda o fim da validade da maioria dos decretos, nesta terça-feira (30), para avaliar as próximas ações.
* Os números de casos podem apresentar divergência em relação às secretarias municipais de saúde,já que GZH leva em consideração os dados oficiais da Secretaria Estadual da Saúde.