O Senado aprovou na noite desta terça-feira (17) um projeto que mantém o fundo público para as eleições do próximo ano. A proposta original, que afrouxaria regras eleitorais, foi desidratada após repercussão negativa dentro e fora do Congresso. A tentativa de buscar um acordo com Câmara e Executivo para mudanças pontuais no texto, preservando a maior parte da matéria, não teve sucesso. Com isso, todos os artigos aprovados pelos deputados foram derrubados, com exceção do financiamento de campanha. O texto voltará à Câmara para nova votação.
Após um dia de intensa negociação nos bastidores, com a participação de emissários do Planalto, a saída construída apontava para pequenas alterações nos artigos mais polêmicos e a garantia de veto pelo presidente da República de itens considerados prejudiciais. No entanto, o aumento da pressão contrária às mudanças derrubou a alternativa.
Ao anunciar a mudança de planos, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), fez questão de salientar o desconforto com reclamações dirigidas à Casa pelo pouco tempo de debate. Alvo de críticas por tentar votar o texto sem discussão em comissões, atendeu a pedidos de líderes partidários e mudou o discurso, atacando a Câmara.
— O grande problema deste projeto foi o prazo. Ficou sendo discutido na Câmara por 10 meses e chega (ao Senado) faltando 25 dias para acabar o prazo. Acaba aparecendo que a gente está atropelando (o debate).
Alcolumbre chegou a averiguar com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), se haveria a possibilidade de alterar pontos da proposta no Senado e, em seguida, entregar a matéria para que os deputados ratificassem. Maia não concordou, o que aumentou a tensão.
Sem acerto, o relator do projeto no Senado, Weverton Rocha (PDT-MA), apresentou um novo parecer, com a sugestão de manter as regras apenas para garantir o fundo eleitoral para o ano que vem, destacando que o valor deverá ser o mesmo do último pleito, R$ 1,7 bilhão — ainda depende de definição na votação do orçamento.
Rocha também não livrou a Câmara de críticas. Sem esconder que a pressão da opinião externa pesou para definir o novo rumo do projeto, o parlamentar justificou a manutenção do recurso público para as campanhas.
— Nós decidimos tomar uma decisão mais dura, não contra a Câmara, mas a favor do Senado e, também da sociedade. Aqui ninguém é candidato no ano que vem, mas claro que nós sabemos que precisamos preservar a democracia e fortalece-la — disse Rocha, explicando a manutenção do fundo eleitoral no projeto.
Ao comentar a manobra do Senado, Maia discordou das críticas endereçadas ao texto aprovado pelos deputados. Segundo ele, eventuais questões controversas poderiam ter sido contornadas.
— Tem pontos ali, um ou dois, que podem ter alguma polêmica. A questão dos advogados eu discordo da interpretação, mas respeito. Muda-se o texto, dá mais transparência, não tem problema. A questão de pagar multas: tem polêmica, resolve esse tema. Agora, falar que o projeto, como um todo, é ruim, eu discordo completamente.
Ele ainda defendeu a continuidade do financiamento público de campanha como um preço a pagar pela democracia. Quanto à fala do vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, sobre uma provável judicialização do texto aprovado pela Câmara, Maia reclamou de “interferência antecipada do Supremo no Congresso”, o que poderia “restringir a democracia no Brasil”.
Impasse
A minirreforma eleitoral aprovada na Câmara em 3 de setembro havia sido protocolada na casa em novembro do ano passado. O placar foi 263 a favor e 144 contra. Entre as alterações referendadas pelos deputados, estava a possibilidade de contratação de advogados para defender políticos acusados de corrupção, além de pagar multas e sanções aplicadas aos partidos. O texto também facultava a utilização do sistema da Justiça Eleitoral para a prestação de contas das campanhas.
Ao chegar no Senado, o relator preferido pelos apoiadores da proposta, Eduardo Braga (MDB-AM), não pode assumir o posto por problemas pessoais. Em seu lugar, foi escolhido Weverton Rocha (PDT-MA), que reclamou em não ter estudado o texto quando Alcolumbre tentou votar o texto, na última semana, sem debates.
Após críticas, Rocha concordou em alterar trechos na proposta, mas apenas através de emendas de redação, que não exigiriam uma nova votação na Câmara, por não serem vistas como mudanças no texto.
No entanto, além da grita da oposição, entidades que defendem a transparência na gestão pública divulgaram manifesto criticando as mudanças. Em carta aberta, mais de 20 organizações afirmaram que o projeto reduz a transparência e dificulta a fiscalização de eventuais irregularidades em campanhas eleitorais, ampliando brechas para a prática de caixa 2.