Os ex-governadores do Rio de Janeiro Anthony Garotinho e Rosinha Garotinho foram presos na manhã desta terça-feira (3) em operação realizada pelo Ministério Público do Rio (MP-RJ). O casal é suspeito de ter superfaturado contratos celebrados entre a prefeitura de Campos dos Goytacazes e a construtora Odebrecht durante os dois mandatos de Rosinha como prefeita (2009-2016). Os contratos foram firmados para a construção de casas populares dos programas "Morar Feliz I" e "Morar Feliz II".
Os pedidos de prisão e de busca e apreensão foram acatados pelo Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Campos dos Goytacazes. Com as prisões, Garotinho e Rosinha se juntam a Sergio Cabral e Luiz Fernando Pezão no rol de ex-governadores fluminenses que se encontram detidos.
As investigações do Ministério Público estadual começaram a partir de delações de dois executivos da Odebrecht, Leandro Andrade Azevedo e Benedicto Barbosa da Silva Junior, firmadas com o Ministério Público Federal (MPF) no âmbito da Operação Lava-Jato. O MP-RJ afirma que, a partir das informações prestadas, o órgão verificou que os procedimentos licitatórios para a construção das moradias populares foram direcionados para que a Odebrecht saísse vencedora. O órgão diz ter identificado superfaturamento de pelo menos R$ 62 milhões.
Além disso, segundo o MP-RJ, foram pagos pela Odebrecht R$ 25 milhões em vantagens indevidas. De acordo com o órgão, os ex-governadores receberam quantias ilícitas em espécie. Os pagamentos teriam sido realizados pelo setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, também conhecido como o setor de propinas. Segundo o MP-RJ, as planilhas entregues pelos colaboradores indicavam o codinome do beneficiário, valor, data do pagamento e, em alguns casos, até a obra vinculada ao pagamento, a exemplo de "Casas Campos II".
Além de Garotinho, Rosinha, Leandro e Benedicto, também foram denunciados e presos outro executivo da empresa, Eduardo Fontenelle, e três pessoas da confiança dos ex-governadores, Sérgio Barcelos, Ângelo Cardoso Gomes e Gabriela Quintanilha. Segundo o Ministério Público, o trio ajudava a efetivar o recebimento das quantias.
Sérgio Barcelos é subsecretário no governo de Wilson Witzel (PSC) e, segundo o governo, será exonerado do cargo. Ele foi nomeado em agosto na secretaria estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos. Anteriormente, Sérgio havia passado pela liderança do PSL na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e pelo gabinete do deputado estadual Gil Vianna (PSL).
Sérgio foi nomeado após o escanteamento da ex-secretária de Direitos Humanos, Fabiana Bentes, pelo governo Witzel. A exoneração de Fabiana e de parte de sua equipe ocorreu no início de agosto.
Outro lado
Em nota, a defesa de Garotinho e Rosinha nega as acusações e diz que irá recorrer da decisão. A defesa afirma que a Odebrecht ingressou com ação contra o município de Campos para receber mais de R$ 33 milhões porque considerou ter sofrido prejuízo no contrato firmado.
"A defesa estranha, portanto, que o Ministério Público fale em superfaturamento quando a própria empresa alega judicialmente ter sofrido prejuízo", diz a nota.
A reportagem ainda não conseguiu falar com os advogados dos outros suspeitos.
Histórico
Garotinho, que governou o Rio de 1999 a 2002, já havia sido preso três vezes. Em novembro de 2016, na Operação Chequinho, foi detido acusado de comandar esquema de compra de votos na eleição em Campos, sua base eleitoral. Segundo as investigações, Garotinho usou o programa Cheque Cidadão para fins eleitorais, dobrando o número de beneficiários, que não passavam pelo crivo do cadastro ou avaliação de assistentes sociais.
Ele chegou a ser condenado a 9 anos e 11 meses de prisão neste processo e preso outra vez em setembro do ano seguinte. Na ocasião, três agentes da Polícia Federal cumpriram mandado de prisão domiciliar contra o ex-governador, que apresentava seu programa de rádio.
Ao lado da mulher, Rosinha, o ex-governador foi preso novamente em novembro de 2017, a partir de investigações que apuravam os crimes de corrupção, concussão, participação em organização criminosa e falsidade na prestação de contas eleitorais.
Inquérito da Polícia Federal identificou que a JBS havia firmado contrato fictício com uma empresa para repassar R$ 3 milhões para a campanha derrotada de Garotinho ao governo do Rio em 2014.
Rosinha foi solta dias depois por decisão do Tribunal Regional Eleitoral, enquanto Garotinho foi libertado em dezembro pelo então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Gilmar Mendes.
Garotinho também foi condenado em 2010 por formação de quadrilha, sentença confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) em setembro do ano passado. O caso envolvia a nomeação de policiais civis, que assumiam delegacias na zona oeste para favorecer o contrabando de peças para máquinas de apostas e para permitir a exploração do jogo ilegal pelo grupo comandado pelo contraventor Rogério Andrade.
Em outubro do ano passado, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski determinou que Garotinho ficasse solto até que se esgotassem seus recursos na Justiça.
Garotinho tentou concorrer ao governo do Rio nas eleições de 2018, mas teve a candidatura barrada pelo TSE, com base na Lei da Ficha Limpa. Ele foi condenado por improbidade administrativa em maio de 2018, sob acusação de fraudes na saúde durante o mandato de sua mulher, Rosinha (2003-2006), que geraram mais de R$ 234 milhões de danos ao erário. Em dezembro do ano passado, Rosinha foi condenada na mesma ação.
Além disso, o TSE avaliou que outra condenação também impedia Garotinho de ser candidato. Em 2018, o ex-governador foi condenado em segunda instância por calúnia contra o juiz federal Marcelo Leonardo Tavares, a partir de publicações em seu blog pessoal, e teve seus direitos políticos cassados. Ele não recorreu e o processo foi definitivamente encerrado em março do ano passado.