Em busca de recursos extras para reforçar o caixa, amenizar a crise do Estado e voltar a pagar salários de servidores em dia até o fim do ano, o governador Eduardo Leite articula, junto à Câmara dos Deputados, em Brasília, a revisão dos critérios de distribuição de recursos do pré-sal. Se a pressão surtir efeito, a medida poderá significar R$ 1,09 bilhão a mais para o governo do Rio Grande do Sul em 2019, segundo estimativa da Secretaria Estadual da Fazenda.
O debate envolvendo o tema começou em 2010, quando a União cedeu parte da área do pré-sal, na Bacia de Santos, para a Petrobras. A empresa obteve o direito de explorar até 5 bilhões de barris de petróleo por 40 anos. Em troca, antecipou o pagamento de R$ 74,8 bilhões ao governo federal.
Depois disso, descobriu-se volume maior do combustível fóssil na região, o que levou ao ajuste do contrato. Agora, o excedente (de mais de 6 bilhões de barris) irá a leilão. Com o certame, previsto para 6 de novembro, a União espera arrecadar R$ 106,5 bilhões, sendo que R$ 33,6 bilhões ficarão com a Petrobras.
Para garantir que Estados e municípios também sejam beneficiados na partilha, o Senado aprovou, na última terça-feira (3), proposta de emenda à Constituição (PEC) que permite à União distribuir o dinheiro. Segundo o texto, R$ 10,95 bilhões (15% do valor restante) serão destinados aos municípios e outros R$ 10,95 bilhões (15%), aos Estados e ao Distrito Federal. O Rio de Janeiro ganhará mais do que os demais (R$ 2,5 bilhões) porque o leilão ofertará blocos de exploração na costa fluminense (leia os detalhes abaixo).
Ainda de acordo com a PEC, os valores serão distribuídos segundo as mesmas regras usadas para o repasse dos fundos de participação dos Estados (FPE) e dos municípios (FPM). A metodologia, nesses casos, privilegia os locais menos desenvolvidos e com menor renda familiar per capita, o que, segundo o Palácio Piratini, acabará prejudicando o Rio Grande do Sul na divisão do bolo.
Como houve modificações no texto original, a PEC voltará à Câmara para que os deputados confirmem a nova versão. É nessa brecha que Leite aposta para tentar reverter o problema. Na última quarta-feira (4), o governador foi a Brasília conversar sobre o assunto com deputados, líderes de bancada e com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
— Os critérios aprovados no Senado para a divisão dos recursos são muito ruins para o Rio Grande do Sul, pois receberemos menos em relação a outros Estados. Como o projeto volta para a Câmara, estou trabalhando para que os deputados se sensibilizem e compreendam a importância de definir critérios mais justos para a divisão dos recursos — disse Leite.
O Piratini defende a adoção da fórmula usada na liberação do Fundo de Exportação (FEX) ou dos recursos da Lei Kandir, por ser menos nociva ao Estado – embora as duas rubricas não venham sendo pagas pela União (outro problema na pauta de Leite). Se os critérios não forem alterados pela Câmara, a Secretaria da Fazenda estima que o Estado receberá de R$ 131 milhões a R$ 240 milhões. Caso a estratégia dê certo, o valor aumentará para R$ 1,09 bilhão.
Embora a soma não seja suficiente para cobrir o rombo projetado para 2019 (R$ 3,8 bilhões), é bastante próxima do valor líquido de uma folha de pagamento do Executivo (R$ 1,2 bilhão). Aliado a outras medidas, o reforço pode ajudar Leite a cumprir a promessa de campanha de voltar a pagar os salários do Executivo sem atrasos até o fim do ano.
Na avaliação do subsecretário do Tesouro do Estado, Bruno Jatene, a alteração dos critérios seria uma oportunidade única para a União "reparar parte das perdas históricas em relação aos repasses da Lei Kandir e do FEX". Alvo de críticas, a lei foi criada em 1996 e, desde então, os governos estaduais são impedidos de cobrar imposto sobre determinados tipos de exportação, sem receber a devida compensação.
— Seria uma importante reparação ao Rio Grande do Sul, sobretudo porque nos parece o critério mais razoável, tendo como objetivo compensar as perdas na exportação. A título de informação, dependendo do critério, o repasse pode subir em quase R$ 950 milhões. Isso equivale a quase cinco meses de repasse para a área da saúde ou dois terços de uma folha de pessoal do Executivo ou ainda pouco mais de quatro vezes o total investido pelo Estado com recursos próprios em 2018 — ressalta Jatene.
A proposta de Leite conta com a simpatia do governo de São Paulo, que também sairá beneficiado com a eventual mudança. Apesar disso, tende a enfrentar resistência entre governadores do Nordeste e de outros Estados com menor renda – em caso de mudança, essas áreas perderão recursos.
O que é a cessão onerosa do pré-sal
- Em junho de 2010, com a sanção da Lei nº 12.276, a União foi autorizada a "ceder onerosamente" à Petrobras o exercício das atividades de pesquisa e lavra de petróleo e de gás natural, entre outros produtos do tipo, em áreas do pré-sal.
- Pelo contrato, a Petrobras ganhou o direito de explorar até 5 bilhões de barris de petróleo por 40 anos, na bacia de Santos. Em troca, a estatal antecipou o pagamento de R$ 74,8 bilhões ao governo.
- Depois, descobriu-se mais combustível fóssil na região, o que levou à revisão do contrato.
- Com isso, o volume excedente (de pelo menos mais 6 bilhões de barris) será ofertado em leilão, previsto para 6 de novembro.
- Para ter o direito de explorar as áreas de Sépia, Búzios, Atapu e Itapu, os vencedores deverão firmar acordo com a Petrobras e deverão pagar bônus de outorga de R$ 106,5 bilhões.
Como será a partilha do dinheiro
- Dos R$ 106,5 bilhões previstos, R$ 33,6 bilhões ficarão com a Petrobras.
- O restante (R$ 72,9 bilhões) será partilhado conforme definido na proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada na última terça-feira (3) no Senado.
- Segundo o texto, R$ 21,9 bilhões (30% dos R$ 72,9 bilhões) serão divididos entre Estados e municípios.
- Como o leilão irá ofertar blocos de exploração de petróleo na costa fluminense, o Rio de Janeiro receberá R$ 326 milhões da partilha mencionada acima, mais R$ 2,19 bilhões (3%) da parte da União, totalizando R$ 2,5 bilhões.
- A União ficará com R$ 48,8 bilhões.
Critério em debate
- A distribuição dos recursos para os Estados terá como base os mesmos critérios usados na liberação do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
- Essas regras privilegiam locais menos desenvolvidos e com menor renda familiar per capita, o que prejudicará Estados como o Rio Grande do Sul e São Paulo.
- Como a PEC da cessão onerosa foi alterada no Senado, o texto terá de voltar para a Câmara para receber a chancela dos deputados federais.
- O governador Eduardo Leite aproveita a brecha para tentar convencer os parlamentares a alterarem os critérios, adotando a fórmula de distribuição da Lei Kandir ou do Fundo de Exportação (FEX), considerados mais benéficos.
- Se não tiver êxito, o RS receberá de R$ 131 milhões a R$ 240 milhões. Se Leite conseguir mudar as regras, o Estado poderá receber R$ 1,09 bilhão.