Pesquisadores brasileiros dizem que a exoneração de Ricardo Galvão, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), não é surpreendente, mas ainda assim é chocante e pode prejudicar a imagem externa do país. O ministro da Ciência e Tecnologia Marcos Pontes decidiu exonerar Galvão nesta sexta-feira (2), após críticas a dados sobre desmatamento considerados sensacionalistas pelo governo.
Em nota, Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, uma rede de 47 organizações da sociedade civil, diz que a exoneração é lamentável, mas esperada.
"Ele selou seu destino ao não se calar diante das acusações atrozes de Jair Bolsonaro ao Inpe. Ao reagir, Galvão também preservou a transparência dos dados de desmatamento, ao chamar a atenção da sociedade brasileira e da comunidade internacional para os ataques sórdidos, autoritários e mentirosos de Bolsonaro e Ricardo Salles à ciência do Inpe", disse.
Além disso, Rittl afirmou que a imagem do Brasil fica comprometida pela "cruzada contra os fatos".
Ronald Cintra Shellard, diretor do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, também disse que, apesar de esperada, a exoneração é chocante. Shellard também avaliou que a demissão pode prejudicar a imagem do Brasil no Exterior.
— Esse evento vai trazer uma reputação para o país muito séria. Vai ter consequência muito negativa sobre como o país trata os cientistas — disse.
O diretor da CBPF usa artigo da revista científica Nature, publicado nesta quinta (1º), como exemplo. O texto "'Tropical Trump' sparks unprecedented crisis for Brazilian science" ('Trump tropical' leva ciência brasileira a crise sem precedentes, em tradução livre) cita os ataques de Bolsonaro aos dados produzidos pelo Inpe. De acordo com Shellard, a indignação do pesquisador é compreensível.
— Cada um teria reagido de maneira distinta, mas o ponto fundamental é que não é aceitável que autoridades faltem com respeito a subalternos — disse o diretor do CBPF. — Autoridades não têm o direito de faltar com respeito ao cidadão — defendeu.
Segundo Shellard, é preciso deixar claro que o desmatamento na Amazônia é uma responsabilidade dos ministros, do presidente e de toda geração atual com as pessoas que estarão vivas em 2100.
— O presidente da República tem uma filha nova que vai estar viva em 2100. A questão da Amazônia vai ter um impacto importantíssimo na vida dos nossos filhos e netos. É preciso ter responsabilidade para entender o que está acontecendo antes de reagir — afirmou o pesquisador.
— Ironicamente, do ponto de vista político, Galvão sempre foi conservador — disse Shellard, que era vice-diretor do CBPF no período em que Galvão foi diretor do centro.
Márcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace, alertou contra um projeto "antiambiental" que o "novo governo vem implementando.
"Bolsonaro sabe que seu governo é o principal responsável pelo atual cenário de destruição da Amazônia. A exoneração do diretor do Inpe é apenas um ato de vingança contra quem mostra a verdade. O novo governo vem implementando no país um projeto antiambiental, que sucateia a capacidade do Estado de combater o desmatamento e favorece quem pratica o crime florestal."