Os destinos da Amazônia passaram pelo Rio Grande do Sul. Foi há cerca de três meses, durante uma conversa, na Cúria Metropolitana, entre o arcebispo Dom Jaime Spengler e o comandante do Exército, general Edson Pujol. Ao redor de uma longa mesa de madeira, representantes das duas instituições – Igreja e Forças Armadas – conversaram sobre o Sínodo da Amazônia, um assunto que crescerá até outubro. É quando começa, em Roma, o encontro do Papa Francisco com os bispos da região, que se estende por nove países. Serão 21 dias de debates sobre temas centrados em dois eixos: evangelização e preservação ambiental. É aí que começam as preocupações dos militares brasileiros. No dia 12 de fevereiro, o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional do governo Bolsonaro, tornou pública uma posição que não é só dele: "Da Amazônia brasileira, quem cuida é o Brasil".
Na mesma sala em que se encontrou com a cúpula do Exército, Dom Jaime Spengler manuseia o documento que servirá de base para o sínodo. O Instrumentum Laboris é um calhamaço de folhas impressas e com dezenas de anotações à caneta. "Não há motivo para qualquer preocupação quanto à soberania brasileira" garante. De fato, a preocupação do Papa Francisco com a região tem focos bem definidos.
A presença crescente de outras seitas e correntes religiosas, a maioria cristãs, vem desafiando a importância da Igreja na região. Além disso, o papa é verdadeiramente sensível a temas como aquecimento global e desmatamento. São preocupações legítimas, mas que, na visão estritamente política, podem ser confundidas com pautas da esquerda.
Dom Jaime, um dos principais líderes católicos no Brasil, repete o que vem dizendo, inclusive ao comando do Exército. A lógica da Igreja é outra, voltada sim à defesa dos pobres e dos vulneráveis, mas sem viés partidário.
O debate transparente, democrático e público entre Forças Armadas e religiosos é apenas um dos pontos de pressão gerados pelo Sínodo da Amazônia, que tem como lema "Novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral". Setores invisíveis e poderosos já se movimentam há dois anos, quando o encontro começou a tomar forma. Indústria farmacêutica, agronegócio, ambientalistas, mineradoras, partidos políticos, ongs, indústria do petróleo e indústria química são alguns dos interessados no resultado da assembleia. Mesmo entre os fiéis à Roma, o tema encontra posições diferentes.
O Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, "entidade civil de inspiração católica", percorre nesse momento os Estados amazônicos com um abaixo-assinado em defesa da soberania brasileira na região, onde a Igreja ainda representa a maioria das populações urbanas.
Os sínodos culminam com a aprovação de um documento construído ao longo de três semanas de debates presenciais. Em posse dele, o papa pode ou não emitir uma exortação – um chamado à ação que serve de orientação para a gigantesca estrutura capitalizada de paróquias e líderes religiosos. No caso da Amazônia, as análises convergem para a certeza de que o Papa Francisco se pronunciará de forma concreta e objetiva em um documento pós-sinodal. E aí, cada palavra fará diferença.