À frente da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), Eduardo Cunha da Costa acompanha de perto as reuniões do grupo de técnicos que estuda propostas para alterar o regime de Previdência dos servidores estaduais. A PGE é responsável por avaliar, juridicamente, a viabilidade das medidas.
Na avaliação dele, o rombo no sistema previdenciário se tornou insustentável e é imperativo mexer no sistema, mesmo sendo um tema espinhoso. A seguir, leia os principais trechos da entrevista, concedida na sede do órgão, em Porto Alegre, na última quarta-feira.
Com a exclusão dos Estados da reforma da Previdência, o governo já sabe que mudanças pode propor via Assembleia?
Sim. O artigo 40 da Constituição Federal, que traz os requisitos para os servidores públicos civis, limita alterações, mas estamos analisando o texto da PEC (proposta de emenda à Constituição) em debate no Congresso para verificar o que será possível fazer a partir dela. Hoje, por exemplo, não podemos ampliar a idade mínima de aposentadoria dos servidores ou estabelecer alíquotas para os inativos que ganham abaixo do teto da Previdência (R$ 5,8 mil). Mas, dependendo do desfecho em Brasília, isso será possível.
Mesmo sem a inclusão dos Estados, a PEC abre brechas?
Sim. Se o texto atual for aprovado como está, os Estados poderão propor as mudanças que mencionei. Há também uma análise jurídica sobre o timing: se podemos nos antecipar ou se temos de aguardar a aprovação final da PEC federal para enviar propostas à Assembleia. Aqui, uma PEC necessita, em média, de 90 dias de tramitação. Se isso acontecer depois de setembro, já não teremos votação em segundo turno neste ano (PECs precisam passar por duas votações).
O governo estadual corre contra o tempo?
Sim, é uma corrida contra o tempo. O governador tem sinalizado para que tenhamos essa análise pronta o mais rápido possível.
Como seria a alíquota para servidores aposentados que ganham menos?
Atualmente, inativos que recebem acima de R$ 5,8 mil contribuem com 14% sobre o valor que excede o teto da Previdência. Quem recebe abaixo do teto, não contribui. A PEC federal permite a criação de uma alíquota progressiva, que pode ser menor do que 14% para os que ganham menos e maior do que isso para o que ganham mais. Há também previsão na PEC de que o limite mínimo para incidência caia de R$ 5,8 mil para um salário mínimo, o que aumentaria o número de aposentados contribuindo.
Então a alíquota para quem ganha menos seria mais baixa?
Juridicamente, é possível ser menor para quem ganha menos.
Qual seria o impacto financeiro disso para o Estado?
A Secretaria da Fazenda está fazendo esses cálculos.
O governo estuda aplicar alíquota progressiva acima de 14% para os servidores que ganham mais? Isso é viável?
É viável, desde que o texto final aprovado no Congresso não restrinja a medida à União. Se o Senado fizer modificações no texto aprovado na Câmara, é possível que tenhamos espaço para legislar aqui.
Sobre que temas o Estado já tem liberdade de propor mudanças sem ter de esperar por alterações federais?
Temos margem para alterar a previdência militar (que, no Estado, abrange os policiais militares), porque isso não está amarrado à Constituição Federal. Os parâmetros estão na Constituição estadual. Por meio de uma PEC, poderia ser alterado o regime.
É a discussão mais adiantada? Que mudanças deverão ser propostas?
Ainda não há uma definição sobre isso.
A integralidade e a paridade (aposentadorias no valor do salário integral e atreladas a reajustes concedidos a ativos) serão mantidas?
A PEC em debate no Congresso, por enquanto, está preservando isso para a Polícia
Federal. Então, temos uma discussão jurídica aqui. Ainda estamos avaliando.
Quantos projetos serão enviados à Assembleia?
Serão vários. Em alguns casos, serão PECs e, em outros, projetos de lei complementar.
Serão enviados todos juntos?
Isso ainda não está decidido. Estamos preparando uma apresentação completa para o governador, inclusive com os cálculos atuariais que justificam as alterações. A partir daí, ele decidirá a melhor estratégia política.
Até agora, o governo teve êxito na Assembleia Legislativa. Qual é a expectativa?
Sabemos que são temas delicados. Vai ser um desafio para a base do governo, mas o governador tem alertado para a necessidade de promovermos alterações estruturais que de fato tirem o Estado da situação em que se encontra. O déficit previdenciário é insustentável.
A adesão do Estado ao regime de recuperação fiscal depende dessas mudanças?
Todas as medidas de ajuste que propomos estão no nosso plano de recuperação e contam a favor do Estado. Quando tivermos os projetos tramitando na Assembleia, vamos apresentar o detalhamento ao ministro (da Economia) Paulo Guedes. Já estivemos com ele e foi muito positivo. Não se trata apenas de fazer modificações para fins de adesão. Estamos propondo medidas que terão resultados permanentes para a sociedade.