O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), rebateu nesta terça-feira (19) críticas direcionadas ao inquérito que apura notícias falsas e agressões contra a Corte, afirmando que os críticos "podem espernear à vontade". Ele é o responsável pela investigação.
Após a abertura do inquérito, anunciada na quinta-feira (14) pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, no início da sessão plenária, o Supremo foi alvo de manifestações contrárias à ação, entre outras razões pelo fato de ela ter sido instaurada sem a participação do Ministério Público, por exemplo, ou por ser muito ampla, sem um objeto claro.
— No direito nós chamamos isso de jus esperniandi. Pode espernear à vontade, pode criticar à vontade — disse Moraes, que informou já ter mobilizado a Polícia Federal (PF) e as polícias Militar e Civil de São Paulo para auxiliarem nas investigações.
O ministro confirmou que deve determinar diligências de ofício, isto é, por conta própria e sempre que julgar necessário, sem a necessidade de manifestação de qualquer outra instituição.
— O inquérito é presidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não é presidido pela Polícia Federal com participação do Ministério Público — disse.
Uma das frentes de investigação indicadas por Moraes irá se debruçar sobre as fontes de financiamento a redes de robôs virtuais — conhecidos como bots — criadas no Twitter e no WhatsApp para disseminar mensagens de ataque ao STF e a seus ministros. Ele disse já ter se reunido com setores de inteligência policial de São Paulo para que auxiliem nessa frente. De acordo com o ministro, há fortes suspeitas de que os grupos de financiamento maiores sejam de São Paulo.
— Não se pode permitir, num país democrático como o Brasil, em que as instituições funcionam livremente há 30 anos, que porque você não gosta de uma decisão você prega o fechamento de uma instituição republicana, você prega a morte de ministros, morte de familiares, isso extrapola a liberdade de expressão. A liberdade de expressão não comporta quebra da normalidade democrática e discurso de ódio — afirmou Moraes.
Críticas
No dia seguinte ao anúncio da investigação, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu esclarecimentos sobre o procedimento, que foi instaurado como um processo sigiloso e sem apontar alvo específico.
Ela argumentou que o dever de investigar cabe exclusivamente ao Ministério Público, conforme previsto pela Constituição. A PGR ressaltou também não terem sido apontadas pessoas com prerrogativa de foro que atraísse a competência do Supremo para supervisionar o inquérito.
— Os fatos ilícitos, por mais graves que sejam, devem ser processados segundo a Constituição. Os delitos que atingem vítimas importantes também devem ser investigados segundo as regras constitucionais, para a validade da prova e para isenção no julgamento — escreveu ela no pedido formal de esclarecimentos.
Nesta terça-feira de manhã, Moraes se reuniu por cerca de duas horas com Raquel Dodge em seu gabinete no STF, mas negou ter discutido o inquérito sobre as fake news. Ele afirmou que a instauração de investigação por conta própria pelo Supremo está amparada no regimento interno do tribunal.
A iniciativa de Toffoli foi também criticada pelo ministro Marco Aurélio Mello, para quem o inquérito não poderia ter sido aberto sem consulta ao plenário, sendo obrigatório o encaminhamento da apuração para condução pelo Ministério Público.
— Não deliberamos nada —, disse Marco Aurélio, que atribuiu o inquérito a uma iniciativa própria de Toffoli. —Não deliberamos nada, muito menos a designação ad hoc [para fim específico] do relator — repetiu, fazendo referência à escolha de Moraes como relator sem que tenha havido livre sorteio entre os demais ministros.
Ao menos um outro ministro também criticou, reservadamente, a iniciativa. Ainda na semana passada, seis subprocuradores da República divulgaram uma carta expressando "extrema preocupação" com o fato de que "manifestações protegidas pela liberdade de expressão venham a ser investigadas como se constituíssem crime".
Apoios
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por outro lado, manifestou apoio à iniciativa de Toffoli, afirmando que os advogados também têm sido alvo de ataques virtuais.
— A apuração dos fatos é fundamental para o esclarecimento dos ataques e para a possível punição dos responsáveis por essas verdadeiras milícias digitais, que minam os pilares de nossa sociedade — disse a OAB por meio de nota.
Em nota conjunta, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) também apoiaram a abertura da investigação.
— A iniciativa do ministro Dias Toffoli, respaldada pelo regimento interno do STF, demonstra que ninguém está acima da lei. O Supremo Tribunal Federal não pode ficar refém de ataques, ameaças ou denúncias infundadas, que visam a atingir a honra e reputação de seus integrantes — disse o comunicado.