A intervenção federal na área da segurança pública do Rio de Janeiro, anunciada nesta sexta-feira (16) pelo presidente Michel Temer, divide opiniões entre especialistas no assunto. Veja a opinião de alguns experts consultados por GaúchaZH:
José Vicente da Silva Filho
coronel reformado da PM paulista e ex-secretário nacional de Segurança Pública
O coronel reformado defende a medida e considera que o Rio "pode fazer escola para ver as vantagens e os problemas dessa ação". Vicente acredita que o governo estadual há muito tempo perdeu a condição de garantir a segurança no Estado.
— Há um cálculo, feito pela própria PM, de que existam 3 mil fuzis em mãos de bandidos no Rio. Bandidos trancaram as três principais vias da cidade, no Carnaval. Em nenhum lugar no mundo acontece esse domínio de facções criminosas, talvez só na Somália — diz o especialista.
É por isso que Vicente defende uma medida extrema, que pode ser a intervenção das Forças Armadas. Mas com data para terminar, o último dia deste ano, para que não gere constrangimento ao próximo ocupante do Palácio Guanabara. Vicente reforça que a intervenção precisa funcionar como base para uma reforma estruturante na área, que efetivamente coíba o envolvimento de policiais com criminosos. Um dos estímulos a isso é o de oficiais trabalhando com empresas privadas. É preciso acelerar a expulsão ou demissão de policiais pelo menor fator de corrupção, como ocorreu na Colômbia, opina o coronel reformado.
Adriano Klafke
coronel da reserva da Brigada Militar e consultor em segurança pública
Klafke acredita que a intervenção federal com Forças Armadas só tem algum sentido se os ambientes forem modificados por outras áreas públicas, inclusive as de responsabilidade municipal — regularização urbana, por exemplo.
Boa parte da explicação para a balbúrdia no Carnaval, segundo o coronel da reserva da BM, é a impunidade. A horda de bandidos sabia que sua eventual prisão não seria grande coisa.
Sem uma série de medidas, a condição favorável para a intervenção federal será apenas "episódica", momentânea. Entre as medidas elencadas por Klafke está frear o financiamento (pelo consumo) do tráfico violento e controle de fronteiras, por onde sai esse dinheiro e por onde entram cocaína, maconha e fuzis. Aliás, esse controle deve ser feito pela União. É preciso lembrar, inclusive, a maior guarnição das Forças Armadas do Brasil está localizada no Rio de Janeiro, e não nas fronteiras.
Marcos Rolim
sociólogo, jornalista e consultor em políticas públicas sobre criminalidade
Rolim considera a saída uma temeridade. Ele admite que a situação do Rio é bastante grave, fundamentalmente pelo descontrole do Estado sobre as polícias. Há disputas internas nas corporações, com grupos influentes associados ao tráfico e envolvidos em muitos crimes.
— Nada diferente, em síntese, de boa parte da política do Rio. Isso poderia justificar o pedido de intervenção do governador. O problema, entretanto, não é a emergência, mas o futuro. O Brasil está se acostumando a lidar com o improviso como solução.
O especialista diz que a ação no Complexo da Maré durou mais de um ano, custou R$ 600 milhões e não resolveu um só problema. Agora, com o decreto de intervenção federal, toda a segurança do Rio está subordinada a um general. Rolim acredita que estamos perdendo, novamente, a chance de estruturar uma pauta de reformas institucionais na área.
— O Brasil precisa de uma Academia Nacional de Polícia e de uma Inspetoria Nacional. A primeira, unificaria a doutrina das polícias em todo o País e modernizaria a concepção da segurança pública; a segunda, asseguraria o controle externo sobre as polícias, coisa que a Constituição atribuiu ao Ministério Público, mas que não existe, na prática.
Wálter Fanganiello Maierovitch
juiz aposentado, ex-secretário nacional antidrogas e especialista em máfias
O especialista, também professor universitário, acredita que a intervenção federal é um despertar das autoridades para a falência de um modelo de segurança pública centralizado nos Estados (federação), e não na União. As nações europeias têm ministro do Interior, que cuida da segurança, ressalta Maierovitch. Já no Brasil este cargo foi extinto há quase 30 anos. Agora, ao que tudo indica, será recriado na figura de um ministro da Segurança Pública, e a ponta de lança para a experiência parece ser a intervenção das Forças Armadas no Rio.
— Em princípio, chegou tarde a medida. Espero que seja séria, não apenas um oba-oba ou cabide para penduricalhos políticos. É preciso atacar a economia do crime e recuperar territórios hoje em mão de facções criminais. Com relação ao ministério, deve ser colocado lá um especialista em segurança.