A condenação unânime de Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) opõe dois momentos da vida pública de um dos principais líderes do país, com reflexos na próxima eleição. Em 2010, na Presidência, Lula sancionou a Lei da Ficha Limpa, de iniciativa popular, saudada como atalho para a moralização da política nacional. Oito anos depois, condenado em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o petista traça estratégias para não ser enquadrado na norma que poderá abreviar seu projeto de voltar ao Palácio do Planalto.
Há dois caminhos no horizonte de Lula para isso. Um deles está na própria Justiça comum que o puniu com 12 anos de prisão. Ele pode pleitear uma liminar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que congele os efeitos da condenação do TRF4 e, consequentemente, sua inelegibilidade. Será preciso apresentar fortes argumentos de contestação ao acórdão da Corte regional. Em caso de insucesso, o último passo é buscar a liberação para o pleito no Supremo Tribunal Federal (STF), onde apenas a constitucionalidade é analisada. Se houver nova negativa, o caso estará transitado em julgado.
– Tem de mostrar que houve um erro, uma lesão indevida e injustificada e passível de conserto na instância superior – pontua o advogado especialista em direito eleitoral Antônio Augusto Mayer dos Santos.
Aval para “ficha suja” concorrer depende de argumento forte
O outro caminho está na própria Ficha Limpa. A lei, que barrou mais de 2 mil candidaturas nas eleições de 2016, abre a possibilidade, mesmo para um candidato “ficha suja”, de concorrer sem a garantia de que irá assumir o mandato em caso de vitória.
– A Ficha Limpa prevê a inelegibilidade, mas também a possibilidade de suspensão. Prevê o impedimento e o remédio – diz o coordenador do Gabinete Eleitoral do Ministério Público gaúcho, Rodrigo Zilio.
Pela lei, o petista poderá registrar sua candidatura até 15 de agosto. Os postulantes ao cargo de presidente são julgados pelo colegiado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se o pedido de registro for indeferido, um recurso extraordinário poderá ser apresentado ao STF, com poucas chances de êxito.
– Sem a suspensão anterior da inelegibilidade, há a possibilidade de recurso, mas estará destituído de fundamento – diz o advogado e ex-juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, analisando o caso específico do ex-presidente.
Na avaliação dos especialistas, a concessão de liminar para que um candidato “ficha suja” concorra deve ser embasada por elementos que possam permitir reversão de condenação em instâncias superiores. Conforme a lei, o pedido precisa de “plausibilidade”.
A principal consequência de uma guerra de recursos é a anulação da eleição por impugnação do concorrente vitorioso. No Rio Grande do Sul, por exemplo, oito cidades precisaram voltar às urnas em 2017 para eleger prefeitos, depois que os mais votados no ano anterior foram barrados. O prazo diminuto entre o registro das candidaturas (15 de agosto) e o primeiro turno da eleição (7 de outubro) é apontado como o principal responsável pela demora nos julgamentos para a liberação de candidatos.
– A discussão das concorrentes tem de ser antecipada. Os registros dos candidatos devem ocorrer bem antes da eleição – diz o jurista Luiz Magno.