A aparente tranquilidade apresentada publicamente por aliados de Michel Temer às vésperas da votação da segunda denúncia contra o presidente contrasta com discursos fortes em reuniões reservadas. Durante toda a terça-feira, a tropa de choque do Planalto articulou para ampliar a projeção de apoio contra o processo, que aponta risco de redução dos 263 votos conquistados no sepultamento da primeira denúncia, em agosto. Deputados de partidos da base aliada que votarem a favor da investigação devem ser tratados como oposição, avisam emissários do governo.
Apesar da expectativa de vitória, já que o apoio mínimo para barrar as acusações é de 171 parlamentares, um placar mais magro é visto como empecilho para os planos futuros do governo. Textos polêmicos devem entrar na pauta do Congresso nos próximos meses. Outra preocupação é referente ao quórum mínimo para abrir a votação desta quarta-feira (25). Para a apreciação, são necessários 342 deputados no plenário.
Focos de incêndio surgidos em partidos que integram o centrão, que votam com o governo, ampliam o temor de uma vitória com expressão menor. As principais reclamações do bloco, liderado por deputados de PP, PSD, PTB, PRB e PR, envolvem maior rapidez na liberação de verbas para obras e nomeações de indicados políticos.
Entre as ações de convencimento, está o empenho de emendas, que saltaram de R$ 273 milhões em setembro para R$ 683 milhões em outubro. À época da votação da primeira denúncia, mais de R$ 4 bilhões em emendas foram empenhadas, mas grande parte do valor ainda não foi liberado.
A situação faz com que representantes do Planalto aumentem o peso do discurso contra os infiéis. Em relação aos integrantes da base que já se posicionaram favoravelmente à continuidade do processo, os recados são duros. Há deserções até mesmo no PMDB, partido de Temer. Para Carlos Marun (PMDB-MS), correligionários que votarem com a oposição, o que classificou como "extrema covardia", devem pedir para deixar a sigla. Caso não haja o pedido, "medidas extremas" poderão ser tomadas, promete:
— Estou analisando um pedido de expulsão. Se o governo agir de forma firme com os outros partidos, vou fazer isso com o PMDB.
Conforme o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), infiéis devem ser tratados a "pão e água":
— O deputado é governo ou não é governo. Apoia a proposta de reconstrução do país ou não apoia.
O discurso é suavizado quando avança em direção ao PSDB. Na votação da primeira denúncia, os tucanos se dividiram, com 22 votos a favor de Temer e 21 contra. A situação gerou desconforto entre outras legendas da base do governo, que consideram demasiado o espaço ocupado pela sigla.
Oposição aposta no desgaste
Na noite de segunda-feira, líderes aliados participaram de jantar com o presidente. Antes do prato principal — filé mignon e salmão —, a discussão mirou a fidelidade. Na tarde desta terça-feira (24), Temer chamou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Após a agenda, Maia desconversou sobre a reunião e garantiu distanciamento na votação da denúncia, que envolve também os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco – o Supremo Tribunal Federal negou nesta terça pedido para fatiamento da votação conforme os acusados.
Mesmo crentes do sepultamento da acusação, partidos da oposição prometem dificultar as coisas para o governo. Parlamentares de pelo menos nove legendas não irão registrar presença até que o quórum mínimo para o início da votação seja alcançado.
Nas projeções de Henrique Fontana (PT-RS), cerca de 150 colegas deverão ir à sessão, mas sem ratificar o comparecimento. Se o número se confirmar, os aliados de Temer teriam de trabalhar com margem apertada para conseguir dar início à apreciação do relatório.
– Queremos que o governo não vote. Defendemos mais uma semana de debate – diz Fontana.