A Polícia Federal (PF) no Rio Grande do Sul vai conduzir os inquéritos que envolvem gaúchos com foro privilegiado e cuja investigação foi autorizada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). O trabalho será feito por um núcleo da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros (Delecor), ligado ao grupo principal da PF que atua em Brasília.
O RS é o primeiro Estado a dar apoio por meio de um núcleo às investigações de suspeitos com foro privilegiado no STF. A opção pela PF gaúcha é consequência da especialização de delegados e agentes em crimes de corrupção e financeiros. A medida também servirá para reduzir a sobrecarga dos policiais de Brasília, envolvidos com cerca de cem inquéritos de pessoas com foro privilegiado.
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As investigações que serão feitas pela PF gaúcha são relacionadas ao ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha (PMDB), aos deputados federais Marco Maia (PT), Maria do Rosário (PT), Onyx Lorenzoni (DEM) e Yeda Crusius (PSDB) e aos executivos Humberto Kasper e Marco Arildo Prates da Cunha, ambos ex-presidentes da Trensurb. Os investigados estão sendo intimados para prestar depoimento, que pode ocorrer na sede da PF em Porto Alegre ou em Brasília.
Padilha, Maia e os ex-dirigentes da Trensurb são suspeitos de desvios na obra de extensão da linha do trem entre São Leopoldo e Novo Hamburgo. Kasper e Marco Arildo não têm foro privilegiado, mas permanecem no âmbito do STF pelo fato de serem investigados no mesmo procedimento de dois políticos com esse direito.
Ex-governadora, Yeda é alvo por ter supostamente recebido cerca de R$ 1,75 milhão da Odebrecht para facilitar a recuperação de créditos de ICMS à Braskem, empresa controlada pela empreiteira. Rosário e Onyx Lorenzoni são suspeitos de falsidade ideológica eleitoral por movimentar recursos via caixa 2. Todos negam as acusações, feitas por delatores da Odebrecht.
A relação da PF gaúcha com o trabalho da Lava-Jato é antiga. Em março de 2015, quando foi revelada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a primeira lista de investigados com foro privilegiado, o delegado gaúcho Thiago Machado Delabary foi destacado para montar e coordenar o grupo de investigadores em Brasília. Hoje, ele ainda conduz inquéritos na capital federal e atuará diretamente no núcleo criado no Estado para prestar apoio à Lava-Jato nos casos de competência do STF.
Ficará a cargo de Delabary a interlocução com a equipe de Brasília, na qual atua desde 2015. Foi ele o responsável, por exemplo, pelos inquéritos dos senadores Ciro Nogueira (PP-PI) e Gleisi Hoffmann (PT-PR). Dependendo do ritmo do trabalho, outros inquéritos em que estão citados gaúchos sem foro privilegiado podem ser remetidos a Porto Alegre.
O que pesa contra os suspeitos
Eliseu Padilha (PMDB): o ministro-chefe da Casa Civil é alvo de dois inquéritos. Segundo a delação da Odebrecht, teria recebido R$ 4 milhões via caixa 2 para campanhas do PMDB em 2014. Além disso, delatores da empreiteira relataram ter pago a ele mais R$ 1,49 milhão a título de propina nas obras de ampliação do trensurb, entre Novo Hamburgo e São Leopoldo. O peemedebista teria solicitado 1% sobre o valor do contrato para "ajudar no processo licitatório". Nas planilhas da Odebrecht, Padilha aparece identificado pelo codinome "Bicuíra".
Marco Maia (PT): ex-dirigentes da Odebrecht informam que o deputado teria exigido 0,55% (R$ 734,7 mil) do valor do contrato da linha 1 do trensurb (Novo Hamburgo a São Leopoldo) para ajudar a não "ter entraves" no negócio. Maia também teria recebido, via departamento de propinas da empreiteira, R$ 1,35 milhão para a campanha de 2014.
Marco Arildo da Cunha e Humberto Kasper: então dirigentes da Trensurb, teriam participado da reunião na qual Maia teria pedido propina a representantes da Odebrecht. Eles respondem por lavagem de dinheiro e corrupção, por suposto recebimento de valores: R$ 260,3 mil para Arildo e R$ 38,7 mil para Kasper.
Yeda Crusius (PSDB): segundo os delatores, a deputada e ex-governadora teria recebido cerca de R$ 1,75 milhão durante as campanhas de 2006 e 2010 para facilitar a recuperação de créditos de ICMS à Braskem, empresa controlada pela empreiteira. Do total, R$ 800 mil foram declarados à Justiça Eleitoral, e o restante teria sido pago por meio do departamento de propinas da empresa.
Maria do Rosário (PT): a deputada federal é investigada por caixa 2. De acordo com Alexandrino de Alencar, ex-diretor da Odebrecht, Maria do Rosário teria recebido R$ 150 mil na campanha de 2010.
Onyx Lorenzoni (DEM): o deputado federal é investigado por caixa 2. De acordo com Alexandrino de Alencar, Onyx teria recebido R$ 175 mil na campanha à Câmara em 2006.