O prefeito Sebastião Melo (MDB) confirmou o favoritismo e terminou o primeiro turno da eleição em Porto Alegre à frente dos concorrentes, com 49,72% dos votos válidos. A sólida votação, pouco abaixo do necessário para que fosse reeleito já neste domingo (6) — se ele tivesse feito 50% dos votos mais um, não haveria segundo turno —, aproxima ainda mais o emedebista de garantir um novo período no Paço Municipal.
Na segunda etapa, Melo fará um confronto direto com Maria do Rosário (PT) para definir quem governará a capital gaúcha pelos próximos quatro anos, em um desafiador período de reconstrução do sistema de defesa contra enchente.
— Agradeço ao povo de Porto Alegre pela extraordinária vitória nesse primeiro turno. Tentaram crucificar o Melo na enchente e o povo respondeu na urna — vibrou Melo, em coletiva de imprensa no comitê central de campanha, na Avenida Pernambuco.
Ao chegar no local, ele foi recebido por centenas de apoiadores que cantaram: "Eu quero, de novo, o chinelão do povo". Até uma réplica de chinelo gigante foi entregue ao prefeito, trajado com o chapéu de palha. O cântico entoado pela militância é uma zombaria com opositores que adotaram o bordão pejorativo "Melo chinelão".
O prefeito acompanhou a votação em um hotel do bairro Bela Vista, onde estava hospedado no 13º andar. Ele recebeu apoiadores, familiares e aliados em uma sala de reuniões para acompanhar o escrutínio.
Às 17h53min, com apenas 3% de urnas apuradas, acessou o local e foi recepcionado com aplausos e gritos de incentivo. Por volta das 19h, Melo ampliava a votação a cada atualização da Justiça Eleitoral, se aproximando dos 50% que encerrariam a eleição no primeiro turno. A vibração era intensa quando as parciais revelavam crescimento.
Faltou muito pouco para liquidar o pleito neste domingo. Ele refutou qualquer possibilidade de frustração por não ter encerrado a eleição desde já. Disse que o momento é de felicidade, o que, de fato, transparecia em gestos, palavras e expressões.
O prefeito deixou o hotel às 19h30min, rumo ao comitê central de campanha. Melo afirmou que irá procurar o Novo, o PDT e o União Brasil para discutir apoio no segundo turno.
Embora tenha ressaltado que é necessário manter a mobilização para a etapa decisiva da disputa, Melo em um momento falou como reeleito. Se dirigindo a vice Betina Worm, afirmou:
— Faremos uma grande gestão juntos.
Os motivos da vitória parcial
Para dar o largo passo adiante na busca pela reeleição, Melo, 66 anos, suplantou os desgastes políticos causados pelo evento climático. No auge da crise, chegou a ser apontado como culpado.
Aliados admitem que houve ocasiões em que Melo foi recebido com ofensas em bairros atingidos. As possíveis falhas da prefeitura na crise foram exploradas ao máximo pelas adversárias, que acusaram o candidato à reeleição de ter sido negligente.
O resultado da urna mostra que o prefeito conseguiu se reconciliar com significativa parcela da população. Não colou no emedebista o carimbo de culpado, avaliam os estrategistas. Esse fator foi decisivo para o resultado colhido neste primeiro turno.
— Há uma realidade que se impõe: foi o maior evento climático da história do Rio Grande do Sul. Ficou claro para as pessoas que o sistema de proteção foi insuficiente. Restabelecemos a verdade sobre o que aconteceu. Foi um evento muito forte e o sistema de proteção teve falhas desde a sua construção — afirma André Coronel, coordenador-geral da campanha.
Melo diz que as candidaturas adversárias exploraram "a desgraça alheia para arrumar votos".
— O povo percebeu que não era esse o caminho — avaliou.
Além dos argumentos de chuva excessiva e de um modelo de proteção antigo, aliados destacam que Melo conseguiu partilhar a responsabilidade. Ele repetiu exaustivamente, durante a fase inicial da campanha, que os governos estadual e federal têm atribuições no sistema de contenção de cheia. A União no planejamento de defesa contra calamidades, como as inundações, e o Estado na dragagem do Guaíba.
Outro discurso de Melo que os aliados acreditam ter surtido efeito foi de que a chuva causou estragos históricos em centenas de municípios gaúchos, governados por prefeitos desde a esquerda até a direita. Não se tratou de uma exclusividade da Capital.
— Não houve culpa. Se olharmos para o nosso lado, vamos ver o quanto sofreram Canoas, Eldorado do Sul, São Leopoldo — diz o vereador Idenir Cecchim (MDB).
Também há crença de que pesou a experiência do prefeito, conhecedor dos bairros da cidade, desde os periféricos até os de classes sociais elevadas. Para o núcleo da campanha, a população identificou que o momento de reconstrução é difícil e requer experiência.
Aliados de Melo não comentam publicamente, mas avaliam que as principais candidaturas adversárias têm fragilidades. Maria do Rosário, oponente do segundo turno, carrega elevada rejeição, enquanto Juliana Brizola não transmitiria segurança de que está preparada para a tarefa de governar.
Emedebistas apontam pesquisas internas pré-enchente: os resultados mostravam que o governo era bem avaliado. A enchente diminuiu o prestígio, mas parte dele se manteve de pé.
— Ele fez um bom governo e colhe o resultado. Tem prestígio, humildade e relação próxima com a população — diz o experiente Cezar Schirmer, integrante da coordenação de campanha.
Coronel acrescenta:
— Melo não chega nessa campanha do nada, são três anos e meio de um projeto que teve entregas.
A larga aliança de Melo, com oito partidos, também ajuda a explicar o triunfo. Ele concentrou os votos desde a direita bolsonarista até o centro. Schirmer acredita que o prefeito pincelou alguns votos até na centro-esquerda.
A ampla coligação, com o PL de vice, foi resultado da articulação política de Melo. Depois das denúncias de corrupção na Secretaria Municipal da Educação (Smed) e da enchente, alguns aliados falaram publicamente em lançar candidatura própria.
Foi o caso do PL, que passava por uma disputa de poder interna. Ao assumir a direção municipal, o deputado federal Luciano Zucco fez movimentos para lançar chapa própria.
Nos bastidores, caciques emedebistas avaliam que o movimento de Zucco foi para marcar posição na disputa de poder dentro do PL com o vice-prefeito Ricardo Gomes, que deixou o partido, mas o fato é que Melo manteve reuniões frequentes e segurou o aliado. Na nova fase, com a liderança partidária de Ricardo substituída por Zucco, o PL indicou Betina Worm de vice.
Outra construção de Melo manteve como aliados o Republicanos e o PSD. Foram siglas cortejadas pelo PSDB, que tentou aliados para viabilizar a candidatura do ex-prefeito Nelson Marchezan Junior (PSDB), vista como ameaça à reeleição de Melo. Habilmente, o prefeito conseguiu segurar tanto Republicanos quanto PSD e a candidatura de Marchezan, planejada pelo governador Eduardo Leite, ficou pelo caminho.
Com isso, a eleição ganhou ares de quase plebiscito, com apenas três candidatos competitivos, o que aglutinou ainda mais os votos em Melo desde o primeiro turno.
A larga aliança colocou nas ruas um batalhão de candidatos a vereador apoiadores de Melo. Dos 518 postulantes à Câmara de Porto Alegre registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cerca de 290, mais da metade, eram de partidos aliados do prefeito.
Além disso, ele contou com apoiadores de PSDB e Cidadania. As duas siglas, apesar de apoiarem Juliana à prefeitura, tiveram candidatos a vereador trabalhando abertamente por Melo. Esses fatores criaram uma avalanche visual da campanha do prefeito nas ruas e nas redes sociais.
Não menos importante, o tempo de propaganda de rádio e TV, que continua tendo relevância para o eleitor, foi ocupado em maioria por Melo no primeiro turno. A campanha teve êxito ao mostrar realizações da gestão, combinando com o discurso de que não se faz tudo em quatro anos e que é possível "avançar mais". As peças foram avaliadas como contagiantes e alegres, principalmente os jingles. As produções valorizaram características de Melo que geram identificação com as pessoas, como a simplicidade, a presença nas periferias e o chapéu de palha.