Partido histórico do período pós-redemocratização do Brasil, o PSDB aprofundou o seu processo de declínio no cenário nacional nas eleições de 2024. A sigla continua a perder espaço como antagonista da esquerda, tanto para forças de direita quanto de centro.
Enquanto amplia a crise nacionalmente, o PSDB fez crescer o número de prefeituras e vereadores no Rio Grande do Sul. Ainda que tenha sofrido uma derrota indigesta em Pelotas, a sigla saiu numericamente maior no diretório gaúcho, resultado alicerçado na liderança do governador Eduardo Leite.
A dicotomia entre as realidades nacional e regional deverá produzir efeitos no futuro de Leite. Liderança do PSDB, ele é um jovem político reeleito em 2022 para governar o Rio Grande do Sul e tem planos nacionais, mas os voos rumo a Brasília dependem de estrutura partidária, de alianças e de vida eleitoral no meio da polarização entre o lulismo e o bolsonarismo.
Os números da queda
A quantidade de prefeituras conquistadas pelos tucanos no país foi reduzida de 523, em 2020, para 273 na disputa de 2024. Um tombo de 47,8%. Nas cidades com mais de 200 mil eleitores, considerando somente o primeiro turno, a sigla caiu de 17 vitórias na eleição anterior para apenas duas na atual. Os tucanos não vão governar nenhuma capital.
Um dos retratos do esfacelamento é São Paulo, maior cidade do Brasil: a legenda conquistou a prefeitura em 2016, com João Doria, e em 2020, com Bruno Covas. O primeiro deixou o partido após ver frustrado o desejo de concorrer à Presidência, em 2022, e o segundo faleceu prematuramente, vítima de câncer. Neste ano, o candidato do PSDB, Datena, ficou em quinto, com 1,84% dos votos válidos, e nenhum tucano foi eleito vereador na capital paulista.
A perda de espaço nacional começou a ficar evidente a partir de 2018, ano da ascensão do bolsonarismo. Até aquele momento, o PSDB era o grande rival do PT. O movimento da direita conservadora, capitaneado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, teve o PL como legenda em uma eleição municipal pela primeira vez em 2024.
— A partir de 2018, com o surgimento de uma força política de direita, o eleitor conservador que votava no PSDB passou a ter alternativa. O PL cresce nos grandes centros urbanos em cima de um voto que antes era do PSDB, partido que é o grande prejudicado com a ascensão do bolsonarismo — avalia o cientista político Carlos Borenstein.
Também ao centro o PSDB perdeu espaço para o PSD, sigla campeã de prefeitos eleitos em 2024: foram 882. No Estado de São Paulo, um grande contingente de lideranças municipais tucanas migrou para o PSD em períodos recentes.
Paula Mascarenhas, presidente do PSDB no Rio Grande do Sul e prefeita de Pelotas em segundo mandato, relembra que o partido “cresceu muito na polarização com o PT”. Essa disputa, em que os dois partidos duelaram pela hegemonia nacional, com o tucanato recebendo o voto da direita, se estendeu desde o início da década de 1990 até 2014.
Em avaliação particular, Paula diz que, no embate com o PT, o PSDB recebeu por anos figuras do antipetismo que não tinham relação com a origem social democrata da legenda.
— O partido perdeu parte do perfil e pagamos o preço disso. Temos avaliado, e existem duas perspectivas. Uma de reconstruir e reconectar o partido com sua história e outra de, talvez, não sobreviver a essa crise. Não temos a resposta final — diz Paula.
Na eleição geral de 2022, o PSDB já tinha experimentado declínio ao eleger apenas 13 deputados federais — em 2014, por exemplo, a legenda conquistou 54 assentos na Câmara.
Apesar das dificuldades, Paula destaca que o PSDB, ao eleger 273 prefeitos em 2024, superou o número de conquistas do PT, que ficou com 248. A diferença é que, no caso do PT, houve um aumento de 66 municípios conquistados em relação a 2020.
Crescimento no RS
Enquanto nacionalmente o cenário é de declínio, no Rio Grande do Sul, o PSDB, liderado pelo governador Eduardo Leite, obteve crescimento. A legenda venceu em 33 municípios, ante 27 da disputa anterior, aumento de 22,2%, mantendo cidades importantes como Gravataí e Viamão.
Candidatos do partido disputam o segundo turno em Caxias do Sul e Santa Maria. Já o número de vereadores eleitos do PSDB nos municípios gaúchos passou de 234 para 309, salto de 32%.
O crescimento precisa ser ponderado com os fracassos. A legenda sofreu derrota em Pelotas, berço político de Leite em que o PSDB governa há 12 anos. O candidato tucano nem sequer se classificou para o segundo turno.
Parte do revés é atribuído ao desgaste de mais de uma década de poder no município do sul do RS. Além disso, há a avaliação de que o PSDB ficou espremido na versão pelotense da polarização entre o PT e o PL, adversários no segundo turno.
Em Porto Alegre, a tentativa de lançar candidatura própria não vingou e restou ao partido um papel secundário na chapa de Juliana Brizola (PDT), igualmente fora do segundo turno.
— Foi negativo não ter candidatura em Porto Alegre e perder Pelotas é um impacto, mas o desempenho do PSDB no Rio Grande do Sul não foi ruim. Pelo contrário. Tivemos um crescimento razoável e positivo — diz Paula.
Para Borenstein, o PSDB conseguiu preservar a força no Rio Grande do Sul. A dúvida é quanto ao impacto disto nos planos de Leite para 2026, considerando o declínio nacional, a perda de estrutura e de quadros políticos e o pouco tempo de propaganda no rádio e na TV. As duas alternativas mais aventadas para o governador do RS são uma nova tentativa de se lançar à Presidência — o que fracassou em 2022 — ou a disputa por uma vaga no Senado.
— Em 2026, vamos renovar dois terços do Senado. Com o prestígio que tem no Estado, Leite seria um forte candidato. O movimento da candidatura presidencial precisaria de uma construção política difícil, num ambiente em que deverá ser mantida a polarização entre lulismo e bolsonarismo — diz Borenstein.
Próxima de Leite, Paula afirma que, no momento, o foco do governador está direcionado exclusivamente para a reconstrução do Estado no pós-enchente.
— Aonde as contingências políticas vão levá-lo, vamos saber com o tempo. Ele pode, inclusive, não concorrer a nada na eleição. Não é uma hipótese menor do que as outras — comenta a prefeita.
PSDB no Brasil
Levantamento da Folha de S.Paulo mostra que, nas cidades brasileiras com mais de 200 mil eleitores, o PSDB elegeu 17 prefeitos em 2020. Nesta eleição de 2024, foram apenas dois eleitos para os maiores municípios. O partido tem cinco candidatos no segundo turno, mas nenhum deles em capitais.
Cidades em que o PSDB disputa o segundo turno no RS:
- Caxias do Sul
- Santa Maria
Prefeituras conquistadas pelo PSDB em primeiro turno em 2024 no RS:
- Gravataí
- Viamão
- Bento Gonçalves
- Eldorado do Sul
- Cachoeira do Sul
- Camaquã
- Xangri-Lá
- Canela
- Encantado
- Carazinho
- Aceguá
- Cristal
- Estação
- São Sebastião do Caí
- Pantano Grande
- Estância Velha
- Cruzaltense
- São José do Ouro
- Coqueiros do Sul
- Caraá
- Almirante Tamandaré do Sul
- Butiá
- São José dos Ausentes
- Mampituba
- Quatro Irmãos
- Vista Alegre
- Tenente Portela
- Mata
- Lagoão
- Júlio de Castilhos
- São Jerônimo
- Rosário do Sul
- Vale Real