Dia 4 de outubro, restando dois dias para as eleições em Bagé, a Brigada Militar prendeu dois homens com 22 cestas básicas. A suspeita é de que os alimentos seriam usados para compra de votos por Nivaldo Moura, assessor da prefeitura, e Lucas Barcelos, chefe de gabinete da presidência da Câmara Municipal. Ambos foram autuados em flagrante por crime eleitoral, pagaram fiança e foram liberados. O município da Campanha teve uma contubarda corrida eleitoral, com denúncias e casos de polícia, a exemplo do que ocorreu em outra regiões do Rio Grande do Sul.
O chefe de uma facção criminosa que atua em Bagé, Tiago Rafael Ferreira, conhecido como "Mochilão", teria ordenado disparos em um comício do então candidato a prefeito, Luiz Fernando Mainardi (PT), em setembro, como revelado pelo programa Fantástico, da TV Globo, no último domingo (6). Mesmo preso, Mochilão teria ligações com uma candidata a vereadora nas eleições deste ano. Mainardi foi eleito prefeito.
O delegado Mauro Lima Silveira, da Polícia Federal, comentou que, com base na Operação Coactum, foi possível associar esses fatos à violência política. Na ocasião, uma candidata a vereadora, alvo da operação, mantinha uma relação estreita com um proeminente membro do crime organizado. Essa relação visava obter recursos financeiros para sua campanha, além de garantir segurança para seu comitê e captação de eleitores.
A reportagem apurou que a candidata mencionada pelo delegado, Manuela Souza (PL), chegou a ser presa por um outro crime: um suposto esquema de rachadinha na prefeitura de Bagé. Em uma postagem nas redes sociais, de dentro da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas, Mochilão declarou apoio à Manuela. Após a descoberta, ele teve o telefone apreendido e foi transferido para o Complexo Prisional de Canoas, onde há bloqueadores de celular.
O delegado Guilherme Fagundes Nunes, titular do Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado (Draco) de Bagé, afirmou que as investigações apontam para um grupo criminoso articulado, responsável por graves ações na cidade.
Campanhas se tornaram caso de polícia em outras cidades do RS
Ainda na semana passada, operação da Polícia Federal investigou suspeitas de compra de votos por candidatos a vereador, financiados pelo crime organizado. Em São Borja foram cumpridos 16 mandados de busca.
Em Vacaria, nos Campos de Cima da Serra, o Ministério Público pediu a abertura de um inquérito para investigar um vídeo no qual a então candidata à prefeitura, Clarice Brustolin (PSDB), aparece supostamente entregando dinheiro a uma eleitora. No relatório, a promotoria cita uma conversa gravada entre a denunciante e um assessor da campanha de Clarice, que descreve a suposta troca de votos por cestas básicas. Clarice ficou em segundo lugar e não foi eleita.
Ainda há tentativas de compra de desistências de candidaturas de mulheres em duas cidades. Em Gramado Xavier, uma candidata a vereadora teria recebido R$ 5 mil para desistir. Em Itati, a suposta oferta foi maior, R$ 30 mil. O objetivo seria forçar as chapas a cancelarem candidaturas masculinas, devido à cota de gênero obrigatória nas eleições.
Nas eleições, houve também uma tentativa de forjar escândalos de corrupção com o uso de inteligência artificial. Em Campo Bom, Faisal Karan, candidato derrotado pelo Republicanos, é investigado por supostamente encomendar um vídeo falso no qual o prefeito eleito, Giovani Feltes (MDB), apareceria recebendo propina 20 anos atrás, quando foi prefeito. O vídeo seria criado a partir de uma foto antiga de Feltes.
No vídeo, Faisal teria orientado até a roupa que Feltes deveria vestir e discute detalhes sobre recriar móveis da época e valores de suposta propina. A montagem custaria R$ 10 mil, mas, em vez de produzir o vídeo, o designer contratado decidiu denunciar o candidato ao Ministério Público. Se comprovadas, essas suspeitas podem resultar em cassação da candidatura, mesmo após a derrota.
Contrapontos
Faisal Karam disse que o homem que gravou o vídeo é um laranja e a denúncia contra ele não se sustenta, "porque o vídeo que seria feito pela inteligência artificial jamais existiu".
Os advogado dos candidatos a prefeito Jussara Bobsin e a vice Gilvan Neubert, de Itati, disse que tais atos jamais partiram dos candidatos majoritários e que as acusações são frutos de uma armação da oposição.
Assessoria jurídica de Clarice Brustolin disse que ela foi vítima de um flagrante armado, em que "uma pessoa contratada estava vinculada à campanha do candidato adversário e montou uma câmera escondida". Segundo a candidata, ela adiantou o dinheiro refrente a um cotnrato.
A defesa de Manuela Souza rechaça veemente relação com detentos.
Tiago Rafael Ferreira mudou de advogado e o novo representante não foi localizado.
A prefeitura de Bagé afirma que as prisões não tem qualquer relação com o governo municipal.
A reportagem não conseguiu contato com Lucas Barcelos.
Defesa de Nivaldo Moura disse que as cestas básicas pertenciam a uma ONG e que a compra foi comprovada por meio de notas fiscais.