A polêmica em torno da suposta encomenda de uso de inteligência artificial para produção de imagens falsas na eleição de Campo Bom elevou a temperatura na campanha eleitoral no município do Vale do Sinos. Após a divulgação de que a campanha de Giovani Feltes (MDB) ingressou com ação judicial pedindo a cassação do registro de Faisal Karam (Republicanos), os dois candidatos trocaram acusações via redes sociais.
Feltes publicou um vídeo ainda na noite de terça-feira (17), logo após o juiz Alvaro Walmrath Bischoff, da 105ª Zona Eleitoral, acolher a ação na qual o emedebista acusa Faisal de contratar um designer gráfico para manipular imagens em que o adversário apareceria recebendo propina. No pronunciamento divulgado terça à noite, Feltes faz um resumo do episódio e acusa o rival de tentar prejudicá-lo.
— Eu já sabia que o verdadeiro Faisal é bem diferente desse candidato dócil que ele vende ao público. E mesmo sabendo que Faisal é perverso, ainda assim o que ele fez agora passou de todos os limites — reclama o emedebista.
Faisal reagiu na manhã desta quarta-feira. Também com um vídeo nas redes sociais, disse que foi vítima de uma armação planejada pelo adversário. Na gravação, ele relata que foi o designer quem o procurou e alega que o vídeo apresentado à Justiça Eleitoral foi editado.
— Fui ouvi-lo como escuto tantas pessoas de forma diária. Me propôs a venda de um serviço que se chama inteligência artificial. Questionei este por várias vezes como funciona, como é feito e o resultado disso. Em momento algum contratei o serviço, em momento algum pedi para ele fazer qualquer coisa contra meus adversários — responde Faisal.
Na representação judicial, os advogados de Feltes anexaram vídeos que supostamente mostram Faisal discutindo a produção da montagem. O juiz acolheu a ação de investigação judicial eleitoral e deu prazo de cinco dias para Faisal apresentar defesa.
O magistrado também requisitou imagens de câmeras de segurança e de quatro estabelecimentos comerciais nos quais a fraude teria sido combinada. Em paralelo, o Ministério Público Eleitoral de Campo Bom instaurou, sob sigilo, procedimento para averiguar os fatos.
Coordenador jurídico da campanha de Faisal, o advogado Vanir de Mattos afirma que o cliente foi alvo de uma armação dos adversários. Mattos admite que os encontros com o designer ocorreram, mas suspeita de manipulação dos vídeos apresentado a Justiça.
— Esse rapaz (o designer) foi CC da prefeitura. Ele foi vender para o Faisal um aplicativo de produção e vídeo e nunca disse que era ilícito. Estou apurando ainda a veracidade desse vídeo. Teve a conversa, mas a degravação não é exatamente o que está posto — diz Vanir.
A utilização de conteúdo gerado ou manipulado digitalmente para criar, substituir ou alterar a imagem ou voz de uma pessoa é conhecida como deepfake. A técnica é expressamente proibida por resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a punição prevista é a cassação do registro da candidatura por abuso do poder político e uso indevido dos meios de comunicação social.
Para a advogada de Feltes, Francieli Campos, o vídeo publicado por Faisal nesta quarta-feira ajuda a embasar sua acusação. Ela diz esperar que a Justiça Eleitoral casse o registro do candidato.
— Faisal confirma o encontro. Se uma pessoa te oferece um celular roubado, tu recebe ele na tua casa para saber como funciona? Nossa expectativa é de cassação em função do dano que manipulações como essas causam à eleição — afirma a advogada.
Em gesto de apoio a Feltes, o diretório estadual do MDB divulgou nota afirmando que "a conduta praticada por Faisal, além de infringir a legislação, também fere a democracia".
Da parceria no passado à virulência no presente
Ambos ex-prefeitos, Faisal e Feltes já foram aliados políticos. Nos anos 2000, eles pertenciam ao MDB e atuaram juntos na gestão do município. Feltes foi prefeito de 2001 a 2008, período em que teve Faisal como secretário de Planejamento.
Ao concluir o segundo mandato, Feltes apostou no aliado como sucessor. Faisal governou de 2009 a 2016, quando houve o rompimento. Faisal deixou o MDB e, filiado ao PSDB, indicou Francisco dos Santos, o Chiquinho, como candidato à sucessão. Feltes discordou da escolha e decidiu apoiar Luciano Orsi (PDT), que venceu a eleição e se reelegeu em 2020.
A atual campanha, porém, escalou em virulência. Há ataques recíprocos acusando os adversários de disseminação de fake news e nos últimos dias um ato de campanha de Feltes foi interrompido por disparos de armas plásticas municiadas por bolinhas de gel.