Homens encapuzados e trajando roupas pretas tomaram uma plantação de pinus na Fazenda Marcelina, localizada na Granja Vargas, em Palmares do Sul, no Litoral do Rio Grande do Sul, antes do amanhecer desta segunda-feira (31). O proprietário da terra, Aloisio Schmaedecke Perdomini, afirma que ocorreu uma invasão por cerca de 30 homens, dos quais 20 estariam armados e outros 10 passaram a cortar as árvores que estavam em processo de resinagem. A Brigada Militar esteve no local e nega ter encontrado armas, mas confirma a atuação de pessoas como seguranças privados, inclusive policiais militares. A BM de Osório classificou o episódio como um “desacerto comercial”.
Quando funcionários da empresa que trabalham diariamente no local chegaram para a jornada, encontraram o outro grupo já instalado e com os seguranças posicionados, ficando impedidos de ingressar. Perdomini foi avisado da situação e a BM foi acionada. Também foi registrado boletim de ocorrência na Polícia Civil e, como os homens seguem no local, Perdomini ingressou com mandado de segurança na comarca de Palmares do Sul requerendo a desocupação.
Palmares do Sul é uma cidade de cerca de 11 mil habitantes, e o assunto passou a ser comentário na região. Pessoas que conhecem Perdomini e a Granja Vargas sugeriram que a ação dos homens de preto era uma suposta retaliação pelo fato de o proprietário ser conhecido no município como simpático ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), vencedor da disputa presidencial no último domingo (30).
Em áudio que passou a circular entre moradores, um homem diz o seguinte: "E aí, Bruno. Bom dia. Olha aí, a Granja Vargas, a situação que chegou hoje. Já começaram, cara, a invadir terra aqui”.
Depois, outro homem não identificado, também em áudio, cita diretamente Perdomini: “Ô, João, mas o Aloisio, pelo o que me consta, ele é PT. Né? Tá bom. Se ele é PT, diz pra ele fazer o ‘L’ pro pessoal”.
Um terceiro áudio relata a suposta presença de armas entre os seguranças encapuzados: “Ô, Leandro. Pior que é verdade mesmo. Os caras entraram no mato que o Juarez tá resinando, né? Entraram ali, começaram a derrubar as árvores com saquinho e tudo ali. Tem mais de 20 caras armados ali. Uns caras mal encarados que não dá. Complicado o troço ali”.
O Juarez citado é o responsável pela empresa que arrendou a terra de Perdomini para trabalhar na plantação de pinus. A referência a “saquinho” é uma menção ao material em que a resina fica estocada após ser extraída da árvore.
Perdomini diz que a terra é de posse da sua família desde que nasceu, 47 anos atrás. Ele afirma ter a matrícula da área e contrato de arrendamento desde 2007. Nega que haja disputa judicial. Ele narra que os homens chegaram ainda de madrugada. Câmeras de segurança fizeram o registro, o que foi checado posteriormente. Ele considera estar abandonado pelo poder público.
— O que vou fazer? Vou ter de contratar jagunço? É assim que se defende agora no Rio Grande do Sul? Se não estiver armado, vão passar por cima de ti? Tem a questão do prejuízo, o patrimônio está sendo extraído de forma absurda, mas o que me doeu mais foi o movimento da comunidade. Me sinto completamente desamparado. Essa reação houve porque sou um cara diferente aqui — desabafou Perdomini.
No boletim de ocorrência registrado pela BM de Cidreira, que deslocou uma guarnição para atender a ocorrência, está registrado que três sargentos estavam entre a equipe de segurança. A BM informou que dois deles são da reserva e um é reformado.
A reportagem conversou com o major Luiz Cesar Lima dos Santos, comandante do 8º Batalhão de Polícia Militar, de Osório, responsável pelo atendimento também em Palmares do Sul. Ele disse que não foram localizadas armas e que teriam sido apresentados documentos de posse da terra pelos supostos invasores.
— Foi apresentado lá, aos policiais presentes, diversos documentos que demonstram arrendamento da terra e procuração para extração de resina. Fizemos um documento operacional de atendimento e não encontramos ninguém armado. Havia, sim, uma segurança. Na verdade, o que se tem ali é um desacordo comercial. Tem uma rotina naquela região de arrendamento de terras. Como a gente não conseguiu fazer uma pesquisa documental mais aprofundada, foram coletados os nomes e orientamos eles (o reclamante) a entrar com ação cível para ver quem é, de fato, o proprietário. Foi constatado um desacordo comercial — diz o major.
O comandante ainda informou que foi aberto um boletim de ocorrência policial militar para apurar a função que os três sargentos exerciam no local, junto ao grupo de seguranças que trajavam preto.
Na versão de Perdomini, as armas não foram encontradas porque, ao perceber a aproximação da guarnição da BM, os seguranças teriam escondido o suposto arsenal no mato. Ele demonstra incômodo com o fato de ter de “provar” que é o dono da terra enquanto os possíveis invasores estão atuando livremente no corte das árvores.
— Que questão de posse é essa? Estamos trabalhando na área e um dia aparece gente de touca ninja e armado. E não nos deixa entrar. Tenho todos os documentos da área e juntei no mandado de segurança. É apavorante entrarem na tua terra e tu ter de correr atrás para provar tudo — lamentou.