As paralisações de caminhoneiros que impedem o livre trânsito de veículos nas estradas são a maior preocupação da segurança pública em todo o país, neste primeiro dia pós-eleições presidenciais. Polícias federais e estaduais, bem como as Forças Armadas, trocam informações de forma permanente sobre os bloqueios nas rodovias. A ideia é tentar impedir que eles causem desabastecimento das cidades, principalmente de alimentos ou de combustível.
Desde a noite de domingo (30), trechos das estradas passaram a ser bloqueados, na maior parte dos casos por grupos de caminhoneiros apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) que protestam contra o resultado da eleição (que consagrou Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, como novo presidente). GZH falou com integrantes de várias forças de segurança. A Polícia Rodoviária Federal (PRF), por exemplo, contabiliza ao menos 111 pontos de bloqueios em rodovias federais, em 17 Estados.
Mas o número total de bloqueios é maior que isso, porque existem também paralisações de caminhoneiros em estradas estaduais. A estimativa é que mais de 150 pontos de tráfego estejam paralisados ou com extrema lentidão (trânsito em uma só pista ou só para automóveis, com barreiras para impedir que caminhões transitem).
A PF, em apoio à PRF, investiga as lideranças do movimento e tenta ver o nível de articulação demonstrado por eles.
— São muitos pontos tomados ao mesmo tempo, para ser espontâneo. Existe uma organização, mas com lideranças regionais — pondera um delegado federal.
Um dos casos investigados é de um dono de transportadora em Santa Catarina, que fala em vídeo em convocar mais de 300 bloqueios no país, para livrar o Brasil "da ameaça comunista" pós-vitória de Lula. A preocupação dos policiais é checar se isso caracteriza locaute (greve patronal).
A PRF identificou bloqueios em Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Pará, Goiás, São Paulo, Espírito Santo, Amazonas, Roraima, Rio Grande do Norte, Alagoas e Acre. O Sul do país é o que mais registra adesão ao movimento de caminhoneiros que protestam contra a eleição de Lula. O Estado com mais trechos de rodovias federais bloqueados é Santa Catarina. A PRF monitora 36 pontos de bloqueio em 20 estradas em território catarinense, fora as estaduais (há estimativa de outros 20). No Rio Grande do Sul são cerca de 30 pontos de bloqueio em rodovias federais e 20 nas estaduais.
A PRF informa que já acionou a Advocacia-Geral da União (AGU) para garantir, via liminar, a livre circulação nos trechos.
"A PRF encontra-se em todos os locais identificados com efetivo mobilizado nos pontos de bloqueio e permanece trabalhando pelo fluxo livre nas rodovias federais, viabilizando-se o escoamento da produção, assim como o direito de ir e vir dos cidadãos, além de seguir monitorando os locais com alta probabilidade de interdição", diz nota oficial da corporação.
As Forças Armadas também monitoram a situação. Recebem relatórios, vídeos, filmagens feitas pelas polícias de todo o país. Caso as forças policiais não consigam remover os bloqueios, o Exército poderia atuar em missão de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), prevista constitucionalmente para casos de distúrbios em áreas estratégicas. Para isso, um governador teria de pedir e o presidente da República aceitar que os militares façam isso.
A reportagem ouviu dois generais, um deles que ocupa cargo de destaque no governo federal. Eles acreditam que a situação será controlada pela PRF, sem necessidade de intervenção das Forças Armadas. E que o movimento deve diminuir ao longo dos próximos dias.
— A ideia é não criminalizar, mas também liberar o trânsito. Um equilíbrio difícil, mas possível — resume a autoridade.
Nas estradas estaduais gaúchas os bloqueios são acompanhados pelo Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM). A identificação de lideranças é monitorada por agentes não-uniformizados da corporação. O subcomandante-geral da BM, coronel Douglas da Rosa Soares, informa que nem um ponto das rodovias estaduais está bloqueado totalmente, graças a negociações dos PMs com os manifestantes. Ele diz que os policiais rodoviários começaram a usar o Protocolo de Desobstrução de Vias às 23 horas de domingo (30), quando começaram casos de bloqueio em todo o Rio Grande do Sul. Até agora não foram registrados episódios de violência.
— Tentamos não transformar esta situação num caso criminal e, sim, num protesto. Explicamos isso aos manifestantes e temos sido relativamente bem-sucedidos. Conseguimos negociar a passagem de ambulâncias, de caminhões com cargas perecíveis, de ônibus com passageiros, de veículos leves. Os caminhoneiros também têm atendido nosso pedido para que parte das pistas seja liberada ou, quando muito, que o protesto dure apenas alguns minutos. Quando há muitos veículos parados, pedimos e eles desbloqueiam — resume Douglas.