Atual vice-presidente do Brasil, o general da reserva do Exército Hamilton Mourão (Republicanos), 69 anos, quer trocar o governo pelo Congresso ao disputar vaga ao Senado pelo RS. Nascido em Porto Alegre e egresso do Colégio Militar da Capital, chegou ao posto de comandante militar do Sul antes de deixar a ativa, em fevereiro de 2018, quando assumiu a presidência do Clube Militar no Rio. No mesmo ano, se engajou na chapa de Jair Bolsonaro. Na campanha ao Senado, Mourão diz que pretende auxiliar o Executivo a recuperar o controle do orçamento.
Série de entrevistas
De 12 a 20 de setembro, GZH publica entrevistas com candidatos ao Senado no RS que concorrem por siglas com ao menos cinco representantes no Congresso. A ordem de publicação é alfabética, conforme o nome que estará na urna.
Nos últimos anos, percebe-se aproximação crescente entre os militares e a política no Brasil. O senhor não vê nisso algum risco para as próprias Forças Armadas ou para a democracia?
Vejo essa aproximação de forma normal. Ao longo da história do Brasil, tivemos inúmeros militares que participaram de processos políticos, sejam eleitos deputados, senadores, sejam eleitos presidentes. Não vou me referir ao período de presidentes militares, mas tem o próprio Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Hermes da Fonseca, Eurico Dutra, né? Então, não é novidade. Pode ter sido novidade, vamos colocar assim, se você olhar os últimos 40 anos. Agora, o que não pode acontecer é a política contaminar os quartéis. Ou seja, o pessoal da ativa ser contaminado pela política. Isso já repeti várias vezes: se a política entra pela porta da frente de um quartel, a disciplina e a hierarquia saem pela porta dos fundos. E vejo que os comandos tanto da Marinha, do Exército ou da Força Aérea têm sido muito enfáticos em manter essa distância.
A reforma tributária vem se arrastando há anos. O senhor a considera necessária?
É absolutamente necessária porque o nosso sistema tributário é complicado, caótico. As pessoas têm dificuldade de entender como pagar impostos que estão devendo, e é caro. Custa hoje R$ 80 bilhões para empresas, pessoas, para o governo manter esse sistema em pé. E tem evasão, sonegação de R$ 400 bilhões por ano, ou seja, é sistema falho porque tem cesta de impostos enorme e alíquotas elevadas. Temos de reorganizar o sistema em duas etapas. Numa primeira, enxugar a quantidade de imposto. Dois grandes projetos que estão tanto no Senado quanto na Câmara passam por um imposto de valor agregado. Nós mandamos projeto, do IBS, Imposto sobre Bens e Serviços, cobrado no destino, que é outra discussão que tem sobre onde cobrar e como. Óbvio que tem de ter momento de transição, redistribuição daquilo que é destinado para União, Estados e municípios. O projeto do Bernard Appy (economista), por exemplo, prevê 10 anos para fazer uma transição organizada. E, após reorganizar o sistema, diminuir a alíquota de modo que a gente chegue a uma carga de impostos compatível com o país de renda média que é o nosso. Hoje, a nossa carga equivale a 33% do PIB e tem de cair para 25% ou 26%.
Ponto importante para o RS é o acordo do regime de recuperação fiscal. O senhor entende que foi adequado ou, como senador, ajudaria a buscar algum ajuste?
A primeira coisa que as pessoas comentam é o momento em que foi feito, em final de governo. E as pessoas, inclusive o meu candidato a governador, que é o Onyx, ele considera que isso deveria ser discutido a posteriori. Existem reclamações a respeito do que é efetivamente a dívida, que deveria ser renegociada. Então, teria de, talvez, ter uma auditoria independente em relação a isso. (...) Acho que pode ser submetido a uma reavaliação.
Nos últimos anos, vimos o fortalecimento do orçamento secreto e do pagamento de emendas Pix, que dificultam o acompanhamento do destino final do dinheiro. Como o senhor se posiciona sobre esses temas? Usaria recurso de emenda Pix?
Eu sou frontalmente contrário a essa questão do orçamento dito secreto, que na realidade é a emenda RP9, de relator. Parte dela é essa que tu citaste, em que o cara manda pra onde ele quiser sem ter projeto, sem estar vinculado a nada. Isso é um absurdo.
Esses instrumentos acabaram implementados sob governo do qual o senhor faz parte...
O governo que assumir a partir de 1º de janeiro terá de encarar isso. Então, mesmo o nosso governo, o presidente Bolsonaro sendo reeleito, conforme eu julgo que será, ele terá de tomar uma posição em relação a isso porque perdemos o controle sobre a execução orçamentária. Isso está errado. E ele vai contar com a minha posição favorável para a gente recuperar para o Executivo o controle da execução orçamentária.
A educação vem perdendo recursos. Em relação à contribuição do Congresso para destinar verbas públicas, deve ser priorizada?
A questão de recursos da educação é muito mais de gestão do que de quantidade. Se você for analisar, em termos de PIB, não gastamos tão pouco assim na educação quando comparados com outros países. E estamos vivendo um momento de inversão da curva demográfica. Em 2005, em torno de 30 milhões de crianças e adolescentes ingressaram na rede pública. Em 2020, foram 22 milhões. Ou seja, estamos com menos gente ingressando na escola porque menos gente está nascendo. E continuamos com aquela mesma massa de recurso. Então, está na hora de você melhorar a execução desse recurso no município, no Estado e no governo federal. No Ensino Superior, as nossas universidades públicas têm de ser capazes de se autogerir, porque elas dependem em tudo do mecanismo estatal. Então, a universidade, se faz convênios para fazer projetos, esse recurso é colocado no Tesouro, não volta para a universidade, acho que essa é outra discussão.
Com custo de mensalidade?
Com cobrança de mensalidade de quem puder pagar. Vejo dessa forma. Meus filhos estudaram em universidade pública, e eu tinha condições de pagar. Óbvio que não vai se pagar a mesma coisa que você cobra numa universidade privada. Porque parcela dos custos não está inserida. Na universidade privada, o custo do professor está inserido. Estive agora na Espanha, há pouco tempo, na universidade de Salamanca. É pública, com mensalidade baixa, acho que US$ 1,5 mil por ano (cerca de R$ 7,8 mil no câmbio de 13/9).
O governo federal propôs a redução de alíquotas de ICMS, o que levou a queixas de perda de arrecadação por parte dos Estados. Como o senhor se posicionaria como senador?
Esse assunto foi discutido dentro do Congresso, com a presença de todas as bancadas e foi aprovado por ampla maioria. Foi uma PEC, não é? Então foi aprovado por uma maioria específica. Vejo também que o Estado que se sinta prejudicado tem de provar que está prejudicado, não só gritar que está prejudicado. Vamos lembrar que, por ocasião da pandemia, o governo distribuiu US$ 60 bilhões para Estados e municípios sob o argumento da queda da arrecadação, e a arrecadação não caiu nesse nível. Então, a turma ficou com o dinheiro em caixa.