Quando se dispôs a disputar a prefeitura de Porto Alegre no distante ano de 2016, o então deputado federal Nelson Marchezan (PSDB), dono de discursos combativos contra privilégios no plenário da Câmara, não fazia ideia do tamanho do desafio que se colocaria diante dele enquanto gestor da capital do Rio Grande do Sul. E não se tratava somente de solucionar o rombo financeiro nas contas públicas ou desatar as amarras burocráticas no Executivo municipal. Mais estava por vir. Àquela altura do campeonato, quem poderia sugerir uma hecatombe mundial, diante da chegada de um novo coronavírus, a ponto de suspender aulas, eventos e até mesmo a realização dos Jogos Olímpicos? Nem em sonho.
O primeiro caso de coronavírus em Porto Alegre foi registrado em março de 2020. Coube, então, a Marchezan a tarefa de liderar, às pressas, a organização de um plano de emergência com adoção de medidas restritivas — e nada simpáticas para alguns — para reduzir a circulação de pessoas. Houve discussão por todos os lados. Foi ele também quem coordenou a estratégia, junto aos secretários municipais, para a construção de leitos que atenderiam à crescente demanda por atendimento gerada a partir da covid-19. É pouco? A Câmara de Vereadores decidiu, no voto, instaurar um processo de impeachment contra o prefeito, além de uma CPI já em andamento no Legislativo.
E como se não bastasse a gestão da cidade, a pandemia e o impeachment, o prefeito ainda chega em casa após o expediente ciente da importância de abraçar a esposa, os filhos ou mesmo trocar as fraldas do pequeno Benício, de apenas um ano e seis meses.
— Acaba que a campanha fica por último. Porque administrar a cidade já é um grande desafio, temos um milhão e meio de habitantes. E estamos numa pandemia. Só depois de tudo isso é que vou pensar nessa burocracia de impeachment, CPI, que mais me incomodam por atacar valores e princípios meus, como a ética. Se não fosse por isso, eu nem daria bola para essa coisa fake. O resultado é que acabo dormindo pouco, porque quando chego, vou tomar um banho e eles estão me esperando, pra gente conversar, ver um filme — desabafou.
Família
Marchezan é pai de três meninos. O mais velho, Nelson Marchezan Neto, brincava no pátio enquanto a entrevista era concedida a GZH. Bernardo, que teve a paternidade reconhecida em 2017 e mora em Brasília com a mãe, estava sentado no colo do pai, tentando acompanhar a conversa, quando começou a se entregar para o sono. O caçula, Benício, por sua vez, não se intimidou com as câmeras. Sentiu-se tão à vontade que precisou de troca de fralda durante o papo (assista acima), tarefa que o pai fez questão de executar, demonstrando carinho e intimidade com o filho mais novo.
GZH quis saber, então, do que mais o prefeito sente falta desde que foi eleito, em sua convivência com a família:
— Gostava muito de sair com o Neto pelos parques e praças, pegar a bicicleta e circular pela cidade, parar numa lanchonete, tomar um suco. Eu não faço mais isso. Infelizmente, hoje ficou muito mais difícil. A política se tornou uma coisa muito agressiva, com fake news que deixam as pessoas com raiva de algo que nem existe. Mas continuamos indo na pracinha e também continuo indo ao supermercado, que é uma coisa que eu gosto.
A esposa, Tainá, confirma a informação:
— Eu detesto (ir ao mercado), tenho pavor. É ele quem vai. E fica horas. Pesquisa preço, sempre quer economizar. Olha preço por preço, vê se tem promoção. Ele adora — conta, aos risos.
Na rotina doméstica, é ele quem domina a maioria das atividades. O prefeito gosta de cozinhar e conquistou a esposa também pelos dotes culinários. A tarefa de lavar roupas também era dele, quando morava sozinho e no início do relacionamento. Depois, com o volume de tarefas adquirido enquanto prefeito, não conseguiu mais dar conta de todas as rotinas da casa. Hoje, conta com a ajuda da esposa, que, segundo brincou, "não sabia nem ligar a máquina" no início do namoro. A mãe de Tainá, que adora a companhia do neto, também é presença constante no apartamento do casal, e auxilia em alguma ou outra atividade.
Formação
Marchezan é formado em Direito pela Unisinos. Quando pequeno, ajudava o pai (deputado e com reconhecia trajetória nacional, falecido em 2002) na lavoura de arroz da família. Chegou a cursar Educação Física na UFRGS e Publicidade e Propaganda na PUCRS, mas concluiu somente a formação na área jurídica. Parou de exercer a atividade profissional para se dedicar à carreira política (foi deputado federal e estadual). Hoje, diz que advoga pelo interesse dos cidadãos, a partir do cargo para o qual foi eleito.
Conhecido pela personalidade forte e pela intensidade na aplicação de seus projetos, ele admite que gostaria de mudar um traço da sua personalidade:
A política se tornou uma coisa muito agressiva, com fake news que deixam as pessoas com raiva de algo que nem existe.
NELSON MARCHEZAN
— Sou muito ansioso, quero que as coisas aconteçam muito rápido. E no serviço público não é assim. A máquina pública funciona diferente. Num hospital público, quando o trinco quebra, tem que fazer uma licitação para arrumar o trinco. É muito burocrático — explicou.
Ainda sobre sua personalidade, confessa um "mínimo de vaidade" e desconversa sobre a idade, em tom de brincadeira, para logo depois informar seus 48 anos.
— Tô ficando careca. Eu não queria —diverte-se.
Mas a vaidade não se impõe. Ele não dá bola para roupas e chega a ter peças de 10, 15 anos. Usa sempre as mesmas. A ponto de ter recebido como presente um recado "indireto" da equipe: um terno, para ver se finalmente deixava se usar o mesmo traje em todas as solenidades da prefeitura. Na playlist de Marchezan, dois destaques: a banda britânica Coldplay, sucesso mundial, e uma canção também bastante conhecida, que diz muito sobre a paixão pelo filho mais novo:
— Alecrim, por causa do Benício — sorri.
E é com o sorriso de quem segue encantado pelo caçula que ele tenta, neste ano, ser reeleito prefeito da Capital. Mas admite-se tranquilo, com a certeza de que os valores que lhe são caros, como ética e honestidade, seguirão com ele independentemente do resultado da disputa.