A disputa por cadeiras na Câmara dos Deputados e na Assembleia Legislativa está sujeita a duas regras novas nestas eleições: a linha de corte para candidatos que não tenham boa votação individual e a distribuição de "sobras" de votos entre todos os concorrentes, inclusive representantes de legendas de menor expressão.
A norma que mais ganhou notoriedade na ocasião de sua aprovação, em 2015, é a Lei 13.165, apelidada de "Lei Tiririca", que já valeu para as eleições municipais do ano seguinte. Ela determina uma votação mínima para evitar que candidatos com fraco desempenho nas urnas sejam beneficiados pelos "puxadores de votos". Um deputado só entrará a reboque de algum colega caso atinja ao menos 10% do quociente eleitoral.
O que mudou na lei nesta eleição para deputados estaduais e federais:
- Candidatos precisam de uma votação mínima para se eleger. Essa votação mínima é 10% do quociente eleitoral. Antes, não existia votação mínima.
- As sobras do quociente partidário serão distribuídas a partidos e coligações com maior média de votos por candidato. Antes, as sobras só eram redistribuídas entre partidos ou coligações com quociente eleitoral mínimo.
- Se o eleitorado do RS registrar 5.580.000 de votos válidos para deputados federais em 2018, o quociente eleitoral será definido pela divisão desses votos pelo número de cadeiras da bancada gaúcha na Câmara (31). 5.580.000/31 = 180 mil
- Se o partido ou a coligação, somados os votos na legenda e nos candidatos, conquistar 1 milhão de votos no Estado, o número de vagas a que terá direito na Câmara será calculado pelo quociente partidário. 1.000.000/180.000 = 5,55
- Com o arredondamento para baixo, o partido ou coligação preencherá cinco cadeiras na Câmara, mas só assumirão as vagas os candidatos que obtiverem pelo menos 18 mil votos, o equivalente a 10% do quociente eleitoral para eleger um deputado federal no RS nesse exemplo.
- Os "0,5" restantes irão se tornar sobras e serão redistribuídos aos partidos ou coligações que tiverem maior média de votos por candidato.
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Se a lei valesse nas eleições de 2014, teria barrado João Reinelli (PV), que ingressou na Assembleia Legislativa com apenas 9.098 votos, abaixo da linha de corte de 11 mil votos naquela eleição. Na Câmara, nenhum gaúcho teria sido barrado.
— O efeito desta lei é que os partidos têm deixado de pedir votos na legenda e evitado concentrar toda a verba de campanha em apenas um nome — avalia Alexandre Basílio Coura, analista da Secretaria Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral no Estado (TRE-RS).
Essa mudança de estratégia deve limitar a eficácia da Lei Tiririca no Rio Grande do Sul. Líderes partidários avaliam que não há entre os nomes gaúchos alguém capaz de arrebanhar votos suficientes para erguer colegas de baixo eleitorado, ao contrário do que costumeiramente ocorre em São Paulo, por exemplo.
Os partidos com maior representação na bancada gaúcha na Câmara (PT, MDB e PP) projetam que seus candidatos bem votados irão superar a cláusula de barreira com certo conforto.
— O eleitor está mais distante da política e deverá optar por nomes mais próximos a ele, que conheça e confia. Isso pode levar a votações individuais mais expressivas do que nas legendas — avalia o deputado federal Alceu Moreira, presidente estadual do MDB.
Redistribuição será mais abrangente
A regra mais determinante para a formação das novas bancadas deverá ser a que alterou a redistribuição das sobras. Uma lei de 2017 deixou de obrigar que um partido ou uma coligação atinja o quociente eleitoral mínimo para disputar votos redistribuídos. Agora, todos as siglas poderão ser beneficiadas, mesmo as que não rompam a barreira partidária.
Se um candidato de uma legenda pequena fizer mais votos do que concorrentes de grandes coligações, terá grande chance de ficar com uma vaga na redistribuição, mesmo que seu partido não tenha alcançado o quociente.
— Isso deverá favorecer os candidatos de partidos sem coligações, o que é positivo para o processo democrático — avalia o deputado federal Pepe Vargas, presidente do PT no Estado.
Se a regra valesse em 2010, por exemplo, beneficiaria a então deputada federal Luciana Genro, que era candidata à reeleição pelo PSOL. Embora tenha recebido 129,5 mil votos (oitavo maior desempenho entre os candidatos gaúchos naquele ano), ela não se elegeu em razão de o partido não ter atingido o quociente. Com as regras atuais, Luciana ficaria com uma das vagas na redistribuição.
— A regra anterior deixava alguns candidatos com sensação de injustiça, pois perdiam a vaga para concorrentes com menos votos — afirma Celso Bernardi, presidente do PP no Estado.
Mudança para 2020
Outra mudança profunda, também promulgada pelo Congresso no ano passado, valerá apenas para as eleições municipais de 2020: o fim das coligações para as eleições de deputados e vereadores. Hoje, a prática é adotada por muitos partidos pequenos, que tentam pegar carona em candidatos populares de outras siglas. Em troca, cedem tempo de propaganda.
— Seria importante que o fim das coligações já estivesse valendo agora, pois limitaria a quantidade de partidos e viabilizaria a governabilidade do próximo presidente ou governador. Mas, infelizmente, entrará em vigor em descompasso com as demais mudanças, que devem ampliar a quantidade de legendas no Congresso e nas Assembleias — avalia Basílio, do TRE-RS.
A "Lei Tiririca"
- Apesar do nome dado à legislação que barra candidatos com pouca votação, a regra dos 10% não teria impedido que Tiririca (PR), com seus 1,016 milhão de votos, levasse mais três deputados à Câmara por São Paulo em 2014.
- O quociente eleitoral no Estado foi de 303.802 votos, e todos os eleitos a reboque de Tiririca conseguiram ao menos 32.080 votos, o suficiente para atender ao requisito de mínimo legal de 10%.
- Por outro lado, Celso Russomano (PRB) obteve 1,524 milhão de votos do eleitorado paulista em 2014 e, sozinho, conseguiu cinco vagas. Se a regra atual estivesse em vigência, ele não teria carregado Marcelo Squassoni e Fausto Ruy Pinato, que conseguiram, respectivamente, 30.315 votos e 22.097 votos, abaixo da linha de corte.