Após meses de debate entre deputados e senadores, a reforma política se restringirá a mudanças pontuais nas regras eleitorais. Alterações expressivas, como o fim da obrigatoriedade do voto e a adoção do modelo distrital misto, ficaram de fora. Já novidades como barreira para partidos nanicos e a proibição de coligações e a criação de um fundo com dinheiro público para campanhas foram aprovadas pela Câmara e pelo Senado.
Para começar a valer nas eleições de 2018, a reforma precisava ser publicada até 7 de outubro — ou seja, um ano antes do pleito. A PEC que cria um fundo eleitoral com dinheiro público e o projeto que regulamenta esse fundo e altera outros pontos da legislação eleitoral foram sancionados pelo presidente Michel Temer nesta sexta-feira (6) — um dia antes da data limite para regras valerem já no ano que vem.
Abaixo, entenda os pontos que podem mudar e os que devem permanecer iguais na proposta aprovada no Congresso.
Aprovadas
Cláusula de barreira
Como é: siglas que receberem poucos votos nas eleições devem sofrer limitações, como repasse menor de verbas públicas e tempo de propaganda partidária e eleitoral.
Qual era a proposta: a partir de 2018, legendas com resultado inferior a 2% dos votos nacionais para deputados federais perderiam o direito a recursos públicos e propagandas.
Como ficará: Na quarta-feira (4), o Congresso promulgou a emenda constitucional que institui uma cláusula de barreira a partir da legislatura de 2019. A medida limita o acesso ao fundo partidário e ao tempo de rádio e TV às legendas que não atingirem um desempenho mínimo nas eleições. Trata-se de uma proposta suavizada em relação à original, com a previsão de restrições às legendas que obtiverem menos de 1,5% dos votos válidos para deputados federais distribuídos em ao menos nove Estados ou que não elegeram nove deputados também em nove Estados. A cada legislatura, a cláusula torna-se mais rígida.
Coligações para eleições de deputados e vereadores
Como é: partidos podem formar coligações proporcionais sem qualquer impedimento. Desse modo, costumam ocorrer alianças entre siglas de ideologias distintas em disputas regionais para alcançar o maior número de votos para a chapa, uma vez que as cadeiras são distribuídas conforme o total de votos depositados em eleitos e não eleitos da chapa.
Qual era a proposta: proibição da coligação ampla e irrestrita, mas manutenção da aliança entre legendas como afinidade ideológica e programática.
Como ficará: em votação relâmpago, o Senado aprovou, no final da noite de terça-feira (3), o fim das coligações em eleições proporcionais a partir de 2020 (inicialmente, previa-se a mudança já em 2018). A medida já havia sido aprovada em segundo turno na Câmara e, na quarta-feira (4), foi promulgada pelo Congresso. Diante da extinção, havia sido apresentada uma proposta para que legendas com afinidade ideológica pudessem se unir em federações, mas os deputados derrubaram a iniciativa.
Financiamento eleitoral
Como é: desde 2015, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), está proibido o financiamento empresarial de campanhas. Somente podem ser realizadas doações de pessoas físicas, e os partidos também recebem recursos públicos, via um fundo partidário que, em 2018, deve chegar a R$ 1 bilhão.
Qual era a proposta: criação de outro fundo público, que chegaria a R$ 3,6 bilhões.
Como ficará: na quarta-feira (4), a Câmara aprovou, em votação simbólica, a criação do fundo público eleitoral para financiar campanhas — principal objetivo da atual reforma política. Sancionada, já vale para as eleições de 2018. O fundo deve ser de ao menos R$ 1,7 bilhão em 2018. A proposta também acaba com a propaganda partidária na TV e rádio a partir de 2018. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Autofinanciamento eleitoral
Como é: atualmente, não há limite para o chamado autofinanciamento eleitoral —quando o próprio candidato doa para sua campanha.
Como era a proposta: limitava a R$ 200 mil o autofinanciamento eleitoral nas eleições majoritárias. Pelo projeto, o candidato ao cargo de deputado federal, deputado estadual ou deputado distrital poderia usar recursos próprios em sua campanha, até o montante de 7% do limite de gastos para o respectivo cargo. No entanto, após uma "barbeiragem" na votação no Senado, candidatos estariam submetidos à regra geral para doação de pessoa física, ou seja, limitado a dez salários mínimos. Em 2018, este teto seria de R$ 9.690.
Como ficará: Ao sancionar o projeto, Temer, no entanto, vetou o artigo que limitava a doação de pessoas físicas aos 10 salários mínimos, mantendo a redação da lei atual. Pela regra que valerá em 2018, candidatos poderão financiar 100% de suas campanhas e pessoas físicas terão o limite de doação de até 10% da sua renda bruta do ano anterior.
Doação de pessoas físicas
Como é: não pode ultrapassar 10% dos rendimentos brutos declarados no ano anterior à eleição.
Como era: pessoas físicas poderiam doar para cada cargo em disputa até 10% de sua renda no ano anterior, limitada a 10 salários mínimos para cada cargo em disputa.
Como ficará: Temer vetou o artigo que limitava a doação de pessoas físicas aos 10 salários mínimos, mantendo a redação da lei atual. Pela regra que valerá em 2018, candidatos poderão financiar 100% de suas campanhas e pessoas físicas terão o limite de doação de até 10% da sua renda bruta do ano anterior. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Propaganda na internet
Como é: é proibida a propaganda paga pela na internet.
Como ficará: permite-se o impulsionamento de conteúdo (pagamento para que postagens alcancem público maior nas redes sociais). Sancionado, já vale para as eleições de 2018..
Arrecadação de dinheiro de campanha
Como é: a arrecadação de verba para campanha só é permitida no período eleitoral
Como ficará: pelo projeto, a arrecadação começar no dia 15 de maio do ano eleitoral. O texto também permite o uso de financiamento coletivo (crowdfunding) para arrecadação de recursos de campanha, desde que respeite alguns pontos, como cadastro prévio na Justiça Eleitoral. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Debates eleitorais
Como é: emissoras são obrigadas a convidar candidatos de partidos que possuem no mínimo 10 deputados.
Como ficará: emissoras serão obrigadas a convidar candidatos de partidos com cinco ou mais deputados. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Pagamento de multas eleitorais
Como é: caso a parcela exceda 10% de sua renda, candidatos podem parcelar suas multas em 60 vezes ou mais.
Como ficaria: o parcelamento poderia ultrapassar os 60 meses se a parcela excedesse 5% da renda (pessoa física) ou 2% do faturamento (pessoa jurídica). Para pagamento à vista, haveria desconto de 90% nos primeiros 90 dias após o projeto entrar em vigor.
Como ficará: Foi aprovada pela Câmara. No Senado, por meio de manobra, foi retirado do texto artigo que previa anistia de até 90% nas multas eleitorais de partidos políticos. Os senadores, porém, mantiveram a permissão para parcelar em até 60 vezes o pagamento das multas, "salvo quando o valor da parcela ultrapassar 5% da renda mensal, no caso de cidadão, ou 2% do faturamento, no caso de pessoa jurídica, hipótese em que poderá estender-se por prazo superior, de modo que as parcelas não ultrapassem os referidos limites", segundo o texto. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Teto de gastos para campanhas
Como é: Não há teto específico para gastos em campanha.
Como ficará: A proposta aprovada pelo plenário da Câmara estabelece limites de gastos para as campanhas. Um candidato a presidente da República, por exemplo, poderá gastar no máximo R$ 70 milhões. Em 2014, a campanha da ex-presidente Dilma Rousseff custou $ 350 milhões e do senador Aécio Neves, que também concorreu à Presidência, R$ 216,8 milhões. Pelo projeto, uma campanha de governador vai poder custar, no máximo, R$ 21 milhões; a de senador, R$ 5,6 milhões; a de deputado federal, R$ 2,5 milhões; e a de deputado estadual, R$ 1 milhão. Sancionado, já vale para as eleições de 2018.
Voto impresso
Como é: Conforme lei de 2015, o voto impresso começa a valer em 2018. A regra foi aprovada pelo Congresso na minirreforma de 2015, vetada pela ex-presidente Dilma Rousseff, mas teve o veto derrubado em novembro de 2015.
Como ficará: Inicialmente, o projeto da reforma política na Câmara empurrava implantação do voto impresso para as eleições de 2022. No entanto, o PSC apresentou um destaque contra o adiamento, obrigando o relator a tirar do texto o dispositivo que previa o voto impresso para 2022. Com isso, caso o projeto seja sancionado por Temer, o voto impresso terá que ser adotado já nas eleições de 2018. No entanto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) diz não ter recursos para viabilizar o processo em todo o país.
Rejeitadas:
Suspensão de publicações na internet
Como é: não existe legislação específica sobre o tema.
Como era: O projeto aprovado pelo Congresso permite que conteúdos sejam retirados da internet após a simples denúncia de que a publicação se trata de um "discurso de ódio, disseminação de informações falsas ou ofensa em desfavor de partido, coligação, candidato". O texto prevê que a publicação denunciada terá que ser retirada do ar em "no máximo vinte quatro horas", até que o provedor "certifique-se da identificação pessoal do usuário" que postou a mensagem.
Como ficará: ao sancionar o projeto, Temer excluiu essa emenda do texto.
Telemarketing eleitoral
Como é: Não é permitido
Como era: O texto-base da reforma política na Câmara permitia o telemarketing durante a campanha. O texto previa que esse tipo de propaganda poderia ser feito "desde que as comunicações sejam realizadas pelo próprio comitê de campanha ou de iniciativa de pessoa natural".
Como ficará: Por meio da aprovação de um destaque apresentado pelo PR, o plenário da Câmara d retirou do texto o dispositivo que permitia a propaganda por meio de ligações telefônicas feitas por voluntários.
Fidelidade partidária
Como é: o partido pode pedir à Justiça Eleitoral a perda de cargo eletivo caso o eleito se desfilie sem justa causa.
Qual era a proposta: determina a perda de mandato se o eleito se desfiliar do partido, exceto se houver "mudança substancial" no programa partidário ou "grave discriminação política pessoal".
Como ficará: um destaque apresentado tornaria mais rígida a fidelidade partidária, impedindo a chamada janela partidária. Na quarta-feira (27), os deputados retiraram o trecho da proposta. Segue permitida, conforme previsto na lei eleitoral, a mudança de sigla até o mês de março dos anos em que houver eleição.
Sistema para eleição de deputados e vereadores
Como é: sistema proporcional, com vagas distribuídas de acordo com um cálculo que considera os votos depositados nos candidatos do partido e da coligação e no voto de legenda.
Qual era a proposta: sistema distrital, popularizado como distritão. Seriam eleitos os candidatos mais votados, e o voto em legenda seria desprezado. Em 2022, o modelo seria alterado para o distrital misto, no qual metade das cadeiras seria preenchida pelo mais votado em cada distrito e o restante acabaria destinado ao sistema proporcional a partir de uma lista fechada de candidatos elaborada pelos partidos.
Como ficará: sem acordo, a Câmara rejeitou a proposta em agosto. Assim, nada muda, mantendo o sistema proporcional.
Suplente de senador
Como é: candidatos escolhem seus suplentes, que podem assumir mesmo sem ter recebido qualquer voto.
Qual era a proposta: suplente seria o deputado mais votado do partido ou da coligação.
Como ficará: em agosto, a comissão especial da reforma política decidiu manter suplentes de senadores. Assim, o modo segue igual ao atual.
Vices
Como é: presidente, governadores e prefeitos formam chapas com vices, que, na sua ausência, assumem a vaga.
Qual era a proposta: não haveria mais vice. O primeiro na linha de sucessão seria o chefe do Legislativo.
Como ficou: a comissão especial que discutiu a reforma política também negou a mudança, mantendo a figura de vice.
* Com agências