O mundo vem vivendo momentos de tensão com a crise climática atingindo quase seu ápice. Queimadas, enchentes, secas, poluição dos oceanos, derretimento das geleiras e outros problemas têm afetado o planeta. Caxias do Sul sofreu efeitos severos das fortes chuvas do mês de maio, resultando em estragos no interior, deslizamentos de terra na região de Galópolis e Vila Cristina, com perda de oito vidas a lamentar. Com isso, um alerta começou a disparar na sociedade para entender como é possível salvar o que resta do sistema ambiental, e as chamadas cidades sustentáveis são uma das chaves para isso acontecer.
Com o crescimento da população morando nos perímetros urbanos, é preciso pensar em como inovar no funcionamento, no planejamento e na organização dos municípios, tornando mais atrativas as oportunidades econômicas e sociais, mas com uma harmonia cada vez mais imprescindível com o meio ambiente. Para que isso ocorra, a gestão pública precisa pensar em como melhorar as condições ambientais e de infraestrutura oferecidas a população.
A reportagem conversou com a professora, pesquisadora da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e pós-doutora em Ciência do Território, Janaina Macke, que trouxe cinco tópicos essenciais para tornar o município referência em conscientização ambiental. Mencionou a oferta de saneamento básico, coleta de resíduos eficiente, fontes de energias renováveis, e investimento em opções de lazer e cultura, além de trabalhar a educação ambiental, como aspectos essenciais.
Em 2023, Caxias do Sul associou-se ao Iclei (Governos Locais pela Sustentabilidade), uma rede global de mais de 2,5 mil governos locais e regionais comprometida com o desenvolvimento urbano sustentável, como uma forma de fortalecer o compromisso com a adoção de práticas sustentáveis e busca de soluções inovadoras para os desafios ambientais. O município também buscou, com a criação deste vínculo, compartilhar conhecimentos e experiências com outras cidades, contribuindo para um desenvolvimento urbano mais equilibrado e em harmonia com o meio ambiente.
Confira abaixo os eixos apontados por Janaina para uma cidade percorrer e tornar-se sustentável.
1. SER RESILIENTE
"É mais importante ser resiliente do que tentar ser sustentável. A sustentabilidade tem uma premissa primordial, que é o uso eficiente de recursos, sejam naturais, financeiros ou de capital humano. E a resiliência nem sempre consegue atender a questão de eficiência, de utilização de recursos. Exemplo: quando a gente tem uma situação de crise, como a da enchente, ninguém ia ficar tentando fazer o uso mais eficiente dos barcos, você vai simplesmente colocar como priorização a vida das pessoas. Então, quando a gente trabalha com o conceito de resiliência, a gente tem que ter sistemas de backups sobressalentes: falha um sistema, aciona o outro. Quando a gente fala de sustentabilidade, a gente só tem que cuidar para que a cidade tenha muito claro o que ela quer: qual é a visão que ela tem de futuro, o que ela precisa se desenvolver."
2. TER DIÁLOGO COM AS COMUNIDADES
"Para construir uma visão de longo prazo, assim como uma empresa, assim como uma pessoa que quer desenvolver a sua carreira, a cidade também tem que fazer isso. E esse construir, obviamente, é com a participação ampla das pessoas. Um eixo de governança, de construção em rede, dessa visão do que se quer para a cidade, do que precisa melhorar como saneamento básico, gestão de resíduos sólidos, políticas públicas de incentivo, dentre outras questões. Tem vários exemplos de cidades que fizeram isso, investiram, fizeram uma divulgação muito ampla, construíram formas colaborativas, aplicativos, para fazer com que a maior quantidade de pessoas pudesse opinar sobre o que quer para o futuro da cidade e, a partir disso, definir as diretrizes."
3. TER UM PLANO DE AÇÃO E DEFINIR PRIORIDADES
"Trabalhar com a questão dos resíduos sólidos, os catadores, com políticas de inovação e políticas de sustentabilidade para que as empresas instaladas na cidade prestem atenção e tenham incentivos em relação a práticas mais sustentáveis, educação ambiental nas escolas. tudo isso é válido. Agora, é preciso ter um plano de ação. É difícil uma cidade ter recursos para fazer tudo o que gostaria. Então, é importante fazer essa visão de futuro e traçar um mapa de prioridades."
4. CRIAR UM MONITORAMENTO GEOLÓGICO
"A questão de ser mais sustentável, no sentido de priorizar a coleta de lixo, pode ser um exemplo. Acho que essa é bastante óbvia, que é uma coisa que sempre vai ter que se desenvolver. Agora, precisa ver, por exemplo, se vai precisar de monitoramento geológico depois de tudo que a gente passou. Estamos muito longe do nível do mar, mas temos as questões de deslizamentos. Sofremos com as chuvas também. A agricultura sofreu. Então, tudo isso são efeitos das questões climáticas e que vão acabar impactando na sustentabilidade no futuro."
5. SER TECNOLÓGICA
"Essa questão de ser sustentável também vai usar algum tipo de tecnologia ou vários tipos de tecnologia. Ela não é uma coisa que é só exclusiva do conceito de cidade inteligente. A gente pode usar a tecnologia em benefício da sustentabilidade, desde tecnologias de sensores até tecnologias que podem prever, inclusive questões climáticas e questões que podem afetar outros recursos naturais. Como, por exemplo, ter modelos que consigam trabalhar essa ideia tanto das chuvas quanto de modelos que preveem a questão de água, disponibilidade de água, outros recursos. Isso pode ajudar na agricultura, isso pode proporcionar, de modo geral, que as pessoas tenham um planejamento e consigam agir de forma proativa quando tiverem uma situação dessa natureza. Enfim, tem várias (tecnologias), e também podemos falar de tecnologia social, ou seja, das pessoas terem acesso a conhecimento de inovações nas áreas que elas estão envolvidas."