Caxias do Sul reverteu o quadro de falta de representação na Câmara dos Deputados, com a eleição de dois parlamentares no domingo (2), e um fator que parece ter contribuído para isso foi a redução de votos para candidatos de fora da cidade. É isso que aponta um recorte com os 15 primeiros colocados que receberam votos no município, mas não têm relação com ele. Os políticos "forasteiros" somaram 46.361 votos. Isso representa 23% a menos do que em 2018, quando esse extrato contabilizou 60.668 votos.
O candidato a deputado federal de fora que mais fez votos em Caxias foi Marcel Van Hattem (Novo), a exemplo do que tinha acontecido em 2018. Porém, ele teve uma redução expressiva da votação na cidade. Caiu de 17.532 para 10.941, despencando 37%.
Para a Assembleia Legislativa (AL), o movimento de redução de votos em candidatos de fora da cidade se repetiu. Há quatro anos, foram 37.717 para os 15 primeiros colocados de fora de Caxias. Na última eleição, esse número caiu para 26.744. É uma queda de 29%.
O "forasteiro" que mais fez votos em Caxias neste ano foi Rodrigo Lorenzoni (PL), filho do candidato a governador Onyx Lorenzoni, com 4.369. Há quatro anos, o mais bem colocado foi o tenente-coronel Luciano Zucco (à época PSL, agora Republicanos), com mais do que o dobro dessa quantidade de votos: 9.581. Em 2022, Zucco não estava na disputa para a AL, concorreu e foi eleito para a Câmara dos Deputados, com a ajuda de 8.594 caxienses. Ou seja, também teve queda no número de eleitores na cidade (cerca de 11%), mas ficou em segundo no ranking dos concorrente de fora na preferência dos votantes locais.
Os impactos para Caxias
Com o sistema eleitoral em vigor, é natural que apareçam votos para candidatos de todo o Estado. É que não existem restrições quanto à votação por região. Porém, há um entendimento de que essa atitude acaba por trazer mais desvantagens do que pontos positivos para a cidade.
Na quinta-feira (5), representantes da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias do Sul se reuniram com os deputados federais e estaduais eleitos. Um dos assuntos em pauta é justamente a articulação de candidaturas para a próxima eleição que viabilizem um número maior de representantes da região. A percepção é de que se as siglas e campos ideológicos reunissem forças em torno dos nomes mais viáveis, Caxias do Sul poderia ter um cenário ainda melhor:
— Caxias do Sul, claro que pelo contexto econômico, pelo tamanho da cidade, vai estabelecer relações com deputados de outras regiões. Mas, seria, obviamente, muito mais conveniente para Caxias ter mais candidatos eleitos aqui. O que nós vamos fazer é estreitar essas relações e manter a proximidade que já tínhamos com algumas lideranças de outras cidades, outras regiões — aponta o presidente da CIC, Celestino Loro.
Para ele, a organização voltada para a próxima eleição tem que começar agora, para que se gerem lideranças políticas locais e se construa consensos em nome da representação de Caxias nos parlamentos.
Estratégia pode ter favorecido voto local
O cientista político e professor da UFRGS Rodrigo Stumpf Gonzalez explica que a atual legislação eleitoral pode ter motivado uma mudança na estratégia dos partidos. Isso pode ser um dos fatores para que representantes de outras regiões recebessem menos votos. A partir destas eleições, partidos e federações puderam indicar, no máximo, um número de candidatos equivalente ao de vagas disponíveis. Ou seja, 31 candidatos para Câmara de Deputados e 55 para a Assembleia Legislativa. Antes, o número podia ser uma vez e meia maior que o número de vagas disponíveis.
Na visão de Gonzalez, isso fez com que os partidos e federações tentassem ter pelo menos um nome para cada grande região do Estado. Ao mesmo tempo, o eleitor tentou buscar rostos conhecidos, como pessoas que já foram prefeitas, deputadas ou representantes do município e região. Exemplos são Neri, o Carteiro (PSDB), que teve 24.853 dos seus 32.378 votos em Caxias e Pepe Vargas (PT) com 49.830 votos dos seus 69.949 votos no município. Ambos foram eleitos para a Assembleia.
— Esse voto localista tem, de um lado, resultado da estratégia dos partidos, e de outro, digamos, essa busca do eleitor por pessoa conhecida — explica o cientista político.
Os "forasteiros" também podem ter recebido menos votos pelo perfil do eleitor brasileiro, que busca atalhos na hora de adotar um candidato. Gonzalez observa que os cidadãos, geralmente, deixam para última hora para escolher em quais deputados votar. Além disso, estes candidatos costumam fortalecer as suas campanhas nas regiões em que são conhecidos.
— Como nosso eleitor é pouco ideológico, no sentido em que poucos votam escolhendo primeiro o partido, a maior parte escolhe primeiro a pessoa e depois identifica o partido. Essa coisa da proximidade, do conhecer cara a cara, saber quem é, de ter algum amigo ou parente que conhece, ajuda nesse processo de escolha — analisa o professor.