Um projeto de emenda à Lei Orgânica que pretende tirar a proibição da concessão de parques e praças à iniciativa privada no âmbito de Caxias do Sul está em tramitação no Parlamento. De autoria de 14 vereadores, mas encabeçado pelo vereador Sandro Fantinel (Patriota), o projeto teve sua primeira discussão e votação nesta quinta-feira (28).
Após um longo debate, os parlamentares aprovaram por maioria (17 a 6) o prosseguimento da tramitação do projeto. Conforme regula o regimento interno da Casa, por ser uma matéria que propõe alterações na Lei Orgânica, deve ser submetida a dois turnos de discussão e votação, com intervalo mínimo de dez dias entre a primeira e a segunda votação. A aprovação só será válida se houver 16 votos favoráveis à emenda.
A atual redação da Lei Orgânica proíbe a doação, venda ou concessão dos parques, praças, jardins ou largos públicos. Se aprovado o projeto, a nova redação da Lei Orgânica não terá mais a palavra concessão. Nesse caso, será permitido que o Executivo conceda essas áreas à iniciativa privada, além de abrir as possibilidades de exploração de atividades e serviços nesses locais.
Segundo os autores da proposta, essa autorização possibilita ao poder público avaliar os locais que possam ter vocação para receber as atividades e serviços. "(...) Entende-se que a possibilidade de concessão será mais uma ferramenta que permitirá ao Poder Público entregar à comunidade espaços com serviços, atividades e manutenção de qualidade, além de reduzir gastos", diz um trecho do projeto.
A matéria ainda indica que o modelo de concessão de espaços públicos é comum em várias cidades, como Nova York, Barcelona e Lisboa. No Brasil, uma das cidades referência é São Paulo. A capital Porto Alegre também aderiu às concessões com o Parque da Harmonia e Trecho 1 da Orla do Guaíba.
Pedido de adiamento da discussão foi rejeitado
Antes da discussão do projeto iniciar, o vereador Rafael Bueno (PDT) solicitou ao plenário o adiamento da primeira discussão para que a proposta pudesse ser debatida com a população em audiência pública. Por maioria dos votos, o pedido foi negado (confira como foi a votação no final da matéria).
— Queremos a discussão com quem é o mais interessado nisso tudo, o nosso povo. Com as comissões aqui da Câmara. É uma proposta que não foi discutida. Assim, a gente pode abrir uma brecha na legislação para que tudo possa ser cercado e cobrado ingresso, a exemplo do parque Ibirapuera e outros espaços urbanos do nosso país. Quem sabe, depois de uma audiência pública, se abra um plebiscito na nossa cidade para ver realmente quem quer isso daí. Nós não podemos criar fronteiras e muros nos espaços urbanos — reiterou Bueno.
O vereador Sandro Fantinel explicou que, a partir da aprovação, será construída uma normativa na administração municipal de como irá funcionar a concessão.
— Vai ser definido quais parques podem receber esse tipo de coisa e os que não podem. Não significa que todos eles vão ter isso — apontou.
Conversas iniciais sobre o Parque da Lagoa do Rizzo e Ecoparque
A prefeitura indica que já existem conversas iniciais sobre incluir o Parque da Lagoa do Rizzo e o Ecoparque no projeto de concessões. Para o prefeito Adiló Didomenico (PSDB), a iniciativa é adequada e oportuna.
— É muito importante que a gente possa fazer essa adoção dos parques em troca de publicidade e, também, concessão. É evidente que nós queremos que, prioritariamente, as entradas dos parques sejam gratuitas. Porém, eventualmente, pode ter um serviço prestado pelo investidor em que ele vai cobrar, mas não a frequência no parque, em que será mantido o acesso livre e gratuito para os caxienses — garantiu Adiló.
O prefeito indica que o Parque da Lagoa do Rizzo é um dos principais locais com vocação para receber a concessão.
— Alguém que tenha a concessão da Lagoa do Rizzo, vai continuar a frequência e a visitação das pessoas livre e gratuita como é hoje. Mas, se ele (a empresa que tiver a concessão) colocar o serviço de pedalinho, ele poderá cobrar para a pessoa desfrutar do serviço de pedalinho, são coisas bem distintas. Qualquer projeto de concessão, ele obrigatoriamente será enviado para a Câmara de Vereadores para buscar a discussão e devida aprovação.
O que diz a UAB
A União de Associação de Bairros (UAB) é contra a aprovação do projeto.
— Somos contra porque é um espaço público. Uma coisa é a ocupação de um espaço público para benefício da sociedade como um todo. Arrendar para a iniciativa privada, daí tu começa a pressionar o público. A pessoa (que vencer a concessão) vai ter autonomia para fazer o que quiser. Fechar, inclusive, a possibilidade do público utilizar o espaço público. Tu começa também a transferir a responsabilidade do município à iniciativa privada. Não é bem assim. O município tem muita responsabilidade. Se é público, precisa ter o acesso de todos. Esse debate deveria ter sido feito antes de qualquer encaminhamento de projeto — afirma o diretor de Comunicação da UAB, Paulo Sausen.
As manifestações dos vereadores
"Queremos a discussão com quem é o mais interessado nisso tudo, o nosso povo. Com as comissões aqui da Câmara. É uma proposta que não foi discutida. Assim, a gente pode abrir uma brecha na legislação para que tudo possa ser cercado e cobrado ingresso, a exemplo do parque Ibirapuera e outros espaços urbanos do nosso país. Quem sabe, depois de uma audiência pública, se abra um plebiscito na nossa cidade para ver realmente quem quer isso daí. Nós não podemos criar fronteiras e muros nos espaços urbanos". Rafael Bueno (PDT)
"Eu fico um pouco triste desse pedido de vista não ser aprovado. Esse debate não cabe a nós estarmos fazendo. Não são apenas os 23 vereadores caxienses que utilizam os parques e a área pública da nossa cidade [...] Ao tirar essa proibição, não se tem a garantia de que a regulamentação não venha a prejudicar a população. Nós assinamos um cheque em branco para que comecem a cobrar sobre eles (entradas dos espaços). Isso pode tirar o direito do lazer, do encontro, do momento com a família e do exercício físico." Estela Balardin (PT)
"Vamos assumir que mudaremos a Lei Orgânica e abriremos um precedente para que isso aconteça (as cobranças), sim. Aqui um vereador falou em cobra. Para mim, o que temos aqui é um urso que hiberna, para fazer uma metáfora. O que falta é gestão, uma gestão de verdade em várias áreas. O urso que acorde e que cuide da cidade. O que nós queremos é que esses espaços sejam melhorados, que secretário responda para vereador, que tenham mais servidores públicos, que se agilizem licitações (...) Eu só não entendi e me surpreende, já que o governo é do diálogo e a base vive falando do diálogo, de não ter aceitado um pedido de vistas." Lucas Caregnato (PT)
"Não é só a esquerda, infelizmente, que gosta de distorcer um projeto tão importante quanto esse. Ninguém falou que os parques serão fechados, não consta em lugar nenhum que será cobrado ingresso. Para o projeto ser aprovado tem que passar por duas votações. Nessa votação aqui ele vai ter andamento e vai ter 15 dias para ter a segunda votação. Nesses 15 dias, quem está tão interessado em ouvir o povo, faça a audiência pública, chame o público, ouça ele e, quando vier a segunda discussão, vote contra. Eu sempre me sacrifiquei pelo bem da nossa cidade. Do jeito que está é inconcebível. Nós temos parques abandonados, com capim alto, com perigo de picada de cobra, brinquedos enferrujados. É isso que o povo merece?" Sandro Fantinel (Patriota)
"Esse projeto não é para uma PPP (parceria público-privada). Nós queremos facilitar e dar melhores estruturas para a população. O poder público não está autorizado a fazer pequenas concessões para facilitar e melhorar a vida das pessoas. Ninguém, nunca, nem o poder público vai cercar uma área a dizer que precisa pagar ingresso. Isso são áreas públicas e continuarão públicas." Mauricio Scalco (Novo)
"O que estamos propondo aqui é tirar essa vedação de concessão e dizer que é uma possibilidade. Mas, com certeza, terá que ser discutida, regulamentada. Eu já fui em vários locais, lugares lindos, lá no Parque Oásis, seria importante ter um barzinho, alguém para cuidar da segurança. Não pode e está na Lei Orgânica. É uma possibilidade. Não é entregar (à iniciativa privada), não é cercar, não é nada do que está sendo trazido aqui." Marisol Santos (PSDB)
Votação do projeto de emenda à Lei Orgânica (primeiro turno)
Contra (6): Denise Pessôa (PT); Estela Balardin (PT); Lucas Caregnato (PT); Rafael Bueno (PDT); Renato Oliveira (PCdoB); Zé Dambrós (PSB)
A favor (17): Adriano Bressan (PTB); Alexandre Bortoluz (PP); Clovis Xuxa (PTB); Elisandro Fiuza (Republicanos); Felipe Gremelmaier (MDB); Gilfredo De Camillis (PSB); Gladis Frizzo (MDB); Juliano Valim (PSD); Marisol Santos (PSDB); Mauricio Marcon (Podemos); Mauricio Scalco (Novo); Olmir Cadore (PSDB); Ricardo Daneluz (PDT); Sandro Fantinel (Patriota); Tatiane Frizzo (PSDB); Velocino Uez (PTB); Wagner Petrini (PSB)
Votação do pedido de adiamento
Contra (13): Adriano Bressan (PTB); Alexandre Bortoluz (PP); Denise Pessôa (PT); Elisandro Fiuza (Republicanos); Gilfredo De Camillis (PSB); Juliano Valim (PSD); Marisol Santos (PSDB); Mauricio Marcon (Podemos); Mauricio Scalco (Novo); Olmir Cadore (PSDB); Sandro Fantinel (Patriota); Tatiane Frizzo (PSDB); Velocino Uez (PTB); Wagner Petrini (PSB)
A favor (nove): Clovis Xuxa (PTB); Estela Balardin (PT); Felipe Gremelmaier (MDB); Gladis Frizzo (MDB); Lucas Caregnato (PT); Rafael Bueno (PDT); Renato Oliveira (PCdoB); Ricardo Daneluz (PDT); Zé Dambrós (PSB)