O evidente cansaço recaía na voz calma costumeira de Adiló Didomenico (PSDB) na última quinta-feira (3), dia que a reportagem o contatou, logo antes de um pequeno e necessário recesso que o novo prefeito eleito de Caxias do Sul deu-se ao direito para ele e a família, que deve durar apenas até segunda-feira (7). Quatro dias após ser consagrado nas urnas, Adiló ainda não havia descansado do intenso período de campanha e mesmo da exigida comemoração e acolhimento dos votos de congratulações que recebeu após o resultado.
— Preciso sair para tirar um fôlego, depois disso vai direto. Agora é que vai começar o trabalho — declarou ao Pioneiro na última quinta.
Aos 68 anos, Adiló garante que encara com "normalidade" a responsabilidade de assumir a prefeitura, papel que afirma que já vinha se preparando há anos e que enxerga quase como um "chamado" de recompensa por tudo que conquistou na cidade.
— Minha família não estava muito de acordo com eu me candidatar, pois já estou numa idade que poderia estar curtindo os filhos, os netos, mas entendo que é uma missão, um desafio, e que deveria me colocar à disposição para tentar devolver a Caxias aquilo que recebemos ao longo dos anos. Sei da dificuldade que vamos enfrentar, mas alguém tinha de fazer isso — reflete.
Ele admite que a exposição maior pode dificultar a acessibilidade com a população e limitar uma de suas principais características, a de não ficar parado no gabinete, mas que espera continuar exercendo como prefeito:
— Quero continuar caminhando pelos bairros como sempre fiz, pelo menos na parte da manhã evitar ficar no gabinete, não sou uma pessoa de gabinete. Gosto de andar, e isso sempre me ajudou, quando está circulando e ouvindo as pessoas tu enxerga melhor o teu trabalho, e sempre que tu aceita opinião, as pessoas também gostam de te ajudar.
Embora Adiló só deva se apropriar concretamente da estrutura e dos recursos de que deve dispor na administração pública após o processo de transição, que se inicia na próxima semana, o Pioneiro pediu ao prefeito eleito apontamentos sobre 20 temas, envolvendo os seguintes pontos: prioridades imediatas, situações da vida real, legado e referências pessoais. Confira:
5 prioridades imediatas
Combate à pandemia e à proteção da saúde das pessoas
"Na segunda-feira, eu e a Paula (Ioris/PSDB, vice prefeita) estivemos com prefeito (Flávio) Cassina (PTB) pedindo para fazer campanha muito forte de conscientização para as pessoas para uso de máscara, álcool gel, distanciamento. Também em seguida vieram as medidas do governo do Estado e acho que é por aí. Somos contra fechamento do comércio, da indústria, entendo que não é a solução, agora precisamos melhorar muito a conscientização e o cuidado. A pandemia nos preocupa e dialoga intimamente com a questão econômica da cidade. Isso é uma preocupação, já começamos a trabalhar. Seguramente estaremos indo a Brasília logo no início para garantir os recursos para compra da vacina tão logo ela seja disponibilizada. Que nós sejamos umas das primeiras ou a primeira cidade do Estado a disponibilizar a vacina para a população. O senador Luis Carlos Heinze (do PP) nos colocou a possibilidade que tem uma rubrica destinada, que não está disponível ainda, mas será destinada, de R$ 47 milhões. Hoje se pegarmos a população de Caxias vezes o custo estimado da vacina, de R$ 80 a R$ 100, precisaria de em torno de R$ 50 milhões, então acredito que é um valor suficiente para cobrir toda a cidade (com imunização). Mas a vacina será opcional, não poderemos obrigar a população a fazer. A ideia é em janeiro liberar, pois há uma previsão de que em fevereiro já tenha a vacina disponível."
Transporte coletivo
"É assunto urgente, pois o contrato (com a Visate) encerra em abril ou maio do ano que vem (encerra-se em maio) e temos de fazer ampla discussão com a sociedade e formatar o modelo de transporte ao custo que a sociedade esteja disposta a pagar. O transporte coletivo tem de ser em torno de R$ 3,50, sem isso ele não compete com aplicativos e caiu muito o número de usuários. Em 2010, tínhamos 300 mil passageiros por dia, quando começou a pandemia estava em 150 (mil) e hoje deve estar na casa dos 70, 75 mil. Esse volume de passageiros não sustenta a estrutura que está à disposição. Eles (atual governo) não vão conseguir lançar o edital este ano e, mesmo se lançassem, nós teríamos que fazer uma ampla discussão, revendo critérios de gratuidade, roteiros, as duas estações de transbordo que precisam ser feitas, a completa integração do sistema, isso também é importante. Não vamos ter dinheiro para fazer estruturas como essas que foram feitas, mas precisam ser feitas e é urgente. São medidas que precisam ser vistas o quanto antes. O modelo que vai ser lançado me parece interessante, mas a gente quer fazer essa discussão através das associações de bairros, dos segmentos organizados, para não tomar decisão unilateral."
Saúde
"Implantaremos o que prometemos no nosso plano de governo, que é a regionalização de quatro UBSs, que são a (Desvio) Rizzo, Esplanada, Cruzeiro e Eldorado, ampliando horário e oferta de serviço. Não sei se a gente consegue nos primeiros meses, mas tem de ser uma meta prioritária para darmos essa resposta para a população."
Aeroporto
"Vai significar grande retomada de toda economia regional. O aeroporto tem um peso muito maior do que estamos imaginando, por isso temos de trabalhar o quanto antes. Vamos designar uma equipe que cuide disso com prioridade dentro da Secretaria de Planejamento, em conjunto com o município de Gramado, porque tem a licitação propriamente dita do projeto, a do aeroporto, mas tem também a rodovia que liga Caxias a Gramado, que é interessante e necessária também que se decida logo no início."
Educação
"Demanda latente, que foi muito cobrada e debatida durante a campanha e nossa caminhada. Nós vamos sentar e discutir com os técnicos e pessoas da área para encontrarmos melhores soluções e dar respostas mais satisfatórias às demandas. Teremos de comprar vagas na iniciativa privada para a educação infantil, já que o município não tem condições de ofertar com estrutura própria essa cobertura."
5 temas da vida real
Redução de CCs
"Sempre defendi que o Estado tem de ser o ideal, nem o mínimo e nem o máximo. Vamos procurar trabalhar com o menor número possível de CCs, em função, inclusive, da situação financeira do município. Mas não tenho preconceito nenhum. Nosso adversário nas eleições disse que no seu governo tinha 157 CCs, mas na época tinha 330 mil habitantes (em Caxias), hoje equivaleria a 246 CCs, e o governo Cassina tem 154. Nós vamos procurar trabalhar com governo mais enxuto possível, mas não existe em nenhuma prefeitura do Brasil uma prefeitura ou governo de Estado que consiga executar seu plano de governo sem auxilio dos cargos de confiança. Hoje tem 154 CCs, eu imagino que é o número ideal, mas, se der para trabalhar com menos, vamos trabalhar com menos."
Conversão à direita
"Na Pinheiro Machado com Visconde de Pelotas nós vamos liberar. Agora foi liberado de forma provisória e eu entendo que esse é um cruzamento que deve ser liberado. (Perguntado se concorda mais com a visão do ex-prefeito Alceu Barbosa Velho, do PDT, que era a favor de priorizar transporte coletivo, ou Daniel Guerra do Republicanos, favorável à liberação de conversões para veículos nos corredores de ônibus:) Não é concordar com Alceu ou Daniel Guerra, são propostas bem distintas e diminuiu muito o número de passageiros para se manter a exclusividade que foi priorizada no Governo Alceu. Na época tinha 300 mil usuários (mês), hoje são 75 mil. Então, a frequência de ônibus diminuiu e temos de dar essa mobilidade para os automóveis. Eu entendo que onde foi liberada, a conversão está funcionando, e a Visconde de Pelotas, que é a principal ligação com a Zona Norte, tem de ser liberada."
Passe livre um vez por mês
"Isso está dentro de várias discussões que pretendemos fazer, pois não tem almoço de graça, alguém está pagando. Num universo de 300 mil passageiros, tu colocar de um domingo de passe livre é uma coisa, mas num universo de 75 mil passageiros, o peso é muito maior. Da mesma forma que a gratuidade de 60 a 65 anos, nós temos de encontrar critérios justos, e não da forma que vem sendo feita até agora. Entendo que tem de ser feita discussão com a sociedade, pois é importante manter qualidade do serviço pelo menor preço possível e quando tem gratuidade sem critério tu onera custo e sobrecarrega quem paga. Isso também não é justo."
Redução de secretarias
"Vamos tomar essa decisão depois que os secretários atuais apresentarem estrutura e diagnóstico das secretarias. É possível que tenhamos algum enxugamento, mas não temos nada definido até agora, como também poderemos manter a mesma estrutura. É prematuro falar sem o diagnóstico completo, agora uma coisa pode ter certeza, nós vamos combater muito a questão dos desperdícios. Se fala muito em enxugar custos, e no poder público temos de cuidar de desperdícios e a ineficiência."
Trimestralidade
"Vamos procurar manter todos os direitos dos servidores, enquanto o município tiver condições vamos fazer esforço para manter. Durante a campanha, fomos muito atacados, mas vamos respeitar muito o estatuto do servidor e suas conquistas. Agora, evidentemente, quem quem dita as regras é a economia e o momento econômico. Não sabemos o que vem pela frente na questão da pandemia. Mas vamos trabalhar forte para manter, pois precisamos do servidor público treinado, motivado e com as ferramentas adequadas. No momento que tira algum direito, você acaba com essa motivação."
5 legados que quer deixar
:: Uma cidade com várias plantas econômicas, não só dependente da matriz metalúrgica. Enfatiza turismo, inovação e tecnologia e construção civil.
:: Cidade com planejamento a médio e longo prazo para que "não soframos os solavancos que já tivemos".
:: Novo distrito industrial para Caxias do Sul nas proximidades do aeroporto (de Vila Oliva).
:: Plano completo de mobilidade para Caxias.
:: Aproveitamento melhor dos resíduos: "Pode ser energético, enfim, de alguma maneira... É um tema a que sempre estive ligado, e Caxias tem de se programar e planejar para não apenas enterrar resíduos como estamos fazendo hoje. O resíduo para nós é despesa, mas para muitos países é matéria-prima."
5 referências
Política: Mansueto Serafini, ex-prefeito de Caxias (1977/1982 e 1989/1992) e José Ivo Sartori, ex-prefeito de Caxias (de 2005 a 2012) e ex-governador do Estado (2015-2018)
Universal: Elon Musk, empresário de tecnologia e segundo homem mais rico do mundo e John Kennedy, ex-presidente dos Estados Unidos.
Pessoal: Geni Parmegiani Stalivieri - Sogra de Adiló de 95 anos, diz que é orientadora destaca pela sabedoria, otimismo e pela visão lúcida.