A cada Dia da Consciência Negra, lembrado hoje, 20 de novembro, data da morte de Zumbi dos Palmares, a notícia se repete: os negros ainda são minoria nos cargos eletivos. Na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, todos os 55 deputados atuais são brancos. Jardel, eleito pelo PSD para a atual legislatura e cassado em 2016, se declarou pardo. Para o próximo ano, uma pequena conquista. Aírton Lima (PR), autodeclarado negro, foi eleito em outubro.
Lima é o quarto negro a assumir como deputado estadual em 83 anos de história da Assembleia. Antes dele vieram Edson Portilho, Carlos Santos e Alcides Cruz. Santos foi também o primeiro presidente negro do Legislativo. Estar entre um grupo tão pequeno e ser o único eleito para a próxima legislatura não é motivo de orgulho para Lima. Ele diz que viver em uma sociedade que discrimina pela cor da pele é lamentável.
– A cor que corre na veia de todos, seja branco, negro, mulato, pardo, é a vermelha. A gente precisa, mais do que nunca, ver que todos têm a mesma oportunidade. Se não houvesse essa discriminação não precisaria existir as leis de cotas, estipuladas justamente para as pessoas negras. A gente vai ter de, com muito diálogo, com muita aproximação, quebrar essa discriminação – defende Lima, que é pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular.
Negro e nordestino, natural de Fortaleza (CE), Lima diz que nunca se sentiu vítima de racismo, o que não significa que o preconceito não exista.
– A gente não pode aceitar sobrar uma oportunidade. O Brasil não é só país de brancos.
O novo deputado está no RS há 18 anos. Ele mora em Cachoeira do Sul e já foi vereador em Itatinga, no interior de São Paulo.
DEPUTADOS ESTADUAIS NEGROS
- Alcides Cruz ocupou o cargo de deputado estadual entre 1897 e 1916. Durante os sete mandatos legislativos pelo Partido Republicano Rio-grandense (PRR), desempenhou cargos na Mesa Diretora e foi vice-presidente da Assembleia em 1911. Foi fundador da Faculdade de Direito de Porto Alegre, atualmente Ufrgs. Lecionou Direito Administrativo e Filosofia do Direito na faculdade. Ele cursou a Faculdade de Direito de São Paulo e foi promotor em Porto Alegre. Cruz morreu aos 49 anos, vítima de tuberculose pulmonar.
- Carlos Santos foi eleito deputado estadual em 1935. Neto de escravos e alforriados e filho de libertos, Santos nasceu em 1904 em Rio Grande. Em 1946, concorreu a uma vaga e ficou como suplente de deputado estadual pelo PSD, sendo chamado três anos depois para ocupar o cargo por alguns dias. Em 1959, foi eleito novamente como deputado estadual pelo PTB, permanecendo até 1975 – nos dois últimos mandatos, ficou na bancada do MDB. Em 31 de janeiro de 1967, foi eleito presidente do Legislativo gaúcho e assumiu o governo do Estado em duas oportunidades. Foi o primeiro negro a ser eleito presidente da Assembleia e a governar o Estado. O primeiro governador negro eleito foi Alceu Collares, em 1990. Santos encerrou a sua carreira política em 1982, como deputado federal. Ele morreu em maio de 1989.
- Edson Portilho (PT) foi deputado entre 2000 e 2007. De Sapucaia do Sul, o professor foi membro do Movimento Negro Unificado (MNU) e do Cpers/Sindicato. Atuou na defesa dos negros, aprovando, por exemplo, projeto de lei que inclui no currículo escolar da rede estadual de Ensino Fundamental e Médio, na disciplina de História, da raça negra e do povo indígena.
Dois vereadores na Câmara de Caxias do Sul
Dos atuais 23 vereadores, apenas dois se autodeclaram negros: Edson da Rosa (MDB) e Denise Pessôa (PT). Edson foi o primeiro parlamentar negro eleito em Caxias, em 2005 – ele está no quarto mandato consecutivo.
Conforme o advogado, jornalista e pesquisador Guiomar Chies, autor do livro Os poderes fazem história, não há notícia de vereador negro no Legislativo caxiense desde 1892 até Edson ser eleito. Denise foi eleita pela primeira vez em 2008 e cumpre seu terceiro mandato.
A Câmara teve um terceiro vereador negro: Assis Melo (PCdoB), eleito para a legislatura 2009-2012, se declarou negro no site da Justiça Eleitoral.
Não haverá nenhum deputado federal negro do RS em Brasília
Na Câmara Federal, o número de deputados negros – soma de pardos e pretos, segundo critério do IBGE – cresceu quase 5% na eleição de 2018 na comparação com 2014. Passou de um em cada 5 para um em cada 4. Mas ainda é minoria. Veja a composição no início da atual legislatura da Câmara dos Deputados e na próxima no quadro ao lado.
Conforme Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), divulgada há um ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2016 os brancos representavam 44,2% da população brasileira, os pardos representavam a maior parte da população (46,7%), e os pretos, 8,2% do total de brasileiros. A cor é autodeclarada pelo entrevistado.
Paim no Senado
Dos 81 atuais senadores, três são negros. Entre eles, o caxiense Paulo Paim (PT). O parlamentar, que está no terceiro mandato, lamenta ser a exceção. O natural seria um equilíbrio entre as etnias nas casas políticas, entende ele. A falta de condições para disputar em igualdade uma eleição está entre os motivos apontados pelo senador para a baixa representatividade.
– Temos vários negros preparados para ser grandes quadros da política, mas a maioria não tem estrutura – lamenta.
NA CÂMARA
São 513 parlamentares. Cor autodeclarada pelo deputado federal
Eleição 2018
104 pardos (20,27%)
21 pretos (4,09%)
125 negros, conforme o IBGE (24,36%)
385 brancos (75%)
2 amarelos (0,39%)
1 indígena (0,19%)
Eleição 2014
81 pardos (15,78%)
22 pretos (4,28%)
103 negros, conforme o IBGE z (20,06%)
410 brancos (29,92%)
ENTENDA
- No registro de candidatura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cada candidato pode se autodeclarar segundo uma de cinco categorias de raça ou cor: preta, parda, branca, amarela ou indígena.
- Segundo a classificação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pardos e pretos são considerados como negros em conjunto.
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