A morte do agente penitenciário da Susepe Clóvis Antônio Roman, 54 anos, no resgate ao preso Guilherme Fernando Huff, 29, durante a madrugada de segunda-feira (7) na UPA Zona Norte de Caxias do Sul retoma uma série de questionamentos que deixam apreensiva a comunidade. O principal deles é o critério para a escolta de criminosos de presidiários para hospitais e prontos-socorros, uma vez que, nesses locais, eles podem ser resgatados por integrantes de facções criminosas ou até executados por rivais.
Para evitar que situações como essa se repitam no Estado, está em tratativa entre a Secretaria da Administração Penitenciária (Seapen) e a de Saúde (SES) uma mudança de protocolo para atendimento de presos com a implantação da telemedicina. Em entrevista ao Gaúcha Atualidade na manhã desta terça-feira (8), o secretário da Administração Penitenciária (Seapen), Mauro Hauschild, explicou que o governo do Estado está em processo de contratação desse serviço:
— Estamos no meio de um processo de contratação de telemedicina com telediagnóstico para permitir que o profissional de saúde possa fazer essa primeira observação daquele preso e nos ajudar a tomar essa decisão (de levar para atendimento).
Ele explica que a telemedicina deve ser implantada em breve, o que irá reduzir custos e riscos para as equipes e também para a população.
— É um serviço que estamos na iminência de colocar à disposição de todas as nossas unidades prisionais. Isso vai diminuir custos, diminuir riscos não só para os nossos agentes bem como para a sociedade, que acabou sendo vitimada, com os dois profissionais da unidade de saúde que foram lesionados. A tecnologia vai nos ajudar, e estamos adotando as providências para minimizar esse tipo de situação — afirma.
A mudança de protocolo, segundo ele irá reduzir os deslocamentos de presídios como o Apanhador, que fica na divisa entre Caxias do Sul e São Francisco de Paula, até a UPA, o que também proporciona a chance de resgates.
— Estamos na parte final de contratação junto à Secretaria de Saúde, e esperamos muito em breve não só ter a telemedicina, como também ter alguns equipamentos, que vão poder ser manuseados com a capacitação dos nossos agentes para poder fazer telediagnósticos. Ou seja, nosso servidor vai poder fazer alguns exames monitorados pelos profissionais de saúde no sistema, e isso vai permitir que a gente consiga detectar quais situações efetivamente podem exigir a necessidade de levar um preso para a unidade de saúde — garante o secretário.
Critérios para levar presos para atendimentos médicos
Mauro Hauschild ressalta que o procedimento de escolta adotado foi padrão, com todos os cuidados e cautela necessários para este tipo de remoção.
— Nós tivemos dois atendimentos, dois agentes acompanhando um preso e outros dois agentes acompanhando outro preso até a UPA. Cinco minutos depois da chegada desse segundo preso, bandidos invadiram a unidade, atacaram nossa equipe e foram repelidos, mas como um dos nossos colegas foi ferido, um desses presos conseguiu se apossar dessa arma e trocou tiros, lesionando duas pessoas na UPA e levando à morte do nosso colega. Eram duas operações distintas que ocorriam naquela unidade.
Ele explica que, apesar de ter uma Unidade Básica de Saúde (UBS) dentro da Penitenciária Estadual do Apanhador, o atendimento ocorre apenas durante o dia.
— O atendimento de saúde precisa ser ofertado a todas as pessoas, independente da condição de preso. Naquele momento à noite, nós não tínhamos nenhum serviço médico ou hospitalar na unidade penitenciária porque os serviços lá são apenas no horário de expediente. Como nossos servidores não tinham a capacidade de fazer um diagnóstico, naturalmente era nossa obrigação levá-lo para a unidade de saúde. Dois estavam escoltando e tínhamos a informação que outros dois estavam na unidade, mas infelizmente tivemos essa intercorrência.
Ele ressalta ainda que o critério para atendimento médico à noite é subjetivo, porque depende da avaliação do servidor.
— Como não temos um profissional de saúde no local vai da sensibilidade dos nossos servidores que estão ali à noite de avaliar aparentemente a gravidade da situação à qual aquele preso está submetido. A partir da estrutura interna, o nosso monitor vai mobilizar uma equipe e organizar a logística para fazer o deslocamento.
Sobre a possibilidade de acionar o Samu para atender os presos dentro da penitenciária, o secretário ressalta que é um assunto a ser debatido.
— São questões que vamos ter que discutir a partir de agora.
Periculosidade do preso era desconhecida
Com bases nas informações do sistema do RS, não se sabia a periculosidade do preso Guilherme Fernando Huff.
— É importante deixar claro que temos mais notícias da periculosidade desse preso porque agora as coisas vem à tona. Os sistemas do RS e de Santa Catarina não são intercalados, e antes não se sabia a periculosidade desse preso porque, com base no nosso sistema, tínhamos a tranquilidade de remover esse detento, mas não foi o que aconteceu.
O que diz o Sindicato dos Servidores Penitenciários
O presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado do Rio Grande do Sul (Amapergs), Saulo Felipe Basso dos Santos, estará em Caxias do Sul nesta terça-feira (8) para conversar com os servidores que atuam no Apanhador. Ele também pretende visitar a antiga Pics e o Instituto Penal. Santos avalia que a ideia da telemedicina é interessante, mas, mesmo assim, ressalta que é preciso avaliar se o serviço tem como ser implantado:
— A ideia do atendimento médico por telefone em tese é interessante, mas não sei se ela não é inexequível, visto que alguns atendimentos, por óbvio, não vão poder ser feitos desta maneira, porque precisa da presença física, do toque e do exame presencial. Mas, se esse tipo de procedimento reduzir os atendimentos presenciais, os deslocamentos, o sindicato não se opõem de maneira alguma.
Contudo, Santos esclarece que há um regramento em relação ao número de servidores de saúde, seguindo regras do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. O documento estabelece a proporção de profissionais da equipe técnica por 500 detentos, sendo que prevê um clínico geral, um enfermeiro, um auxiliar de enfermagem, um odontólogo, um auxiliar de consultório dentário, um psicólogo, um terapeuta ocupacional, um pedagogo, um nutricionista e um assistente social. Também prevê seis estagiários de psicologia e seis de assistência social.
Para ele, a PEC que regulamenta a polícia penal no Estado, transformando servidores penitenciários em policiais, é um avanço no sistema prisional gaúcho. Uma cópia do projeto foi entregue ao sindicato e protocolada pelo governo na AL (Assembleia Legislativa) na tarde de segunda. A categoria, que fazia vigília em frente ao Palácio Piratini, em Porto Alegre, homenageou o colega morto. Ele ressalta que os servidores penitenciários, que serão transformados em policiais penais, receberão armamento do Estado, sendo que hoje este é um dos pontos criticados pelo sindicato: a falta de armas e de efetivo, bem como a falta de cursos de qualificação.
O presidente avalia ainda que a possibilidade de registrar boletins de ocorrência e termos circunstanciados sem sair dos presídios trará mais segurança à equipe e à sociedade, porque o preso é levado junto até a delegacia:
— A polícia penal vai propiciar que a gente faça isso dentro da cadeia e evita o deslocamento do preso com o material apreendido. Às vezes, para fazer o registro na delegacia de polícia, demora, porque tem que ir até a cidade mais próxima, aguardar até o momento de ser atendido naquela delegacia e ainda se deslocar de volta com o preso até a casa prisional.
Ele esclarece também que, com a aprovação da PEC, os agentes vão poder atuar na recaptura de presos, o que irá agilizar e qualificar o trabalho dos servidores.
— Hoje se um preso no interior do Estado conseguir de alguma maneira fugir da casa prisional, os servidores do sistema que conhecem as características físicas e até psicológicas, sabem em tese onde esse apenado tentaria se esconder, não podem fazer a recaptura, eles precisam acionar a Brigada Militar (BM). Perdemos um tempo precioso, e a BM, depois que chegar, que às vezes demora em função do deslocamento e do tamanho das demandas de cada da cidade, vai ter dificuldade em localizar esse preso porque não conhece ele fisicamente e não teve a proximidade que os agentes tiveram com esse presidiário na cadeia — argumenta.