Região do Estado mais atingida por deslizamentos de terra na tragédia climática de maio, a Serra concentra índices significativos de perdas na mata nativa. Só na Serra das Antas, entre Bento Gonçalves e Veranópolis, os deslizamentos de terra somam quase 300 pontos. Nesses locais, a vegetação foi levada pela força da água, formando crateras no meio da mata.
Nesse cenário, especialistas indicam que a própria natureza tem condições de recuperar a mata perdida. No entanto, a lentidão do processo demanda acompanhamento para avaliar os riscos de erosão no solo.
— Considerando que tenha um entorno florestal, a regeneração natural pode acontecer relativamente rápido. Acredito que em quatro ou cinco anos já poderia ter uma cobertura significativa. Mas a cobertura arbórea vamos começar a perceber em uns 10 anos – explica Sandra Muller, especialista em florestas e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Segundo a professora, enquanto o solo fica exposto ao clima, o risco de novos deslizamentos ocorrerem é real, assim como a possibilidade de a área degradada aumentar.
— Em todas essas regiões pode variar muito o nível da degradação. Entender o que aconteceu e como o ambiente se comporta depois é essencial para determinar qual intervenção será necessária e o quanto, simplesmente, deixar a natureza se regenerar seria o suficiente — detalha Sandra.
Outra preocupação apontada por Gisele Cemin, bióloga e professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), é a chance do assoreamento do Rio das Antas aumentar. Se a Serra das Antas for atingida novamente por chuva intensa, o solo pode ceder e se sedimentar no leito do rio, aumentando o nível da água.
— Esse material vai descer por declividade e parar junto aos rios. Mais sedimentos no leito fazem com que o nível da água se eleve. Por consequência, a quantidade menor de chuva pode fazer com o nível do rio se eleve mais rapidamente. Além disso, a erosão pode ocasionar perdas irreparáveis no solo, porque essa terra que é levada não é reposta pelo meio ambiente — descreve Gisele.
Soluções para analisar e recuperar
Para Gisele e Sandra, o ideal seria que os municípios identificassem os pontos mais críticos que necessitam de intervenção para a estabilização. Nesses casos, Sandra indica que obras de contenção com madeira ou bambu poderiam auxiliar a reter o solo. Nos locais em que a terra está firme, Gisele sugere o plantio de uma vegetação para a cobertura.
Sem essa estabilidade, as chances de uma planta ou de uma árvore se fixar no local é baixa, apontam as professoras. Por consequência, o processo de recuperação do espaço é retardado. Considerando que eventos climáticos extremos, como a chuva de maio, devam se tornar cada mais frequentes, o acompanhamento dos locais e ações de reabilitação do meio ambiente são essenciais.
Na metade de julho, uma ação de reflorestamento foi realizada em Marques de Souza, Pouso Novo e Santa Clara do Sul, cidades do Vale do Taquari. Sementes de árvores nativas foram lançadas de um helicóptero em áreas atingidas pela enchente, próximas ao Rio Taquari.
A ação foi uma iniciativa do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama), Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), Exército Brasileiro, com órgãos e entidades do Vale do Taquari.
Procurado pela reportagem, o Ibama informou que “está à disposição para realizar ações em conjunto com os municípios do Estado”. Contudo, não possui um projeto de reflorestamento das áreas atingidas na Serra.
A Sema informou que as ações de reflorestamento podem ser realizadas por qualquer município. A secretaria indicou que pretende realizar projetos semelhantes ao do Vale do Taquari. Contudo, as regiões contempladas e possíveis datas não foram definidas.
A prefeitura de Bento Gonçalves afirmou que segue monitorando as áreas atingidas para evitar deslizamentos e “posteriormente a esta etapa serão analisadas as formas de reflorestamento”. Já a prefeitura de Veranópolis informou que não há projetos de recuperações da mata perdida.
Governo do Estado anuncia programa para desassoreamento de rios
Durante esta semana, o governo do Rio Grande do Sul anunciou um programa de desassoreamento para córregos, canais de drenagem e sistemas de águas pluviais. O projeto será implementado em dois eixos.
O primeiro envolve pequenos recursos hídricos, tendo aporte de R$ 300 milhões por parte do Estado. O segundo eixo trata de recursos hídricos de médio e grande portes e contará com ações diretas do governo estadual.
As prefeituras interessadas em receber recursos deverão cadastrar projetos junto ao governo do Estado. As propostas do eixo 1 podem ser enviadas até 27 de agosto. A divulgação dos primeiros 45 projetos selecionados ocorrerá até 15 de setembro.
No eixo 2, está em andamento um diagnóstico de desobstrução dos trechos hidronavegáveis da foz do Rio Taquari até a Foz da Lagoa dos Patos e o Porto de Rio Grande. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) é o responsável pelo estudo.