Medo de morrer no tiroteio entre criminosos e policiais: é assim que um funcionário do Aeroporto Hugo Cantergiani, em Caxias do Sul, descreve as cenas de terror vividas na noite da quarta-feira (19). O homem de 46 anos, que trabalha há mais de uma década no aeroporto da Serra, conta que nunca viveu uma situação parecida.
Ele e mais dois colegas ficaram reféns dos assaltantes por cerca de 30 minutos, até que agentes do Choque conseguiram resgatá-los. Nesse tempo, presenciou a troca de tiros e ouviu a conversa entre os criminosos.
O funcionário relata que, por volta das 19h30min, foi até o Hangar 2 guardar um veículo do aeroporto. No percurso até lá, ouviu os tiros mas supôs que vinham de outro local.
— Tinha uma caminhonete adesivada com a identificação da Polícia Federal e um homem vestindo roupas parecidas com a da Polícia Federal: capacete balístico, rosto coberto e armado com um fuzil. Ele gritou “Polícia Federal, operação da Polícia Federal”. Eu guardei o carro e desci. Ele pediu o meu celular e entreguei. Quando virei de frente e olhei, vi que aquela vestimenta não era a mesma usada pela polícia.
Neste mesmo local, um segundo criminoso tinha rendido uma mulher, supostamente funcionária de uma empresa terceirizada que presta serviço ao aeroporto. O homem foi conduzido para junto da mulher, permanecendo na guarita por alguns minutos. Na sequência, um terceiro colaborador chegou. Ele também foi abordado pelos criminosos e levado para juntos dos outros dois reféns. Passados alguns minutos, começou a troca de tiros entre criminosos e policiais.
— Um dos criminosos olhou em direção ao saguão. Nisso ele colocou a mão no ombro da moça, apoiou o fuzil e começou a atirar. Ela começou a gritar. A minha reação foi me abaixar. Consegui me arrastar até a guarita e fiquei ali para me proteger — descreve a vítima.
Acrescenta que, depois de alguns instantes, o outro refém chegou na guarita. Os dois homens ficaram dentro do local, enquanto que a mulher permaneceu do lado de fora. Segundo a testemunha, o barulho de tiros e os gritos da mulher eram constantes. Abaixado, ele não viu a chegada de outros criminosos, mas ouviu a movimentação de pessoas.
— Eles começaram a conversar, com muita calma, tinham sotaque paulista. Um deles disse que o fuzil tinha travado. Então o outro gritou que ia pegar o (fuzil) ponto 50. Nisso começou um barulho, parecia que estavam arrombando alguma coisa. Depois, eu soube que eles tiraram essa arma do estepe da caminhonete que estava ali — detalha.
Conforme o homem, o tiroteio recomeçou, durando mais cerca de 10 minutos. Nesse intervalo, a troca de tiros oscilava em pausas e retomadas com som muito mais intenso, devido ao uso do fuzil ponto 50. Após, relata que só ouviu a mulher gritando e teve a impressão de que ela estava sozinha.
— Quando levantamos a cabeça, vimos um giroflex. No carro dos bandidos não tinha. Então, ficamos na dúvida se era polícia. Mas não tinha barulho, não tinha som de voz. Achamos melhor não sair e ficamos ali na guarita por mais uns 10 minutos — comenta.
Depois, conta ter ouvido um barulho de veículo, que parecia ser um blindado. O som de manobras o levou a acreditar que seria a polícia. Os dois homens combinaram que não iriam fazer movimentos bruscos e facilitar a identificação.
— Os policiais quebraram o vidro com um fuzil e nos viram. Ai a gente gritou “refém, refém”. Eles entraram na guarita, nos revistaram e nos deram orientação de como sair. A gente correu abaixado até o blindado e eles nos trouxeram até o final da linha do Salgado Filho — relembra.
Os homens receberam atendimento médico e, na sequência, foram encaminhados para prestar depoimento. Conforme a testemunha, quando saíram da guarita, não viram a mulher que também tinha sido feita de refém. Ainda, o funcionário do aeroporto conta que nem ele e os outros reféns foram ameaçados pelos criminosos.
— Eles sabiam muito bem o que estavam fazendo. Não demonstraram nervosismo em nenhum momento. O único "empecilho" deles (criminosos) foi o pessoal da empresa que faz o transporte do dinheiro ter reagido — diz a testemunha.
Nesta quinta-feira (20), o funcionário retornou ao aeroporto para recuperar os documentos e o celular. Apesar da noite de horror, o homem admite que não pretende deixar o emprego. O aeroporto foi reaberto na manhã desta quinta, com a retomada das viagens na parte da tarde.
A polícia acredita que ao menos oito criminosos estejam envolvidos no assalto. Forças de segurança atuam nas buscas do grupo, que fugiu para uma área de mata.
O sargento Fabiano Oliveira, 47 anos, do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), foi morto pelos criminosos. Um dos bandidos foi morto no confronto.