Se por um lado os turistas seguem aproveitando os atrativos de lazer no centro de Gramado, moradores do principal município da Região das Hortênsias estão com receio de novos deslizamentos de terra. O assunto ganhou destaque nesta semana após o desabamento de um prédio, na manhã desta quinta-feira (28), e da retirada de moradores de áreas consideradas de risco devido ao surgimento de rachaduras no solo.
No bairro Moura, distante cerca de três quilômetros do Centro, a costureira Marisete Souza Pinto, 55 anos, diz ter percebido que o número de prédios cresceu muito nos últimos anos na cidade.
— A cidade virou só prédio. Não se vê mais casa sendo construída. O terreno na cidade se tornou muito caro e tu não vai querer construir uma casinha, não vale a pena. Eu morava no bairro Floresta, mais perto do Centro, e vi muito isso ao longo dos últimos anos - analisa ela, que mora na cidade desde que nasceu.
Distante dali, o garçom Fabrício Júnior Cardoso, 28 anos, chegava em casa no bairro Piratini e observava mais uma vez a água que saía da calçada. Tem sido assim desde o último temporal, na sexta-feira, que indica que o solo segue encharcado. A residência fica em um morro, próximo de outros barrancos, e na mesma região do prédio que desabou nesta quinta-feira. Casas também foram construídas no barranco.
— Quando chove, escorre muita água e fica muito barro na rua. Desbarrancou um pouco, veio uma patrola da prefeitura, e colocou cascalho. Mas me preocupa essa vertente na calçada, o dia todo escorrendo água. Vai água pra grama, que vira barro, e vai pro vizinho também - conta Cardoso.
Morar próximo de um barranco também é uma realidade para a assistente administrativa Laura Cardoso, 27 anos. Mãe de Catarina, com 14 dias, e dos meninos João Pedro, 10, e Thomaz Rafael, 7, ela reside no bairro Casagrande há 15 anos em um terreno com duas casas. Acima do morro, há uma antena de celular.
— A gente fica preocupado, toda a vez que acordo vou olhar se tem algo diferente. Tinha o costume de cortar o mato que se formava no paredão, mas percebi que era pior, dava mais medo, e resolvi não fazer mais. Parece que o perigo mora ao nosso lado — conta.
“Devemos tratar como uma queda de avião”, avalia professor de Geotecnia da UCS
O engenheiro civil e professor de Geotecnia da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Bruno Susin, esteve em Gramado analisando a área. Na visão dele, não é possível afirmar, sem estudos, o que provocou o surgimento de rachaduras no sol - o que inclui os entendimentos sobre ações de detonações, por exemplo.
Ainda segundo ele, as chuvas dos últimos meses podem ter influenciado. Além disso, no prédio que desabou, o terreno apresenta um longo declive e que apresentava bastante umidade durante a quinta-feira.
— A gente viveu um longo período de estiagem e, quando chove, há uma incidência pluviométrica intensa e em curtos períodos de tempo. Isso coloca o material, o solo, a rocha, em situação de extrema condição geotécnica. E, quando não bem avaliado, ocorrem perdas.
Susin entende também que os municípios precisam fazer ou atualizar os mapas de locais considerados de risco.
— Precisa de mais pesquisa pra tentar entender o que aconteceu isso. Precisamos tratar o que aconteceu aqui como se fosse uma queda de avião. É rastrear onde aconteceu o erro para evitar que isso ocorra novamente. Felizmente, as pessoas puderam sair de casa, houve apenas a perda material, mas assusta, preocupa e precisa de atenção — afirma.
A prefeitura de Gramado diz que segue atuando para conter os danos causados pelas fortes chuvas dos últimos dias. Defesa civil, equipes técnicas do município e Bombeiros seguem monitorando as áreas de risco e ajudando no isolamento. Geólogos e outros técnicos estão prestando assessoramento para direcionar as ações de mitigação, salvamento e resgate, caso seja necessário.
O Executivo reforçou também que as principais vias de acesso à cidade foram liberadas. A área central do município não foi atingida e as atividades turísticas, comerciais e de eventos, bem como a programação do 38° Natal Luz de Gramado, ocorrem normalmente.