Nem todos aqueles que chegam à terceira idade são avós. O contrário também é verdadeiro. Mesmo assim, é fato que, com o passar dos anos, as pessoas necessitam de um olhar mais afetuoso e atencioso sobre si. Este é um dos objetivos da Pastoral da Pessoa Idosa (PPI) da Diocese de Caxias do Sul e, neste Dia dos Avós, a reportagem vai contar sobre o trabalho de centenas de voluntários que dedicam, mensalmente, parte dos seus dias àqueles que já assopraram inúmeras velinhas e merecem respeito e consideração de toda a sociedade.
É importante salientar que desde o ano passado a Igreja Católica celebra o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, de forma conjunta, no quarto domingo de julho, próximo ao dia de Santa Ana e São Joaquim, os avós de Jesus. Mas, bem antes disso, desde 2004, a Pastoral da Pessoa Idosa realiza, em nível nacional, um trabalho para valorizar e promover a dignidade daqueles que chegam à terceira idade. Na Diocese de Caxias, a PPI foi implantada quatro anos depois, em 2008, e conta com cerca de 900 líderes voluntários capacitados nas paróquias da Serra — com a pandemia de covid-19, contudo, nem todos estão ativos no momento.
O trabalho dos líderes da Pastoral da Pessoa Idosa pode ser traduzido pelas palavras doação, valorização e, sobretudo, escuta. A eles cabe fazer visitas domiciliares aos idosos mensalmente. São, em sua essência, pessoas dispostas a levar diálogo e empatia a idosos da vizinhança. Cada líder atende, geralmente, de 10 a 20 pessoas por mês, sendo necessário passar por um curso de capacitação de mais de 20 horas para executar o trabalho.
— O objetivo é levar a mensagem do amor, da ternura e da acolhida, além de lembrar a estas pessoas que elas não estão esquecidas pela comunidade e pela Igreja. Levamos alegria, fé e oração. Lembramos que são pessoas importantes pela sua vivência, pela sabedoria que tiveram — ressalta a coordenadora diocesana da Pastoral da Pessoa Idosa, Adiles Meneguzzo.
Para além do momento de conversa, a visita também gera importantes informações sobre esta população. Em cada encontro, os líderes preenchem dados sobre o visitado, os quais se transformam em um relatório que é enviado para a secretaria nacional da pastoral todos os meses. A partir destes levantamentos, é possível ter estatísticas sobre os idosos brasileiros, além de auxiliar na implantação de políticas públicas para este público. Adiles comenta que um dos parceiros e beneficiado pelo trabalho é o Ministério da Saúde.
Antes feitos somente em formulários de papel, hoje, os registros também ocorrem de forma digital, em um aplicativo de celular.
— A metodologia é igual para todo o território nacional. A líder, por exemplo, registra no aplicativo se a pessoa caiu durante o mês; se caiu, responde se precisou ser hospitalizada. Também tem a pergunta se a pessoa toma dois litros de água por dia, qual a forma de moradia, qual o tipo de alimentação, a situação das vacinas. É uma série de questões — detalha a coordenadora da Diocese de Caxias do Sul.
Além disso, durante a visita o líder fica atento a eventuais necessidades da pessoa idosa. Observada qualquer situação fora da normalidade, o caso é repassado aos familiares e, caso necessário, é encaminhado a serviços competentes, como secretarias da saúde, assistências sociais, entre outros.
— Trabalhamos com a rede da comunidade, do município. Antes de instalar a PPI na paróquia, buscamos saber quais serviços em favor dos idosos têm naquele local. Hoje, temos muitos serviços para não deixar essas pessoas descobertas — avalia Adiles.
Para a coordenadora, o trabalho da Pastoral da Pessoa Idosa é uma verdadeira missão:
— É muito gratificante. Compensa demais. As líderes testemunham que, quando elas conseguem fazer uma visita bem-feita, ficam satisfeitas. É uma terapia. Ao ouvir as pessoas, elas aprendem muitos exemplos de sabedoria.
"É uma irmã para mim", diz idosa que recebe visita de voluntária há oito anos
É com um sorriso no rosto e a frase "cadê a minha menina?" que a líder voluntária Beatriz Maria Perini Santini, 72 anos, chega a casa da moradora do bairro Cruzeiro Leoni Terezinha Rech, 87. Ao abrir a porta da residência, o riso logo é retribuído, acompanhado de um afetuoso e demorado abraço entre as duas.
A cena é comum na rotina de Beatriz. Afinal, já são 13 anos dedicados à Pastoral da Pessoa Idosa na Paróquia Sagrado Coração de Jesus. Atualmente, cabe a ela visitar e atender 13 idosos, sendo nove mulheres e quatro homens.
— Eu sou um ombro amigo. Pergunto como eles estão, converso, a gente ri, brinca. Sinto que dá um ânimo para eles quando eu chego. Me abraçam, dizem que me querem muito bem — diz a voluntária do bairro Cruzeiro.
Leoni recebe a visita de Beatriz há oito anos. Nesse meio tempo, já passou por uma queda e enfrentou dois cânceres, sempre com o apoio da vizinha. Mesmo tendo a companhia da filha, Maria Lúcia, a idosa considera o encontro com a voluntária um dos momentos mais esperados do mês. Até sente falta quando Beatriz se ausenta para ir à praia:
— É uma irmã para mim, muito bom ter a visita dela. Se ela vai para a praia eu logo digo "volta para ficar com a velhinha". É uma vizinha exemplar para nós. Adoro ela — diz.
O perfil de dona Leoni não é unanimidade, contudo. A voluntária conta que a pastoral também lida com situações de vulnerabilidade social, onde há necessidades voltadas à saúde e à alimentação dos idosos. Cestas básicas e fraldas são exemplos de itens comumente direcionados a eles nestas situações. Os encaminhamentos geralmente são feitos via unidades básicas de saúde (UBSs).
— Muitos dizem "chegou o nosso anjo da guarda". Ficam felizes por serem ajudados —conta Beatriz.
"A gente se apega e eles também se apegam a nós"
Coordenadora da Pastoral da Pessoa Idosa na Paróquia Santa Catarina, Barbera Andreazza, 75, está à frente de 37 líderes, os quais visitam cerca de 180 idosos na comunidade. Ela participa da iniciativa há 12 anos e, atualmente, faz visitas a seis idosos da região onde mora, próximo aos Pavilhões da Festa da Uva.
— Agora, eu mesma já estaria precisando das visitas — brinca a voluntária, referindo-se também ao desafio de captar novos líderes, principalmente após a pandemia.
Barbera conta que até há alguns dias eram oito os idosos visitados. Contudo, duas perdas recentes, na mesma semana, diminuíram a lista. Para ela, o sentimento foi de como tivesse perdido alguém da família, tamanho vínculo estabelecido durante os encontros mensais ao longo dos últimos anos.
— O que me traz mais alegria é ver a felicidade das pessoas que eu visito. A gente se apega e eles também se apegam a nós. Essas duas que faleceram eu sentia como se fossem minhas irmãs, da família mesmo — detalha.
No roteiro atual de visitas da Paróquia Santa Catarina estão as próprias irmãs de Barbera, Eleonor e Emilia Menegat, que têm 84 e 88 anos, respectivamente. Na casa, também vive o esposo de Eleonor, seu Valdir Pandolfi, 88. Apesar de estarem cercados pelos filhos e netos e se sentirem privilegiados por morarem juntos, fazendo companhia uns aos outros, os três enxergam o trabalho da Pastoral da Pessoa Idosa como algo necessário nos dias atuais, onde muitas famílias não têm tempo de dar a devida atenção aos mais velhos.
—A gente gosta da visita para conversar, se distrair e não estar falando sempre a mesma coisa entre nós. Eu admiro muito essa dedicação delas (voluntárias) visitarem os idosos. A gente até gostaria que fosse mais vezes porque, nós gostamos de falar, de ter alguém que ouça — avalia Eleonor.
— É muito importante a visita delas, ainda para aqueles que são sozinhos — completa Emilia.