O dia de greve geral nesta sexta-feira em Caxias do Sul foi marcado por paradas de ônibus vazias, saídas para a BR-116 e a ERS-122 bloqueadas, protestos na Praça Dante, diminuição da procura de clientes pelo comércio, aulas interrompidas, serviços à população restritos e até dois atropelamentos de manifestantes.
Além de sindicalistas, o ato contra as reformas da Previdência e trabalhista contou com categorias diversas, como agricultores, professores de colégios particulares e públicos e membros da Marcha Mundial das Mulheres. A movimentação teve início por volta das 5h, quando a garagem da Visate, na Rua Júlio Calegari, foi trancada por cavaletes – retirados às 10h – e os coletivos permaneceram estacionados, sem percorrer as ruas de Caxias.
Leia mais:
'Manifestação foi totalmente inoportuna', definiu presidente da CIC
Maioria das escolas das três maiores cidades da Serra sem aulas
Greve geral afetou movimento no comércio em Caxias do Sul
Pouco tempo depois, duas pessoas foram atropeladas por veículos que teriam furado os bloqueios. A primeira, por volta das 7h, na Rota do Sol, próximo à Companhia de Desenvolvimento Urbano de Caxias do Sul (Codeca). Trata-se de uma mulher de 42 anos, que não teve a identidade revelada. Ela foi socorrida pelo Samu e não apresentou ferimentos graves.
Às 8h, o sindicalista Luiz Fernando Subtil Sant'Ana foi atingido por um carro no acesso à Universidade de Caxias do Sul (UCS). Ele pertence à diretoria do Sindicato dos Trabalhadores do Ensino Privado (Sintep). Sant'Ana caiu, bateu a cabeça e chegou a ficar desacordado. Ele passou por uma bateria de exames, mas o quadro não seria grave.
– Uma senhora chegou e tentou passar. Falamos para ela ter calma e explicamos o que acontecia. Ela não quis nem saber e tocou o veículo por cima de nós – relatou o diretor administrativo do Sintep, Ademar Sagarbossa.
Os dois incidentes tiveram boletins de ocorrência registrados pela polícia, mas ninguém chegou a ser detido. Em nota, o Sindicato dos Professores de Caxias do Sul (Sinpro) lamentou a "crueldade e falta de humanidade" dos responsáveis. Às 10h, a manifestação ocupou a Praça Dante e interrompeu a circulação de veículos em frente à Catedral Diocesana. No final da tarde, o grupo novamente se reuniu no local para um segundo ato, que se encerrou às 18h.
– Precisamos acreditar que o governo vai ouvir a voz dos trabalhadores. Até agora eles estão impondo mudanças e não ouvindo o povo. Lutar pelos nossos direitos é o primeiro passo – disse a professora Valdinéia Porto Borowski.
Confira abaixo outros reflexos da greve geral em Caxias:
Ônibus e rodovias
Barrados por cavaletes quando sairiam para circular em Caxias, por volta das 5h, os ônibus da Visate só deixaram a garagem às 10h. Coletivos que transportam funcionários de empresas da região também ficaram retidos. O reflexo foi sentido nas paradas de ônibus da cidade, que amanheceram praticamente vazias.
Poucas pessoas se animaram a andar pelo Centro no começo do dia. Uma delas era a auxiliar de limpeza Simone Guimarães, que utiliza o TR01 para ir da EPI Floresta até Forqueta, seu local de trabalho. Sem ônibus no bairro Jardim América, onde mora, ela foi a pé até a Estação Ópera, na Rua Pinheiro Machado, com a esperança de encontrar algum veículo.
– No caminho soube que parou tudo. Vou esperar a minha chefe – relatou ela.
O promotor de vendas Tiago Trindade também foi afetado. Ele saiu às 5h30min do bairro Desvio Rizzo e caminhou duas horas até chegar ao Centro. A intenção era seguir para o bairro Pioneiro. Na EPI Imigrante, menos de 10 pessoas aguardavam a normalização do serviço no lado de fora da estação por volta das 8h.
– Saí mais cedo para poder trabalhar. Mesmo com o frio, decidi vir – afirmou Trindade.
Nas rodovias da região, as mais prejudicadas foram a BR-116, em Galópolis, e a ERS-122. Na primeira, os manifestantes controlaram o fluxo em frente à empresa Guerra e passaram parte da manhã liberando o tráfego parcialmente, o que causou grandes congestionamentos. Na ERS-122, os motoristas tiveram de adotar desvios para chegar a Farroupilha ou seguir viagem. A RSC-453 e a Rota do Sol também apresentaram problemas.
Praça Dante e escolas
Depois de ocupar a Visate e as rodovias, a maioria dos manifestantes se deslocou para a Praça Dante, onde realizou um ato às 10h. A Rua Sinimbu foi completamente trancada. Eles repetiram a manifestação no final do dia, por volta das 17h. Havia professores, sindicalistas, agricultores e integrantes de outras categorias e movimentos sociais, como a Marcha Mundial das Mulheres. Na pauta, além do rechaço às propostas do governo Temer, reivindicações como o fim da violência contra o gênero feminino.
– As reformas impactam muito na vidas das trabalhadoras. É por isso que estamos aqui, para lutar pelos nossos direitos – argumentou Paula Grassi, uma das integrantes da marcha.
A adesão à greve fez a maior parte das escolas não ter aulas. Em Caxias, 45 dos 85 colégios municipais aderiram à paralisação. Na rede estadual, 38 cancelaram turnos e outros nove encorparam o movimento parcialmente. Já na rede particular, 11 escolas católicas dispensaram seus alunos. Entre as mais afetadas de toda a rede pública e privada estavam Cristóvão de Mendoza, Evaristo de Antoni, Aristides Germani, Imigrante, Melvin Jones, Apolinário, La Salle, La Salle Carmo, São Carlos, Madre Imilda e São José.
Em Bento Gonçalves, 15 escolas municipais de ensino fundamental não tiveram aulas e cinco funcionaram apenas pela manhã. Dos 19 centros de educação infantil, 17 tiveram prejuízo no atendimento de manhã. Na rede estadual, 13 das 21 escolas informaram paralisação à 16ª CRE.
Já em Farroupilha, nenhuma das 27 escolas municipais de ensino fundamental teve aulas ontem. Na rede estadual, a maioria cancelou, incluindo as duas maiores: a São Tiago e a Estadual Farroupilha.
Comércio com menos fluxo
A reportagem do Pioneiro circulou pelas ruas centrais e constatou que a maioria das lojas abriu as portas pela manhã. Foi unanimidade entre os comerciantes, porém, que houve impacto negativo em função dos protestos. Num estabelecimento de vestuário da Avenida Júlio de Castilhos, esquina da Praça Dante Alighieri, a estimativa é que as vendas tenham diminuído de 50% a 70% ontem.
– É característica da população caxiense usar o transporte público. Sem a circulação de ônibus, não há movimento nas ruas e consequentemente há diminuição nas vendas – explicou o gerente, Vanderlei Borges.
Em outra loja de roupas, também na Avenida Júlio, além da queda nas vendas, a gerente Daniele de Oliveira teve que adaptar o quadro de funcionários. Três colaboradores não conseguiram chegar ao trabalho por causa da falta de ônibus.
– Como eles moram longe, não tiveram como vir. O movimento também é fraco, é como se fosse um dia de feriado – estimou Daniele.
O Sindicato do Comércio Varejista de Caxias do Sul (Sindilojas) não recebeu nenhuma notificação de estabelecimentos fechados durante a manhã.
Bancos e serviços à população
Das 48 unidades básicas de saúde (UBSs) de Caxias, sete não abriram: Centenário, Criúva, Reolon, Santa Fé, São Caetano, Tijuca e a Unidade Prisional (Apanhador). A UBS Esplanada funcionou pela manhã e fechou à tarde. As demais trabalharam com equipes reduzidas. O atendimento nas agências bancárias da cidade também foi afetado.
Em nove lotéricas de Caxias contatadas pela reportagem, sete receberam o público normalmente. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) só atendeu agendamentos, e as agências do Sine abriram normalmente, execto em Bento Gonçalves.
Os Correios, as delegacias de Polícia e os supermercados não aderiram ao movimento. A Feira do Agricultor, que ocorre de terça-feira até sábado em diversos bairros de Caxias, também funcionaram. Da mesma forma, o Ponto de Safra, que ocorre tradicionalmente somente às sextas-feiras, manteve as atividades rotineiras.