Há mais de dois anos, Dinéia não dorme sem afagar o nariz de um urso de pelúcia e segurar a mãozinha de uma boneca que eram da filha, Mônica. É como se fizesse, todas as noites, o último carinho que não conseguiu dar à jovem que morreu em um acidente na BR-470, uma das mais perigosas na Serra.
Mônica Guzzo Bissani dormia no banco de trás do Ka da família quando um acidente envolvendo outros três veículos tirou a vida dela e do motorista, Fernando Francisco Bordignon. A jovem tinha 27 anos, completados dois dias antes, e o motorista, contratado para levar mãe e filha a Caxias do Sul, 49. São duas das 24 vítimas que a BR-470 deixou em 2013 nos 97 quilômetros entre Carlos Barbosa e Nova Prata. Vidas perdidas em uma estrada não duplicada, com curvas extremamente sinuosas e muito, muito perigosa.
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O acidente ocorreu em uma reta da BR-470 em Veranópolis, na altura do Km 180, no dia 6 de maio daquele ano, faltando poucos minutos para o trio chegar em casa. Mônica morreu no local. Bordignon faleceu pouco depois, no hospital. A mãe de Mônica, Dinéia Guzzo Bissani, hoje aos 63 anos, passou dois meses na UTI e outros dois em tratamento no quarto, até ter alta, com sequelas. Lesões físicas, que forçaram a aposentadoria por invalidez, mas não mais dolorosas que a cicatriz deixada pela morte da filha. A mãe só soube da perda quando acordou após 22 dias em coma.
- Eu não me despedi dela. Isso é uma dor muito grande, que eu carrego dentro de mim e nunca vou conseguir tirar de dentro do meu coração, por não ter dado o último beijo, o último abraço. Todos se despediram dela, menos eu - lamenta.
As más condições da estrada, somadas à imprudência de motoristas, respondem por vidas perdidas, como a de Mônica.
- É uma rodovia que não permite ultrapassagens, não tem disponibilidade de espaço, falta acostamento. Vai desviar de buraco, acaba invadindo pista, e isso aumenta a gama de acidentes - avalia a professora Magda Medianeira Reginato Bassanesi, que há 15 anos estuda logística e processos produtivos.
Para Dinéia, um carro que tentava ultrapassá-los pode ter causado a colisão. Enquanto procura respostas para isso e para o vazio, ela aplaca a saudade com os brinquedos que eram da filha e reza diante do altar sobre a cômoda do quarto. É lá que mantém a foto da jovem, flores amarelas - a cor que ela mais gostava - e uma imagem de Santa Mônica, que era da moça.
- Todos os dias, às 18h, parece que a porta vai abrir. Era a hora que ela voltava de Cotiporã ou Nova Prata, onde dava aulas - recorda.
*colaboraram André Fiedler (Rádio Gaúcha Serra) e Jean Prado (RBS TV)
Serra Imobilizada
Mãe lamenta não ter dado adeus à filha, vítima de acidente na BR-470 em Veranópolis, em 2013
Mônica Guzzo Bissani foi uma das 24 pessoas que morreram na estrada entre Carlos Barbosa e Nova Prata naquele ano
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