O Al-Merrikh, do Sudão, do ex-treinador do Juventude Heron Ferreira e dos atletas Paulo Sérgio e Matheuzinho, virou notícia nas últimas semanas. Nove brasileiros que defendem o time de futebol estiveram “ilhados” tentando sair do país de ônibus para escapar da guerra pelo poder. Os ex-profissionais do Verdão estavam no grupo que foi para a ação de resgate no último final de semana e viveram uma situação dramática, após ficarem presos em um hotel de Cartum, capital do Sudão. Apenas nesta quinta-feira (27) o grupo chega ao Brasil.
A situação difícil foi foi revelada na semana passada pelo centroavante Paulo Sérgio, que defendeu o Juventude em 2019. Ele e os outros atletas brasileiros fizeram apelos ao Itamaraty para serem resgatados, mas segundo eles não houve resposta do governo brasileiro, naquele momento.
— O medo toma conta. Acordei com barulho de tiros. Fiquei deitado. Estávamos praticamente dois meses e meio fora do país, jogando competições internacionais — declarou Paulo Sérgio.
Os jogadores regressaram de viagem há poucos dias e ficaram hospedados num hotel da capital sudanesa, quando duas alas do governo entraram em conflito armado pelo poder. A alternativa encontrada pelo grupo foi o Al-Merrikh enviar um ônibus para buscá-los.
Em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, no domingo (23), o técnico Heron Ferreira, campeão da Série B de 1994 pelo Juventude, afirmou que a ida até Cartum foi dramática.
— Uma tensão muito grande. Muito grande mesmo. Passamos numa barreira, os soldados mandaram descer todo mundo do ônibus — revelou o treinador.
O ônibus chegou a Cartum no domingo, e após resgatar o grupo de brasileiros, a delegação imediatamente seguiu para a fronteira com o Egito. Os grupos paramilitares que duelam pelo poder no Sudão acertaram um cessar-fogo humanitário por 72 horas, para que as pessoas pudessem deixar o país.
De acordo com nota do Itamaraty, o governo seguiu "empreendendo esforços para retirar todos os brasileiros em território sudanês tão logo quanto possível” e que 15 dos 16 brasileiros que estavam em Cartum haviam deixado a capital, incluindo três crianças que saíram em um comboio da ONU.
No caminho até Cairo, capital do Egito, o grupo teve que passar por mais um transtorno. Após viajar 70 quilômetros, o ônibus transportando os brasileiros foi detido em um posto policial por um período de seis horas. O veículo seguiu viagem com excesso de lotação, pois policiais teriam obrigado outras pessoas a embarcar na condução.
O grupo, composto por cinco membros da comissão técnica e quatro jogadores, deixou o Sudão após 30 horas de viagem de ônibus, em direção à fronteira com o Egito.
— Após 30 horas conseguimos sair do Sudão. Estamos no Egito esperando o carimbo no passaporte para seguir viagem — declarou o meia Matheuzinho.
Segundo o atleta, na noite desta quarta-feira (26) finalmente o grupo deixará o Aeroporto Internacional do Cairo em direção à capital paulista.
De acordo com a Associated Press, mais de 420 pessoas, incluindo 264 civis, foram mortas e mais de 3.700 ficaram feridas nos combates entre as forças armadas sudanesas e o poderoso grupo paramilitar conhecido como Forças de Apoio Rápido (FAR).
Passagens pelo Juventude
Heron Ferreira, 65 anos, técnico
Em 1994, o técnico de apenas 36 anos chegou ao Juventude com o currículo de quem já havia sido campeão da Série B do Brasileirão, em 1989, com o Olaria-RJ, primeiro time profissional que treinou. O bom desempenho rendeu um convite de Vanderlei Luxemburgo para que fosse seu auxiliar.
— Foi ele quem me indicou para a Parmalat. Eu era auxiliar dele em 1989, 1990 e 1991 — apontou Heron.
A indicação rendeu uma reunião com José Carlos Brunoro, homem-forte da multinacional do leite na época, para estabelecer as metas do projeto. O objetivo principal era subir à elite do futebol brasileiro. E os investimentos deram resultado rapidamente. O Juventude chegou à Primeira Divisão brasileira, com a conquista da Série B de 1994, contra o Goiás.
Depois de um ano e meio veio o desgaste, e o técnico acabou deixando o comando do Juventude. Hoje, Heron Ferreira é um técnico internacional e vem desenvolvendo desde 2004 um trabalho voltado ao Oriente Médio e Arábia Saudita, região tomada por desertos.
E não foi a primeira vez que o treinador teve que fugir de uma situação delicada. Em 2011, Heron trabalhava na Líbia quando o ditador Muamar Kadafi foi derrubado do poder. Após 15 dias de cerco, o técnico do Al Ahly Tripoli escapou de um navio até a ilha de Malta.
— De Malta viajei pra Madrid e cheguei no Brasil, no Rio de Janeiro, graças a Deus. E hoje estou vivenciando novamente uma situação semelhante — apontou o técnico.
Paulo Sérgio, 33 anos, centroavante
Atleta formado na base do Flamengo, Paulo Sérgio foi contratado pelo Juventude para a disputa da Série C do Campeonato Brasileiro de 2019. Mas foi pela Copa do Brasil que o atleta ficou marcado. Diante do Botafogo, no Nilton Santos, Paulo Sérgio fez o gol alviverde no empate em 1 a 1. O jogador foi expulso de campo e ficou de fora de mais um grande triunfo alviverde na competição, com a classificação sobre os cariocas no jogo de volta, em Caxias do Sul.
Pelo Juventude, Paulo Sérgio atuou em apenas 12 jogos. O atacante foi destaque do Operário-PR na Série B de 2022, marcando 10 gols em 36 jogos. Pelo Al-Merrikh, na atual temporada, o jogador balançou as redes três vezes em seis partidas.
"Matheuzinho", 30 anos, meia-atacante
O meia chegou ao Juventude em 2020 e atuou na equipe sub-23 e na principal. Ao todo foram 28 jogos com a camisa alviverde e cinco gols. O atleta chegou ao Sudão após se destacar pelo Vila Nova-GO na Série B do ano passado. Pela equipe goiana foram 55 partidas, com dez gols e cinco assistências.