O aumento de 14,26% no diesel, anunciado pela Petrobras na semana passada, causou apreensão para diversas categorias que utilizam o combustível como principal insumo de suas atividades profissionais. Ainda que a Federação dos Caminhoneiros Autônomos do RS (Fecam RS) descarte uma paralisação, diversos motoristas colocam em dúvida a capacidade de continuar trabalhando devido ao custo crescente. O mesmo questionamento é feito pelos responsáveis pelo transporte escolar em Caxias do Sul. Nas revendas de automóveis, o cenário também é pessimista sobre a saída de automóveis.
Nesta quinta-feira (23), os postos de combustíveis de Caxias chegavam a cobrar R$ 7,79 à vista pelo diesel S10. Todas as bandeiras cobravam mais caro pelo litro do óleo do que da gasolina — o que é uma realidade desde o reajuste ocorrido em 10 de maio. Referência há três décadas na condução escolar na cidade, a Tio Ale Transportes conta com 10 veículos que utilizam cerca de 3,8 mil litros de diesel por mês.
— No início do ano, abastecíamos, por mês, R$ 14 mil em diesel. Agora, está em aproximadamente R$ 26 mil. De onde tiro estes R$ 12 mil a mais? É muito difícil trabalhar dessa maneira. Nestes 36 anos de trabalho nunca havia passado por um momento tão difícil — reclama o empresário Alexandre Lanzarini, conhecido como Tio Ale.
Em dezembro do ano passado, o diesel S10 era vendido, em média, a R$ 5,41 em Caxias, conforme dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). O combustível, portanto, teve um aumento de 42,2% neste primeiro semestre de 2022. No início desse mês, Tio Ale relata que reajustou em 10% o valor cobrado dos pais dos estudantes transportados. Com o novo aumento de 14,26%, o empresário admite não saber o que fazer.
— Os pais entenderam porque olha o tamanho do aumento que deu. Foi difícil, mas entenderam. Só que eles também não têm essa correção. O salário deles continua o mesmo. Não dá para colocar tudo em cima do cliente. Estamos absorvendo todo este prejuízo. Não está legal para os dois lados, tanto para mim, quanto para o cliente — lamenta.
Este relato de trabalhar no limite para não ter prejuízo é a mesma reclamação de outros empresários. O setor ainda sofre com os efeitos da pandemia, que reduziu o número de estudantes que optam por este transporte.
—Por enquanto, não fizemos reajuste. No contrato com os pais, está previsto que um reajuste, se necessário, em julho, de R$ 10. Mas, do jeito que está, há o risco de os pais não aceitarem. Estamos aguentando no osso. Todo mundo está buscando alternativas (de economizar), porque o receio é aumentar o valor e perder o cliente — opina Daiane Taís de Brito, proprietária da Daii Transporte Escolar e Fretamento, que atua há 16 anos no ramo.
— É complicado porque transportamos pessoas. Não queremos deixar nossos clientes empenhados. São relações de muitos anos, que levamos os filhos desde o pré até o 3º ano do Médio. Eles confiam na gente, mas (se aumentarmos o valor) também irão buscar outras formas para economizar. Iremos ficar sozinhos, sem clientes. Não trabalhar no prejuízo já é um mérito hoje em dia — conclui o Tio Ale.
Caminhoneiros recusam viagens para evitar prejuízo
Outra categoria diretamente impactada pelos aumentos do óleo diesel é a dos caminhoneiros. O presidente da Fecam RS, André Costa, afirma que não há risco de paralisação porque os caminhoneiros "amadureceram" desde a última paralisação geral em 2018. Por enquanto, a categoria aguarda os demais desdobramentos do reajuste no diesel. O representante estadual aponta que é preciso avaliar um reajuste de 40% no valor geral dos fretes para que o transportador autônomo possa ter fôlego para prosseguir.
Por enquanto, o relato em Caxias do Sul é de desânimo para continuar a trabalhar. O presidente da Fecam na cidade, Selezio Panisson, lembra que o reajuste tem impacto quase imediato nas bombas de combustíveis e o caminhoneiro "que está com a carga em cima" já sofre prejuízo.
— O caminhoneiro autônomo está preferindo ficar parado, pois não tem condições de trabalhar. Esse último (aumento) "tirou todo mundo do banco". O caminhoneiro que precisa procura uma carga que compensa, faz os cálculos para não pagar para trabalhar. Só que, daqui a pouco, não valerá mais nenhum tipo (de carga) — avalia Panisson.
Segundo estimativa da Fecam, a região de Caxias do Sul conta com mais de 1,5 mil caminhoneiros autônomos. Panisson calcula que, para trabalhar o mês inteiro, o caminhoneiro terá um gasto de R$ 40 mil, para abastecer. É um custo elevado que, segundo a Fecam, as empresas demoram ou não terão como repassar aos clientes na velocidade em que são anunciados os sucessivos aumentos.
— Na nossa base, o frete está em R$ 5, o quilômetro rodado. Para valer a pena, deveria estar no mínimo a R$ 8. (Após os aumentos recentes) têm empresas pagando entre R$ 5,50 e R$ 6, mas é muito difícil. E a notícia que ouvimos é que só irão aumentar mais o valor do diesel — revela o representante da Fecam em Caxias.
Apesar de relatar a revolta dos caminhoneiros caxienses e que muitos estão deixando de viajar, Panisson também não acredita em uma paralisação geral.
— Protesto é só se tivéssemos alguma visão de que irá resolver, mas não temos esta perspectiva. Greve para valer a pena teria que ser ninguém levar estas cargas que não repassam o reajuste. Mas, sempre tem alguém que leva esta carga barata. Pensam que estão ganhando o dinheiro que precisam, mas só estão aumentando o buraco que estamos nos enfiando — aponta.
Revendas preveem desaceleração no segundo semestre
O preço do diesel acima da gasolina também passar a ser um questionamento na compra e venda de automóveis. Nas revendas de Caxias do Sul, os clientes começam a demonstrar preocupação com a alta do óleo. Empresários como Moisés Slongo, proprietário da Pick-up Car Multimarcas, apontam que a tendência é o segundo semestre seja marcado por uma desaceleração desse segmento.
— Está complicado porque está ficando muito caro. Passar (do preço) da gasolina assustou um pouco. Ainda não sentimos uma grande diferença, mas é uma tendência. O que vemos é a busca por veículos mais baratos, os clientes perguntando bastante sobre consumo e manutenção, o que é vantagem para o mercado da gasolina — relata o dono da revendedora na Avenida Rubem Bento Alves.
— Deu uma freada (nas vendas), mas não é só diesel. A alta da gasolina é outro fator. O diesel tem vantagens e tem seu público. Aqueles que sempre tiveram diesel se mantém. O problema é que até as eleições deve aumentar ainda mais — corrobora Gelson Devenz, dono da Cia do Automóvel, na Avenida São Leopoldo.
Por outro lado, o setor está em recuperação após a pandemia, que restringiu as aglomerações e limitou a produção de peças. Há maior oferta de caminhonetes e caminhões à venda, principalmente nas concessionárias. Assim, as lojas especializadas conseguem comprar melhor e ter um lucro maior nas vendas.