Nesta semana, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou o reajuste na bandeira tarifária vermelha patamar 2, aplicado por causa do aumento do custo de produção de energia no Brasil. A cobrança extra passou de R$ 6,24 para R$ 9,49, a cada 100 kWh consumidos, uma alta de 52%. Também nesta semana, o ministro de Minas e Energia, Beto Albuquerque, reconheceu que o país passa por uma crise hídrica, afetando diretamente as hidrelétricas brasileiras. Por isso, sugeriu o uso racional de água e luz.
A orientação é, na verdade, uma tentativa de evitar um apagão no segundo semestre desse ano, o que geraria desconforto aos brasileiros e impactaria de forma significativa a economia já abalada pela crise provocada pela pandemia. No pronunciamento em cadeia nacional de rádio e TV na última segunda-feira (28), Albuquerque disse o governo desenha, em parceria com a indústria, um programa voluntário que incentiva as empresas a deslocarem o consumo dos horários de maior demanda de energia para os de menor demanda.
Para o vice-presidente de Indústria da Câmara da Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias, Mauro Bellini, é importante que a medida, se adotada, seja de fato voluntária e não compulsória.
— A minha leitura é que ele colocou que não precisa ter pânico, pois não vai ter apagão. Ao mesmo lado, eu li também que “vamos tomar cuidado e usar com moderação a energia”, não utilizar desnecessariamente e trabalhar em alguma solução, como essa mesmo, de deslocar o consumo, que seria o ideal, e uma boa oportunidade até de fazer um “ganha-ganha”. Em alguns momentos, poderia se deslocar o consumo sem perder a produção — defende Bellini.
O empresário explica ainda que a alta da energia elétrica força o aumento do Custo Brasil, que se refere a um conjunto de dificuldades econômicas, estruturais, burocráticas e trabalhistas do país.
— Energia é um componente importante na composição da inflação e já com o aumento da energia vai gerar mais inflação — diz, preocupado.
Mais aperto para quem tem menos
Mesmo sem o risco de apagão, nas casas das famílias brasileiras, o reajuste nas contas de energia elétrica pesa no orçamento, ainda mais associado a uma série de outros aumentos expressivos, como no gás de cozinha. Em Caxias do Sul, a família de Lizete Federle Dutra, 55 anos, tem direito à Tarifa Social de energia elétrica, um benefício oferecido a quem justifica ter renda baixa. A renda média deles, não passa de R$ 500.
No entanto, na residência em Vila Seca, onde moram em três pessoas, o custo médio da conta de luz, dos últimos meses, tem sido de R$ 105. Por conta do benefício, eles têm pago em torno de R$ 80, explica Lizete. Porém, mesmo com a redução, o valor gasto com energia elétrica consome quase um sexto da renda da família.
Na tentativa de economizar, os banhos estão mais curtos e, mesmo nos dias intensamente frios como nesta semana, as estufas que dependem de energia elétrica para funcionar estão desligadas. O recurso usado, então, para aquecer a casa é o fogão a lenha, que ajuda até mesmo a esquentar o banheiro. As brasas são acomodadas em um balde que comporta o calor para deixar o ambiente mais quente na hora do banho.
Esse processo, conta Lizete, é feito com cuidado por causa do risco de queimaduras ou até incêndios, mas é a saída encontrada para que tenham algum conforto térmico na época mais fria do ano, que vem associada a um custo mais alto na taxa de luz.
— A gente tem que ir dando um jeito. Pior ainda agora por causa desse aumento. E vai ter mais aumento ainda — diz, indignada.
Opinião das entidades
Sindmóveis
O presidente do Sindmóveis Bento Gonçalves, Vinicius Benini, diz que o risco de uma crise energética gera incerteza e, consequentemente, afeta o planejamento do setor, que conseguiu ter crescimento no faturamento no ano passado apesar da pandemia.
— Qualquer medida que venha a mitigar o consumo de energia nos horários de maior demanda é importante para minimizar apagões. Se não houver apoio a programas governamentais como este cujo desenho está sendo finalizado, o risco é de toda a sociedade ser ainda mais prejudicada. Para as indústrias, evitar o momento de pico da demanda significa otimizar custos, pois vai produzir de modo menos oneroso. Agora, é importante comentar que não há garantias que apagões serão evitados, mesmo com a implantação de programas específicos para alterar o perfil do consumo — comenta Benini.
Simecs
O presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul e Região (Simecs), Paulo Spanholi, avaliou como positiva a proposta de um programa de incentivo às empresas para mudarem o consumo para momentos de menor demanda e disse que ela já foi tomada por algumas indústrias do setor para contribuir para o não agravamento da crise energética.
Em nota, a entidade questiona a orientação do governo: "No entanto, a troca total dos horários das indústrias é algo inviável no curto prazo, já que implica, na proporção do tamanho das empresas, numa série de outros ajustes com grande impacto no processo produtivo. Seguiremos acompanhando o tema com atenção para que as medidas necessárias sejam implementadas com agilidade e assertividade".
Saiba como funciona a tarifa social
Os descontos na conta de luz para os beneficiados pela tarifa social são aplicados de forma cumulativa. A tarifa terá um desconto de 65% para os primeiros 30 kWh consumidos no mês. Para o consumo de 31 a 100 kWh/mês, o desconto será de 40%. Finalmente, a parcela de consumo entre 101 e 220 kWh no mês terá 10% de desconto. Isso significa que, se você é beneficiário da tarifa social com consumo mensal de 50 kWh/mês, haverá um desconto de 65% sobre os primeiros 30 kWh e de 40% sobre os outros 20 kWh.