Dialogando com a programação da Semana Nacional dos Museus - e também com o aniversário de 75 anos do Museu Municipal de Caxias do Sul, fundado em 1947 -, a exposição Além da coleção: Uma visita à subjetividade das obras do Amarp joga luzes sobre os primórdios da antiga Pinacoteca Aldo Locatelli. Foi o espaço que, a partir de 1975, abrigou as centenas de criações que hoje compõem o atual Acervo Municipal de Artes Plásticas - como a Pinacoteca foi renomeada em 2004.
Conforme já destacado neste espaço, a Pinacoteca Aldo Locatelli surgiu em meio à programação da Semana de Caxias de 1975, época em que Santina Barp Amorim e Maria Frigeri Horn respondiam, respectivamente, pela Secretaria de Educação e Cultura e pela coordenadoria de museus.
O acervo, que buscava mapear a produção caxiense e de nomes de fora, formou-se a partir de doações de artistas que realizaram exposições no Museu Municipal e, posteriormente, na Galeria de Arte da Casa da Cultura. Na abertura, em 5 de junho de 1975, no Museu, a Pinacoteca estava composta por 26 obras.
Elas eram assinadas pelos seguintes artistas, conforme consta no convite original: Aly Chaves Silveira, Ary Cavalcanti, Beatriz Ferla Balen (Susin), Bruno Segalla, David Ratti, Dionéia De Carli, Elyr Ramos Rodrigues, Guido Emílio Frezza, Guido Mondin, Icléia Cattani, Iris Abella, Liana D’ Ávila Brandão, Lídia Mambrini, Liliana Rosseti, Marisa Rossato Saretta, Mirene Missaglia, Nayr Menegotto Hoffmann, Nely Zatti Yuchen, Pedro Saretta, Robinson Sobrera, Rojane Lopes, Rosemary Spinato Scotti, Sally Cardoso da Luz, Soledade Sampaio Damiani, Valdira Danckwardt e Véra Stedile Zattera.
Valdira Danckwardt
Da lista acima, participam da atual exposição no Centro de Cultura Ordovás os artistas plásticos Pedro Vicente Saretta, Beatriz Balen Susin e Valdira Danckwardt. Valdira, inclusive, com a tela doada em 1975 (foto acima). Texto publicado na edição de 7 de junho de 1975 do Jornal de Caxias destacou a pintora e sua obra, datada de 1973:
“Uma de nossas grandes personalidades artísticas, tendo participado de grande número de exposições, individuais e coletivas. Dentre outros prêmios, recebeu, em 1967, a medalha oferecida por Dom Sebastião Baggio, Núncio Apostólico do Brasil. Busca sua integração e comunicação humana por intermédio da arte, obedecendo ao apelo que sua sensibilidade natural e circunstancial lhe transmitem. Ótima desenhista, Valdira tem-se destacado por uma grande coerência. A obra que doou é um quadro, "Solidão": "um homem só, no meio do mundo em ruínas e que expressa, através da violência de cores, linhas, a angústia e o medo da solidão".
A saber: os textos de 1975, destacando os artistas e suas obras em exposição na Pinacoteca Aldo Locatelli, foram assinados por Liliana Alberti Henrichs, Evaldo Schumacher, Juventino Dal Bó e Valdir dos Santos.
Poema de Nelly Veronese Mascia
Uma das obras doadas naquele início da Pinacoteca, em junho de 1975, foi o desenho a crayon assinado pela artista plástica Sally Cardoso Luz (foto acima). Naquele mesmo ano, a obra inspirou um poema da professora, escritora e poetisa Nelly Veronese Mascia. Ele foi publicado na edição de 18 de outubro de 1975 do Pioneiro. Confira:
LA NONNETA
Velha nonneta tão cheia de amor
Teus cem anos de vida
Contam a história viva desta cidade
No pergaminho de teu rosto
Cada ruga é a expressão do que és
Do que foste e do que deixaste
No percurso do caminho por onde andaste
Qual é o segredo de tua eterna juventude interior?
Querida bondosa e meiga nonnetta
Conta-nos aqui, sem receio, de que fonte
Veio a água pura e cristalina que te lavou a face?
Sei que cada filho que tiveste
Nesta terra promissora, com amor,
Rejuvenescia teu rosto e bailava um sorriso...
Cada dia, quando a aurora despontava
Tu levantavas de teu leito de colchão de palhas
Para iniciar, junto com o sol, a tua labuta
Para alimentar teus filhos, cuidar da criação
E trabalhar incessantemente na lavoura onde a semente brotava!
Nonneta, este teu lenço amarrando teu cabelo branco
Te reveste de uma dignidade invulnerável
Este teu vestido, gasto nas costas pelo sol da lavoura
Este teu avental, onde carregavas as espigas douradas
Estes teus sapatos grossos dão-te a beleza de uma rainha
Tuas jóias são estes brincos que trouxeste da Itália
E esta aliança que, em tua mão calejada ostentas
Símbolo de tua fidelidade ao homem que amaste
Hoje, tens netos que te cercam como uma coroa de glória
E veneram tua figura estóica de heroína singular.
Em cartaz
A exposição Além da coleção: Uma visita à subjetividade das obras do Amarp tem curadoria de Celso Bordignon, Christian de Lima e Raquel Brambilla e fica em cartaz no Centro de Cultura Ordovás até o dia 19 de junho, com entrada franca. Depois, segue para o Museu dos Capuchinhos (Muscap).
Na seleção estão contempladas ainda obras de Alice Soares, Daniela Antunes, Enio Squeff, Elisa Zattera, Francisco Stockinger, Juventino Dal Bó, Mara Beatriz Caruso, Marlene Ivete Longhi, Nilton Antônio Maia da Silva e Tere Finger Fiorio.