Na saída do súper, no início da semana, assisti a um gurizinho de uns cinco ou seis anos e vestido com a camisa azul da Seleção Brasileira mostrando ao pai e ao irmão, de uns 10 anos, uma coreografia. Ele colocava as mãos nos ombros — mão direita no ombro direito, esquerda no esquerdo — e depois repetia o movimento, com mãos e ombros alternados. O pai observava sorridente enquanto caminhava, e eu parei para ver a cena. Logo percebi não se tratar de um movimento qualquer: era a dancinha do Pagodão do Birimbola, aquela que Vini Jr. protagonizou ao fazer o primeiro gol na vitória do Brasil contra a Coreia do Sul. Bons tempos aqueles. Na sexta-feira, até teve gol, mas não teve dança, muito menos comemoração.
Isso reforça uma crença boba que tenho: a gente só dança quando está feliz. Mover o corpo é a expressão de um estado de espírito, de plenitude.
Encontrei a vizinha da frente no elevador, toda arrumada e perfumada, e me contou que estava indo a um jantar da escola de dança que frequenta. Que se mexer ritmadamente faz muito bem à vida dela. Nunca imaginei a senhora calma e gentil se divertindo ao som de Shakira. Mas ela confessou que gosta muito de bailar como a colombiana. Rimos. Eu também adoro e só me matriculei nas aulas de dança do ventre da Michelle, anos atrás, porque queria me movimentar como Shakira no clipe de Hips Don't Lie. Não cheguei lá, mas aprendi alguns passos e me diverti demais.
Por isso não faz o menor sentido a reclamação xenófoba dos europeus sobre as coreografias dos jogadores brasileiros. Aliás, estamos tão acostumados a elas, que essa festa jamais soaria desrespeitosa. É um aspecto cultural nosso, uma demonstração de alegria. Só isso. Pena que exista bem mais do que incômodo implícito nessa fala.
Por outro lado, dois franceses protagonizaram um dos momentos mais lindos da Copa até agora — depois do gol do Richarlison, claro. Logo após o atacante Olivier Giroud ter se tornado o maior artilheiro de todos os tempos da seleção francesa, ao marcar gol no 3 a 1 contra a Polônia, ele abraçou o colega de time Mbappé e se declarou com um "eu te amo". Ao contrário das dancinhas, a cena chamou atenção, porque é pouco comum ver homens demonstrando carinho uns aos outros. Às vezes, tenho a impressão de que as pessoas, de modo geral, têm essa dificuldade.
Como nasci num lar repleto de afetos, aprendi a olhar para o mundo dessa forma, é algo bem natural. Mostrar carinho é uma forma — muitas vezes, sem segundas intenções — de existir no mundo. Preocupar-se com alguém, interessar-se pela história, querer ajudar, elogiar são atividades triviais. É uma pena que nem todas as pessoas sejam bem resolvidas em relação a isso e fujam desse tipo de interação, com medo de precisar lidar com os próprios sentimentos. Apesar das resistências, prefiro essa minha versão e torço pela constância dos dias repletos de danças e de declarações públicas de afeto.