Quanto tempo é preciso para nutrir ou dissolver uma expectativa? Uma amiga me procurou, na esperança de que pudesse ajudá-la com algum tipo de resposta para a questão quase filosófica. Como não existe um padrão no quesito criar expectativa, não dá para precisar exatamente quando ela vai se desfazer. A única certeza é de que alimentá-la tem potencial grande de gerar frustrações, porque ninguém tem condições de adivinhar o que o outro espera e, muito menos, estar a altura desses desejos secretos. Mas, no dia a dia, a racionalidade não costuma ajudar tanto assim e o jeito é saber administrar o que vem. Ler pessoas e cenários ajuda muito – a nossa percepção costuma ser a única que serve para algo e vale estar atento para aprender com quem já viveu o que não vivemos.
Explico.
Um amigo nascido na periferia contou que, logo que ascendeu de função em uma grande metalúrgica da cidade, percebeu que precisaria mudar a forma de se vestir e, especialmente, a forma de falar. Gírias dariam lugar a verbos bem conjugados e plurais bem usados nas orações. Pensadores e conceitos foram agregados à fala e o colocaram em outro patamar, para que pudesse ser olhado pelo que era, não pelo que achavam que ele poderia ser. Essa percepção o ajudou a garantir um ótimo trânsito em diversos ambientes – dos recônditos da pobreza e violência, onde pouca gente chega desacompanhado, às salas com sofás de couro nas esferas de poder, em reuniões com hora marcada.
— Aprendi a ser poliglota — disse-me, com uma naturalidade impressionante.
Fiquei fascinada pela ideia de saber falar várias línguas na mesma língua e evocá-las em diferentes momentos, conforme a necessidade e o interlocutor. É de se admirar com a clareza sobre a importância de olhar para o contexto, para conseguir transitar pelos diferentes mundos que nos cercam. Ver isso com valor e potência dá outro significado para o dia. Enxergar o outro é quase tudo o que importa sobre ele.
É justamente essa a definição que o psicólogo social Erich Fromm traz sobre respeito, ao dizer que “corresponde à capacidade de ver uma pessoa tal como ela é, de ter consciência de sua individualidade singular. Significa se preocupar com que a outra pessoa cresça e se desenvolva como é”. A própria etimologia (vem de respicio, em latim) carrega esse significado de “olhar para”.
Penso bastante nisso. Na conversa com um amigo querido que não encontrava há muito tempo, ele decidiu me dar algo que estava no carro e pediu a uma colega que fizesse a gentileza de buscar para ele. Antes, passou uma espécie de instrução sobre como ela deveria fazer isso, já que o carro era todo hi-tech e bastava aproximar-se do veículo com a chave para abrir as portas. A cena foi divertida. Ele, portador de uma limitação física desde a infância, deu-se conta de onde tinha chegado na vida e sentenciou:
— Minha mãe nunca desejou que eu fosse um empresário de sucesso. Tudo o que ela queria era que eu conseguisse atravessar a rua sozinho.
Ele conseguiu o combo completo, faz as duas coisas e ainda mais. Ainda assim, não perdeu a noção da importância de honrar sua trajetória.
Gosto de pensar que é o jeito como nos aproximamos — das situações, das pessoas e, por quê não?, de nós mesmos — que define boa parte das nossas interações com o mundo. Se encararmos os outros com respeito e delicadeza, expectativa nenhuma será capaz de nos desestabilizar.