Adoro dias friozinhos e ensolarados, como a maioria deles nesta semana. Amo a paisagem do início do outono, com as folhas ficando em degradê de laranja antes de caírem e acho meio tristes as árvores nuas e secas, mimetizando os meses cinzentos de inverno. Estações do ano são uma metáfora da vida, embora essa compreensão não seja tão óbvia. É difícil aceitar mutações e cortes repentinos, mas os comparar com ciclos da natureza pode servir de alento para encararmos até os piores momentos como transitórios e ter a certeza de que sempre há o novo a brotar e surpreender. Existe uma esperança rondando, de forma presencial, o tempo todo, é fato.
Gosto muito de uma frase da Cecília Meirelles que diz “aprendi com a primavera a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira” e nela reside a necessidade de resiliência para um viver equilibrado. Não dá para ganhar sempre, mas dá para aproveitar bastante o caminho. É possível aprender, amadurecer e desfrutar da maior parte dos dias, especialmente se tivermos noção da efemeridade que nos ronda – a vida é cíclica, mas só podemos fazê-la acontecer agora mesmo (o que você está esperando?).
Recentemente fui instigada a pensar em uma árvore aleatória, a minha escolha, e depois a tentar observá-la de perto. Primeiro, pelo que ela teria chamado minha atenção e isso sempre evoca uma subjetividade, né? Numa interação, isso costuma acontecer com um sorriso – tão difícil de vermos em tempos pandêmicos –, com o formato do braço desenhado numa camisa, com o cabelo esvoaçante ao ar livre, com a leveza do espírito...
Não existe um padrão ao que nossos olhos decidem contemplar, mas voltemos à árvore. Se observada à distância, ficam evidentes características físicas que nos atraíram: alta, florida, colorida, imponente e por aí vai. À medida que nos aproximamos, conseguimos observar com mais detalhes o caule com suas cicatrizes e regenerações, que a transformaram na espécie que tanto admiramos. Na natureza, é muito mais fácil estabelecermos essa relação, ver que a beleza reside na transformação, na capacidade de transpor dificuldades e que o crescimento é um processo infindo. Conosco, não costumamos ser tão generosos e exigimos uma instantaneidade quase robótica, como se fôssemos seres estáticos.
Olhamos para nossas marcas e cicatrizes com menos complacência, como se não fossem elas, justamente, a razão do nosso aprimoramento espiritual – sou uma otimista e creio nisso. Se as árvores ficam maravilhosas e fortes depois de terem vencido obstáculos de crescimento e de perderem todos os frutos e as folhas, por que seríamos diferentes?
Nossa trajetória costuma ser cheia de pequenos momentos de superação individual, que deveriam nos encher de orgulho por sabermos que existem, em nós, recomeços para abraçar uma estação inteira. Ou todas elas, ciclicamente.